Responsive Ad Slot

Resenha: Contos céticos, de Adriana Lunardi

Foto: Arte digital / Divulgação

 

APRESENTAÇÃO

A escrita de Adriana Lunardi traz uma astúcia que nos coloca, sempre de repente, na companhia das belezas imperfeitas que decorrem da tragédia cotidiana – a¬li, de onde não se pode fugir, o deleite e desespero de coexistir; ali, quando há sempre um eu, um outro.

Desconfiados e a seu lado, acompanhamos um estrangeiro na praia, criamos personagens, perdemos o ar por completo em uma pandemia, e a visão, na velhice. Em seus nove contos e uma nota do destino, conhecemos crianças erráticas, idosos mais erráticos ainda, escritores vaidosos e autoflagelados, e vislumbramos o que chamam de ‘loucura que acomete gênios e artistas’, mas sequer chegamos perto de tocá-la – é impossível. Olhamos no olho do mistério porque, em Contos céticos, não há quarta parede diante do luto, das últimas imagens que se tem de alguém. Tudo pode ser maculado. Uma criança, a literatura, Paris.

Mas o que torna Contos céticos uma coletânea excepcional são as imagens extraordinárias que Lunardi é capaz de criar a partir de elementos triviais da existência. Sua narrativa fascinante não vem apenas de uma habilidade magistral, mas de sua uma profunda intimidade com a palavra. O fio condutor que atravessa os contos deste livro não se estica e não se pretende linear, prefere antes partir-se e buscar o remendo, fazer nós e novelos; sua natureza, no entanto, é inequívoca, e diz: estou aqui para fazer literatura.


RESENHA


Adriana Lunardi, aclamada escritora e ganhadora de diversos prêmios, nos presenteia com Contos céticos, uma celebração da literatura e suas diversas formas. Seus nove contos e uma nota do destino nos levam a um universo de imperfeições belas que surgem da tragédia do cotidiano, explorando a delícia e o desespero de coexistir. Em meio a crianças caprichosas, idosos mais ainda, escritores arrogantes e autocentrados, Lunardi nos presenteia com imagens extraordinárias criadas a partir de elementos banais, desafiando a manipulação por glossários, medicamentos ou truques. Em sua narrativa, a autora utiliza a dúvida e a ironia para explorar uma realidade que não pode ser deturpada. Adriana Lunardi nos confronta com nossa própria ridicularidade, revelando a beleza que reside em nós quando as luzes se apagam. Sua obra deixa uma marca indelével, como bem observou Adriana Lisboa, com "um quê de ternura, um arrepio de poema".


Contos Céticos é uma coletânea excepcional que se destaca pelas imagens extraordinárias criadas pela autora a partir de elementos simples do cotidiano. Sua narrativa envolvente é fruto não apenas de habilidade excepcional, mas também de uma profunda conexão com a palavra. Os contos deste livro não seguem uma linha reta, preferem se emaranhar e encontrar soluções criativas; no entanto, sua essência é clara: estão ali para fazer literatura. Todas as personagens dos contos carregam um olhar cético e desencantado, questionando o que é dado como certo. O livro representa uma redescoberta de sua própria escrita, com uma valorização da ficção como uma aposta estética em sua jornada literária, o que torna a missão de leitura algo excepcionalmente encantador, ao passo, de que, somos confrontados com nuances descritivas que nos levam a questionar nossa capacidade de interpretação, repleto de contos que mergulham de forma profunda na nossa identidade. 


Silêncio, exílio se desenrola em fragmentos que se entrelaçam de forma singular. A protagonista narra seus encontros com um estrangeiro misterioso em uma praia, enquanto reflete sobre suas fantasias, medos e inseguranças.


A autora utiliza uma linguagem poética e ao mesmo tempo perturbadora, criando uma atmosfera de suspense e inquietude ao redor da relação entre a protagonista e o estrangeiro. A presença constante do mar e a descrição detalhada das ondas e da paisagem marinha contribuem para a tensão crescente ao longo do conto. A protagonista revela a sua fascinação pelo inesperado, o absurdo e o terror do dia a dia, e seu relacionamento com o estrangeiro parece ser marcado por um misto de curiosidade e medo. A personagem também parece lutar contra suas próprias inseguranças e fobias, enquanto tenta decifrar os sinais que se apresentam diante dela.


A narrativa é rica em simbolismos e metáforas, que exploram temas como a vulnerabilidade humana, a dualidade entre o amor e o medo, e a complexidade das relações interpessoais. O conto evoca uma atmosfera onírica e perturbadora, onde a realidade e a fantasia se misturam de maneira intrigante. A protagonista parece confrontar seus próprios medos e alcançar uma espécie de redenção, ao perceber que a tragédia que imaginara não passava de sua própria projeção. 


Script girl é uma narrativa densa e introspectiva que explora a solidão e o isolamento em meio a uma crise global, como a pandemia. A protagonista reflete sobre seus relacionamentos e o amor, projetando suas fantasias e expectativas em figuras masculinas do seu cotidiano. A autora cria personagens complexos e ambíguos, como Tom, Tibério, César e Gus, que representam diferentes aspectos da jornada emocional da protagonista. Cada um deles desperta emoções e questionamentos na narradora, revelando suas próprias inquietações e desejos.


A escrita poética de Lunardi aborda temas profundos como a busca por significado, a solidão e a efemeridade dos relacionamentos. A dualidade entre realidade e fantasia, vida vivida e vida imaginada, cria uma atmosfera melancólica e contemplativa. Apesar disso, o conto pode parecer fragmentado e hermético, com passagens e reflexões que não se conectam claramente. A densidade da narrativa e as referências literárias e cinematográficas podem desafiar alguns leitores.


Bodas de Pó nos apresenta um encontro entre um casal divorciado, Frederico e a narradora, que se reúnem para discutir a situação de saúde dele e o rumo de suas vidas. O texto é permeado por silêncios carregados de significados, revelando mágoas e arrependimentos não expressos verbalmente. A narrativa é marcada pela presença de lembranças e reflexões sobre o passado do relacionamento dos personagens, as dificuldades enfrentadas e as escolhas feitas ao longo do tempo. A autora aborda de maneira sensível a complexidade das relações humanas, mostrando como as divergências e conflitos podem perdurar mesmo após o fim de um casamento.


A ambientação do conto em uma cafeteria cria uma atmosfera íntima e melancólica, onde as emoções dos personagens parecem se entrelaçar com as conversas ao redor e a movimentação do ambiente. A garçonete, figura secundária, também é explorada de forma simbólica, representando uma espécie de refúgio e serenidade em contraste com a turbulência emocional dos protagonistas. A autora utiliza uma linguagem poética e metafórica para explorar as emoções dos personagens, dando destaque aos gestos e silêncios que revelam mais do que as palavras. O conto nos leva a refletir sobre a efemeridade da vida e dos relacionamentos, a solidão e a inevitabilidade do tempo que nos separa daqueles que um dia foram importantes em nossas vidas.


Animal extinto aborda temas como memória, identidade e desconexão em um mundo futurista onde implantes e próteses neuronais se tornaram comuns. A narrativa segue um protagonista que passa por um processo de remoção de implantes ilegais em seu cérebro e é confrontado com lembranças e sensações que o levam a questionar sua própria existência. O conto apresenta uma atmosfera distópica e tecnológica, onde os personagens lidam com dilemas éticos e emocionais relacionados à sua própria humanidade. A relação entre o protagonista e seu irmão, que sofre de uma condição neurológica, adiciona uma camada emocional à história.


A escrita de Lunardi é poética e melancólica, transmitindo a sensação de estranhamento e desolação do protagonista diante de sua própria desconexão com o mundo. A cena final, com a aparição de um animal extinto, simboliza a perda e a busca pela identidade perdida.


Biografia e correspondência, nos apresenta uma narrativa envolvente que mergulha nas nuances do comportamento humano e nas complexidades das relações interpessoais. Através de uma descrição minuciosa do ambiente de uma livraria e das ações dos personagens, somos levados a refletir sobre a natureza humana e suas motivações. A protagonista, Inês, é retratada de forma intrigante, como uma mulher perspicaz e calculista, que observa atentamente o comportamento das pessoas ao seu redor. Sua postura reservada e sua capacidade de antecipar as ações dos outros revelam uma personalidade enigmática e misteriosa.


O conto aborda temas como solidão, descontentamento e busca por significado, através dos diálogos internos de Inês e de suas interações com os demais personagens. A descrição detalhada das cenas e dos pensamentos da protagonista cria uma atmosfera densa e intrigante, que nos convida a penetrar nas camadas mais profundas da psique humana. A colisão causada por Inês com a moça de lenço é o clímax do conto, um momento crucial que revela a natureza sombria e manipuladora da protagonista. A forma como ela manipula a situação e se aproveita da vulnerabilidade da outra pessoa para atingir seus objetivos nos faz questionar até que ponto somos capazes de ir em busca de nossos próprios interesses.


Toda história em Paris é uma autobiografia, acompanha a narrativa de uma entrevistadora profissional que se vê diante de uma autora em crise, Miranda Sodré, que confessa ter plagiado um livro. Através de um diálogo tenso e cheio de nuances, a entrevistadora busca compreender os motivos por trás da confissão de Miranda e desvendar a verdade por trás do plágio. O conto traz à tona questões sobre autenticidade, fama, pressão social e a complexidade das relações humanas. A autora, através de diálogos bem construídos e uma narrativa envolvente, conduz o leitor por um caminho de descobertas e revelações, fazendo questionamentos sobre a natureza da criatividade, da culpa e da busca pela verdade.


A personagem de Miranda é apresentada de forma multifacetada, demonstrando suas fraquezas, seus medos e suas contradições. A autenticidade de seus sentimentos se choca com a máscara que ela mantém perante o mundo, levando a um desfecho surpreendente e impactante, um conto que instiga reflexões sobre a natureza humana, a busca pela autenticidade e as consequências de nossas escolhas. Com uma narrativa sensível e perspicaz, a autora consegue capturar a complexidade das relações interpessoais e nos levar a questionar o que realmente nos move e define nossa trajetória.


Enquadramento aborda a relação entre duas irmãs enquanto lidam com a chegada de um novo bebê na família. A narrativa é conduzida pela protagonista, que narra a dinâmica complexa entre ela e sua irmã mais nova, Kazuo, em meio a mudanças no ambiente familiar.


A autora utiliza uma composição detalhada do ambiente, como a divisão do quarto entre as camas das duas irmãs e a dinâmica de poder sobre os espaços compartilhados, para explorar os sentimentos de inveja, rivalidade e amor entre as personagens. Através da criação de um mundo imaginário, as irmãs constroem uma narrativa fictícia com personagens e histórias que refletem suas próprias vivências e emoções. O conto aborda questões relacionadas à infância, como a adaptação a mudanças familiares, a rivalidade entre irmãos e a busca por identidade e reconhecimento. A autora mescla elementos lúdicos e emotivos, criando uma atmosfera delicada e envolvente que cativa o leitor com uma narrativa  habilmente construída, com um ritmo fluido e uma linguagem poética que captura a inocência e a complexidade das relações familiares. O desfecho inesperado traz um choque de realidade que desestabiliza a fantasia criada pelas irmãs, resultando em uma reflexão sobre a fragilidade e a efemeridade da infância. É um conto sensível e envolvente que explora temas universais como o amor, a rivalidade e a passagem do tempo, revelando nuances emocionais e psicológicas das personagens. Através de uma narrativa intimista e cuidadosamente elaborada, a autora consegue transmitir os conflitos e as delicadezas das relações familiares de forma tocante e profunda.


Bildungsroman, é uma narrativa angustiante e envolvente que nos leva a refletir sobre questões familiares, o crescimento e a descoberta de si mesmo. A protagonista, uma criança de apenas oito anos, é pega em flagrante realizando mais uma fuga, o que acaba gerando um desconforto e uma tensão palpável dentro de sua casa. A narradora faz jus ao título do conto, que remete ao gênero literário que retrata a formação e o amadurecimento de um personagem. A personagem principal, ainda tão jovem, já se vê diante das consequências de seus atos e de suas escolhas, sendo levada a enfrentar a dura realidade do seu comportamento indisciplinado.


A relação conturbada com seu pai e a sensação de não ser compreendida pelos adultos ao seu redor são elementos marcantes na trama. A menina é colocada de castigo em um ambiente abandonado da casa, onde se vê sozinha e obrigada a lidar com seus pensamentos e sentimentos. Ao longo da história, a protagonista encontra uma forma de se expressar e de se encontrar através da escrita. Ela começa a listar objetos e palavras no espaço ao seu redor, demonstrando sua criatividade e sua necessidade de se fazer presente e ser notada. A escrita envolvente nos conduz por um fluxo de pensamentos tão intensos e profundos quanto os da própria personagem. A sensação de isolamento e a busca por identidade são temas recorrentes que fazem o leitor refletir sobre sua própria jornada de crescimento e amadurecimento, o que faz a escrita de Lunardi um exercício de reflexão acerca da complexidade da infância e da formação da identidade.


Condições do tempo nos apresenta a história de um protagonista que retorna à casa de um antigo amor, Guilherme, após um longo período de ausência. A narrativa é rica em detalhes e reflexões sobre a passagem do tempo, as relações humanas e as escolhas que moldam nossa existência. O protagonista é confrontado com suas memórias e arrependimentos ao revisitar a casa e os momentos compartilhados com Guilherme. A presença do cão Lucius, o jardim bem cuidado, a arte de Guilherme e a atmosfera da festa realizada na casa são elementos que o levam a refletir sobre sua própria vida e as consequências de suas ações passadas.


A narrativa é habilmente construída, alternando entre passado e presente, sonho e realidade, revelando camadas profundas de emoção e arrependimento. A relação entre o protagonista e Guilherme é complexa e carregada de significados, mostrando o peso das escolhas e a dificuldade de lidar com as consequências.  É um conto profundo e emocionante que nos faz refletir sobre as escolhas que fazemos e as consequências que enfrentamos ao longo de nossas vidas. A complexidade dos personagens e a narrativa habilidosa tornam a leitura envolvente e cativante, deixando uma marca duradoura na mente do leitor.

Resenha: Contra o Identitarismo Neoliberal: um Ensaio de Poíesis Crítica Pela Apologia das Artes , de Rubens Russomanno Ricciardi

Foto: Arte digital / Divulgação

APRESENTAÇÃO

A obra é um ensaio de poíesis crítica pela apologia das artes. Trata-se, na filosofia das artes, de uma nova epistemologia voltada às questões da linguagem e da ideologia – ao mesmo tempo hermenêutica e dialética, existencial e crítica. Se, em Marx e Engels, há uma práxis crítica e, na Escola de Frankfurt, uma theoría crítica, com a poíesis crítica pretende-se preencher a lacuna do esquecimento da poíesis e solucionar a confusão entre práxis e poíesis. Definindo a elaboração da obra de linguagem enquanto processo crítico-inventivo, a poíesis não é teórica nem prática. Para a poíesis crítica importa o lógos poético, prosseguindo não apenas os trabalhos iniciados por Heidegger, mas também desde Heráclito e Aristóteles. Com a poíesis crítica se evidencia o abismo que há hoje entre as artes e a indústria da cultura. Os estudos abrangem também as diferenças entre linguagem e comunicação; entre obra de arte e kitsch.

RESENHA

Rubens Russomanno Ricciardi, nascido em 1964, aborda questões urgentes relacionadas ao universo musical em seu ensaio, que incluem política, justiça social, ecossistema, poíesis e práxis. Ele denuncia a ocupação da indústria da cultura nos campos das linguagens artísticas, especialmente na música, e como teorias como a decolonização e o eurocentrismo são usadas para lucrar com o domínio das massas. Russomanno defende a necessidade de colocar a indústria da cultura em seu lugar e destaca a importância de distinguir arte dessa indústria. Ele critica a busca por sucesso imediato por gestores de instituições públicas, que desconsideram os processos civilizatórios que são desenvolvidos a longo prazo e alerta sobre os desastres que concessões no meio do caminho podem causar.

O autor esclarece que a poíesis crítica propõe uma abordagem que integra a questão da linguagem e da ideologia, buscando preencher a lacuna entre práxis e poíesis. O ensaio questiona o eurocentrismo e a decolonialidade, criticando a aversão às artes e à música geradas por ideologias neoliberais. O texto também aborda a crítica ao identitarismo e ao culturalismo, apontando para a influência da indústria da cultura dos EUA e a alienação e coisificação promovidas pelo neoliberalismo. Por fim, a estética, cultura, comunicação e identidade são conceitos vistos como neologismos tardios e extrínsecos à natureza da arte pela poíesis crítica.

Neste ensaio, o autor critica a colonização genocida promovida pela Europa ao longo dos séculos, destacando o racismo, a exploração mercantilista e a perseguição às minorias. Também aborda a resistência aos excessos de alguns grupos identitários neoliberais, que deturpam questões histórico-filosóficas e servem a novas ideologias colonialistas. O autor defende um estudo crítico sobre a eurocentricidade nas artes e a decolonialidade. Além disso, enfatiza a importância da poíesis crítica e da valorização das artes de todos os tempos e lugares, especialmente as brasileiras. Por fim, propõe um maior fomento às artes no Brasil e convida para um estudo conjunto visando uma discussão conceitual alternativa ao culturalismo e à hegemonia neoliberal na indústria da cultura.

Jean-François Lyotard pensou a pós-modernidade a partir da relação entre conhecimento e poder decisório do terror tecnocrata, mas o conceito acabou sendo adotado pela economia e pelas artes. No entanto, a ideia de pós-modernidade não faz sentido nessas áreas, uma vez que o neoliberalismo não representa a superação do capitalismo e a modernidade artística sempre esteve envolta em paradoxos desde suas primeiras gerações. O neologismo de decolonialidade de Aníbal Quijano também foi desvirtuado e acabou prejudicando os estudos de linguagem. Tanto pós-modernidade quanto eurocentrismo e decolonialidade, idealizados na esquerda, se tornaram pautas neoliberais, chegando a afetar a teoria e a subsistência das artes. Na América Latina, a aversão ao eurocentrismo acabou favorecendo a imagem dos EUA, estabelecendo o problema no eurocentrismo em vez do centrismo norte-americano.

O livro aborda a poíesis, que engloba artistas como poetas, arquitetos, coreógrafos, entre outros, e envolve os processos de concepção e produção de obras de arte. Destaca a importância da crítica e invenção na linguagem artística, discute a relação entre Marx, Engels e a ausência do conceito de poíesis, e explora a autonomia dialética da arte. O texto também menciona a importância da mímesis, do distanciamento crítico e da abstração na poíesis, ressaltando a necessidade de preservar a liberdade artística e evitar a alienação. Por fim, aborda conceitos como pólemos em Heráclito, a fusão de horizontes e a valorização da liberdade dentro das restrições na criação artística. A poíesis engloba a composição autoral e o tratamento inventivo do material artístico, enquanto a práxis é o processo hermenêutico de interpretação e execução corporal das fontes da obra. A técnica nas artes é essencial para a constituição da linguagem, representando uma essência ontológica que envolve tanto a poíesis quanto a práxis. O conceito de lógos, originalmente grego e relacionado à linguagem e inteligência, é fundamental para o entendimento das artes representativas, como teatro, dança e música. Heidegger ressalta a importância da alétheia, o desvelamento na linguagem, que diferencia a téchne, arte, da epistéme, conhecimento nas ciências. A distinção entre artista e artesão também é abordada, ressaltando a importância do know-how e do trabalho manual na técnica artística.

O texto discute a diferença entre a poíesis humana e a poíesis da natureza, destacando a monumentalidade da poíesis da phýsis. O autor argumenta que o Homo sapiens, sem sabedoria, se considera um Homo creativus, mas na verdade é um Homo stultus que perturba a natureza. É enfatizada a importância de distinguir entre a criação da natureza e as invenções humanas, assim como a necessidade de humildade e respeito diante da natureza. Além disso, é abordada a questão da relação entre a religião e a destruição da natureza, ressaltando a importância do cuidado com o meio ambiente. Por fim, são propostos quatro desdobramentos para o lógos humano: homologia, lógos filosófico, lógos poético e lógos corpóreo, discutindo a importância da theoría, poíesis e práxis nas artes e na filosofia, destacando a necessidade de uma visão crítica e existencial para compreender a complexidade dos fenômenos. A theoría é essencial para as ciências da natureza e a filosofia, bem como para a poíesis e práxis nas artes. A transformação do mundo depende de um pensamento crítico, da poíesis e do olhar profundo sobre as questões da essência para além da aparência. A poíesis é uma forma de utopia que transforma o mundo, enquanto a práxis política sem poíesis crítica pode levar ao fracasso. A arte e a filosofia radicais são fundamentais para compreender e transformar a realidade. O texto também critica a redução da teoria e da prática, enfatizando a importância da poíesis na criação artística e em outros campos como a engenharia e medicina. O esquecimento da poíesis prejudica não apenas as artes, mas também questões ideológicas e linguísticas, sendo essencial valorizar a invenção e a originalidade nas artes.

O ensaio também aborda questões como identitarismo, homossexualidade, luta pela igualdade social, história da homossexualidade na Alemanha, críticas de Marx e Engels, eurocentrismo, decolonialidade, arte brasileira, vandalismo, inclusão neoliberal, CAPES, ensino, pesquisa, extensão universitária, cultura na universidade, política cultural e autonomia das artes. Enfatiza a importância da pesquisa rigorosa, da crítica à sociedade repressiva, da arte como expressão da condição humana e do desenvolvimento de políticas que promovam a emancipação e a transformação social, concluindo assim, que, a linguagem, portanto, é essencial para a expressão artística, a compreensão crítica e a emancipação do pensamento crítico-existencial na poíesis crítica. Ela transcende a mera comunicação para se tornar a base da obra de arte e da reflexão filosófica, sendo fundamental para a compreensão do mundo e da existência humana.

O autor também aborda a questão do esquecimento da poíesis em Marx e Engels em relação a Max Stirner, destacando a importância da poíesis na produção artística e sua diferença em relação à produção de trabalho. Ele critica a falta de reconhecimento da poíesis na estética, ressaltando a importância da percepção sensorial e da habilidade inventiva na criação artística. O autor também menciona casos de censura identitária na arte, destacando a importância de valorizar a poíesis em vez de priorizar a práxis ou a representatividade em questões artísticas.

O autor reconhece a importância de valorizar a ancestralidade negra e indígena nas artes brasileiras, destacando a luta política e econômica por justiça, igualdade e dignidade. Discute a questão do racismo cotidiano e a importância de combinar raça e classe na luta social. Também aborda a questão do conceito de raça e sua relação com o racismo, defendendo a necessidade de preservar a memória dos artistas pretos e pardos no Brasil, desde o período colonial até os dias atuais. Além disso, questiona a visão deturpada de elitismo cultural por parte de alguns setores, destacando a importância dos projetos sociais e das escolas de música na formação educacional das crianças.

O autor entende que conceito de cultura passou por mudanças significativas desde o Iluminismo, deixando de ser associado apenas à agricultura e se tornando manifestação do intelecto humano. Nos tempos modernos, a cultura é confundida com arte, mas isso prejudica a compreensão da essência da arte. A divisão entre alta e baixa cultura é preconceituosa e não ajuda a compreender as artes. A ideia de cultura se generalizou e prevalece até hoje, mas pode ser prejudicial para as artes. A indústria da cultura, um monstro engendrado pela racionalidade, contribui para a confusão entre cultura e arte. A poíesis crítica busca emancipar as artes dos campos da cultura, comunicação e identidades. Atualmente, a cultura é predominada pelo kitsch e a arte é sufocada por ela. A cultura não pode se confundir com o mundo da vida, e a arte é uma exceção que se distancia crítica das ideologias culturais. Os processos de coisificação e alienação são intensificados pelo capitalismo neoliberal, que lucra com a cultura. A cultura contemporânea, produzida em série, se tornou um espetáculo kitsch do capitalismo predatório, que destrói as inteligências e linguagens humanas.

Nesta obra, expõe-se também que Mario Stoppino e Norberto Bobbio discutem os significados fraco e forte de cultura, fazendo paralelos com a ideologia em Marx e Engels. O significado fraco abrange todas as manifestações humanas, enquanto o forte se concentra na poíesis crítica. A cultura fraca relativiza todas as atividades humanas como arte e filosofia, mas não consegue diferenciá-las. No significado forte, a cultura se restringe ao costume, ao hábito, e à norma, além de buscar a exceção e a singularidade na superação da lógica de um sistema. O texto critica a priorização da indústria da cultura em detrimento das artes, defendendo a liberdade das expressões artísticas e alertando para a alienação causada pela invasão cultural. Estudos culturais devem valorizar a poíesis crítica e a liberdade inventiva das artes, fugindo dos padrões impostos pela indústria da cultura. Os casos de Bach e Beethoven são apresentados como exemplos de artistas que transcendem sua época e se destacam pela qualidade e originalidade de suas obras.

A discussão sobre a aporia entre conservador e progressista na poíesis crítica revela a incoerência e os engodos presentes nesse debate. A delimitação entre conservador e progressista acaba levando a caminhos viciados. A luta por preservar a natureza e a dignidade da vida humana é essencial, mas forçar uma definição simplista entre os dois extremos não reflete a complexidade da realidade. A dicotomia conservador/progressista não é suficiente para entender as nuances ideológicas e políticas em questão. Em meio a críticas à política econômica conservadora e à iconoclastia progressista, é possível perceber a complexidade das relações entre partidos políticos e ideologias. A resistência às invasões culturais e a valorização da poíesis como forma de transcendência são aspectos centrais na reflexão sobre os desafios contemporâneos das artes.

A obra de Rubens Russomanno Ricciardi destaca a importância de compositores como Bach e Mozart, considerados universalmente influentes. Questiona o relativismo cultural da indústria da cultura, que valoriza a diversidade, mas acaba impondo suas próprias ideologias. Discute também a diferença entre arte popular e indústria cultural, e aponta incoerências nas pautas identitárias neoliberais em relação às artes milenares, ressaltando a importância da integridade ontológico-poético-crítica e fazendo críticas a algumas posturas e práticas.

Apesar dos questionamentos e críticas apresentados, a obra de Rubens Russomanno Ricciardi se destaca por abordar questões urgentes e relevantes relacionadas ao universo musical e à indústria da cultura. Sua defesa da importância da poíesis crítica, da valorização das artes de todos os tempos e lugares, e do combate ao eurocentrismo e à colonização genocida são aspectos que merecem destaque. O autor demonstra um profundo conhecimento e reflexão sobre temas complexos como identitarismo, neoliberalismo, racismo e preservação da natureza, apontando para a necessidade de uma visão crítica e existencial para compreender e transformar a realidade. A obra de Rubens Russomanno Ricciardi contribui para ampliar o debate e o entendimento sobre as questões artísticas e culturais da atualidade, estimulando o leitor a refletir e se posicionar diante desses desafios.

Resenha: Luiz Gama Contra o Império: A Luta Pelo Direito no Brasil da Escravidão, de Bruno Rodrigues de Lima

Foto: Arte digital / Divulgação

APRESENTAÇÃO

“Luiz Gama contra o Império” marca um novo estágio nos estudos sobre a trajetória e a obra de Luiz Gama, este personagem tão importante de nossa história, nosso maior advogado, nosso abolicionista primeiro e um dos grandes pensadores da formação social brasileira. Bruno Lima dá corpo e nos permite um mergulho profundo no pensamento de Luiz Gama, mas também nas mazelas e nas possibilidades emancipatórias que fazem parte do Brasil." SILVIO ALMEIDA

"Se a História do Brasil fosse um misterioso quebra-cabeça e estivesse faltando uma de suas peças essenciais, você não levaria muito tempo para perceber que este livro é a peça que faltava." TÂMIS PARRON A Editora Contracorrente tem a satisfação de anunciar o lançamento do livro “Luiz Gama contra o Império: A luta pelo direito no Brasil da Escravidão”, de autoria do pesquisador Bruno Rodrigues de Lima, reconhecidamente o maior especialista na obra de Luiz Gama.

A obra, que nasce clássica, corresponde à versão revista e atualizada da tese de doutorado que o autor defendeu na Faculdade de Direito da Johann Wolfgang Goethe-Universität Frankfurt am Main e que lhe rendeu o prêmio Walter Kolb de melhor tese de doutorado da Universidade de Frankfurt e a medalha Otto Hahn de destaque científico da Sociedade Max Planck.

RESENHA

A obra ressalta a importância de Luiz Gama como um pensador do Brasil, não apenas como um advogado e abolicionista. Ele foi fundamental na análise da realidade brasileira, criticando suas estruturas políticas e jurídicas. Sua luta pela abolição da escravidão também estava ligada à necessidade de uma mudança política, mostrando que a liberdade dos escravizados dependia da liberdade do país de suas amarras políticas e econômicas. Além disso, Luiz Gama também trouxe a questão africana para a formação do Brasil, sendo um defensor da liberdade dos africanos trazidos à força para o país. O livro "Luiz Gama contra o Império" marca um novo estágio nos estudos sobre Luiz Gama, destacando sua importância como advogado, abolicionista e pensador da formação social brasileira.

O livro é uma versão revista e atualizada da tese de doutorado de Bruno Rodrigues de Lima, defendida em 2022. O trabalho recebeu prêmios e reconhecimento acadêmico. O autor agradece aos professores, ao Instituto Max Planck, colegas acadêmicos, funcionários de arquivos, equipe da editora Contracorrente, amigos e família. Ele também destaca a importância da orientação de seu orientador, Thomas Duve, e do apoio de diversos professores ao longo de sua formação acadêmica.

A obra se inicia narrando os acontecimentos em 1880, quando o juiz Lúcio de Mendonça escreveu o primeiro perfil biográfico do jurista Luiz Gama, destacando a importância do direito na vida e na luta contra a escravidão de Gama. Mendonça sugeriu que a história do jurista deve ser estudada através do direito, e não da política ou do romance. A vida de Gama é marcada por suas atividades como soldado, amanuense, advogado e teórico da sociedade, desenvolvendo uma literatura normativo-pragmática voltada para a produção de liberdade. Seu legado é ressaltado como fundamental para a compreensão da história do direito no Brasil do século XIX, fazendo com que a história do labirinto na literatura ocidental foi reinterpretada por Jorge Luis Borges em 1947 em seu conto "A casa de Astérion", oferecendo uma nova visão do mito do Minotauro. Borges humanizou o monstro, que antes era visto apenas como irracional, trazendo a solidão e o pensamento à sua personagem. Posteriormente, o texto aborda a relação entre o Brasil do século XIX, visto como um labirinto de nações, e a política do contrabando negreiro, que direcionou a entrada de milhões de africanos no país, influenciando a luta pela liberdade dos negros escravizados e libertos. A trajetória de Luiz Gama, nascido na Bahia em meio a essa realidade, é apresentada como um exemplo de resistência e luta por liberdade em um contexto marcado pelo contrabando e pela escravidão.

Na novela Bartleby, o escrevente, o advogado narra a contratação do misterioso Bartleby, que entra para seu escritório como um copista dedicado, mas se recusa a fazer qualquer coisa, respondendo apenas com um "preferiria não fazer". A recusa de Bartleby começa a influenciar os outros personagens, levando-o a perder o emprego e acabar na prisão. O comportamento de Bartleby é interpretado de diversas formas por críticos literários, relacionando-o com a modernidade e a alienação do trabalho. O texto também explora a relação do autor com o direito e a burocracia, destacando a atuação de Luiz Gama na defesa dos direitos dos africanos livres em São Paulo durante o século XIX, mostrando como ele utilizou seu conhecimento normativo para garantir a liberdade dessas pessoas. No entanto, Luiz Gama assumiu o papel de liderança na redação do jornal Radical Paulistano, dedicando-se principalmente a temas jurídicos. Suas crônicas forenses abordavam injustiças e abusos cometidos pelo sistema judiciário, como casos de escravos submetidos a torturas e mortes brutais. Gama utilizava a literatura para denunciar a violência do sistema escravista e a corrupção na administração da justiça, confrontando diretamente juízes e autoridades que permitiam esses abusos. Com uma abordagem crítica e contundente, ele questionava a moralidade e a justiça do Império do Brasil, defendendo a liberdade e os direitos humanos em meio a um cenário de opressão e desigualdade.

Em março de 1872, o jurista Rudolf von Jhering proferiu uma conferência acadêmica em Viena, intitulada "A luta por direito", que teve grande impacto na literatura jurídica de diversos países. Jhering propôs o conceito de "luta" como fundamental para interpretar a história do direito, afirmando que todas as conquistas do direito foram alcançadas através de lutas árduas. Ele mencionou a abolição da escravidão como um exemplo marcante dessa luta pelo direito. Em seguida, o texto aborda a trajetória do jurista Luiz Gama na década de 1870, destacando sua atuação em uma ação judicial na comarca de Santos, envolvendo a partilha do inventário do comendador português Ferreira Neto. Gama solicitou informações sobre os escravos deixados pelo comendador, buscando compreender a situação desses indivíduos e possivelmente garantir-lhes a liberdade. Essa ação judicial foi um dos episódios marcantes da atuação de Gama na defesa dos direitos dos escravizados.

Em fevereiro de 1940, o poeta Paulo da Portela, junto a Cartola e Heitor dos Prazeres, tentou desfilar junto à escola de samba Portela, mas foram impedidos pela diretoria por não estarem trajando as cores da escola. Paulo ficou magoado e se afastou da Portela por nove anos. Após a sua morte, a escola o homenageou diversas vezes, mas a ferida do desentendimento ainda doía. Da mesma forma, Luiz Gama, abolicionista, foi esquecido e seu legado foi distorcido por outros historiadores, como Joaquim Nabuco, que preferiam creditar a liderança a outros. Apesar disso, o povo negro nunca deixou o nome de Paulo da Portela e Luiz Gama caírem no esquecimento, mantendo sua memória viva através da tradição oral, imprensa negra e celebrações anuais. A escola de samba Portela se comprometeu a recontar a história de Luiz Gama em seu desfile.

O estudo apresentado na obra pelo autor é extremamente relevante ao destacar a importância de Luiz Gama como pensador do Brasil, indo além de sua figura como advogado e abolicionista. No entanto, a obra poderia se aprofundar mais na análise do impacto das ideias e ações de Gama na sociedade brasileira da época, bem como em sua relevância para os dias atuais. Além disso, o texto poderia abordar de forma mais crítica as interpretações distorcidas de seu legado por parte de outros historiadores, como Joaquim Nabuco, e ressaltar a importância de preservar e perpetuar a memória de figuras como Luiz Gama na história do Brasil.

Ascensão das Trevas: O Segundo livro da saga Herdeiro das Trevas de C.S. Pacat já está entre nós

Foto: Arte digital / Divulgação
Ascensão das Trevas, segundo livro da saga Herdeiro das Trevas de C.S. Pacat já está entre nós e pode ser adquirido no site da editora Record ou sites de venda pela internet. Convidamos vocês à se aventurar no mundo mágico de Herdeiro das Trevas - Ascensão das Trevas - Vol. 2, a emocionante sequência do aclamado primeiro livro da série. Neste segundo volume, Will e seus amigos enfrentarão uma nova ameaça das Trevas que promete trazer ainda mais perigos e reviravoltas a suas vidas. Com segredos sombrios sendo revelados e alianças arriscadas sendo feitas, o destino de todos está em jogo.

Prepare-se para mergulhar em uma história repleta de magia, ação e mistério, onde a luta entre a Luz e as Trevas atinge novos patamares. Será que Will conseguirá manter sua verdadeira identidade em segredo? Será que o passado pode ser a chave para salvar o presente, ou o que causará a ruína de todos? Não perca a oportunidade de acompanhar essa emocionante jornada em Herdeiro das Trevas - Ascensão das Trevas - Vol. 2, e descobrir o desfecho dessa épica batalha que pode mudar o destino de um mundo inteiro. Escolha o seu lado e embarque nessa incrível aventura!



SINOPSE DO LIVRO

As Trevas estão de volta. E um mundo antigo prestes a ressurgir. Herdeiro das Trevas é a esperada sequência de Ascensão das Trevas. Dessa vez, Will e seus amigos precisarão lutar contra um mal que já caminha entre eles. Os guerreiros da Luz sobreviveram ao primeiro ataque das Trevas, mas pagaram um preço alto demais. Com outra ameaça prestes a eclodir, se não agirem depressa, muito mais tragédias estarão a caminho. Perseguidos pelas forças inimigas, Will e seus aliados precisam deixar a segurança do Salão e viajar até o mundo antigo para deter a ascensão das Trevas, fazendo novas e perigosas alianças e desvendando segredos impactantes do passado. No entanto, Will também esconde um segredo sombrio: sua verdadeira identidade. Caso a verdade venha à tona, quem é amigo pode se tornar um inimigo. Mas a atração que sente por James St. Clair, o Traidor, faz com que se aproxime cada vez mais de sua vida pregressa e das Trevas. Será que não apenas Will, mas também seus aliados, conseguirão lutar contra o próprio destino? Será que conhecer o passado pode ser a chave para salvar o presente, ou justamente o que causará o fim de todos? Herdeiro das Trevas é a imperdível sequência do best-seller Ascensão das Trevas. “Uma fantasia instigante. Eu simplesmente não conseguia largar.” — V. E. Schwab, autora de A vida invisível de Addie LaRue, best-seller do New York Times “Uma história narrada com detalhes devastadores e brilhantes. Ninguém consegue parar de ler.” — Chloe Gong, autora de Prazer


Compre na Amazon com preço promocional + brindes exclusivos:

https://www.amazon.com.br/Herdeiro-Trevas-Vol-Ascens%C3%A3o-BRINDES/dp/8501307068

Resenha: Introdução ao estudo do léxico: Brincando com as palavras, de Rodrigo llari

Foto: Arte digital / Divulgação

 

APRESENTAÇÃO

Em um livro lúdico - e valendo-se da experiência e da qualidade de trabalho desenvolvido como um dos maiores linguístas brasileiros da atualidade - Rodolfo Ilari apresenta-nos uma grande obra sobre as possibilidades de estudo das palavras no português do brasileiro. Mais do que isso: Ilari nos faz percorrer o caminho do jogo, perceber nas construções mais cotidianas (como a piada entre amigos ou o jogos de adivinha) os mecanismos de que o falante se utiliza na construção da linguagem. Homônimos, sinônimos, antônimos, ambiguidades e anglicismos são alguns dos assuntos abordados nesta obra fundamental para alunos de Letras, professores de Português e demais interessados em compreender nossa língua mais a fundo.


RESENHA


O livro "Introdução ao estudo do léxico - brincando com as palavras" de Rodolfo Ilari aborda a importância das palavras na construção de mensagens linguísticas com foco no significado. O autor, conhecido por sua expertise na linguagem, conduz os leitores a uma reflexão sobre a linguagem, visando preparar futuros professores para ensinarem de forma crítica e independente. Ilari destaca-se pela profundidade de seus conhecimentos, versatilidade na ciência da linguagem e preocupação com o ensino de língua e formação de professores. O livro é um guia essencial para quem busca compreender e ensinar a linguagem de forma eficaz.


Em 'ambiguidade', o autor aborda a ambiguidade na linguagem, que consiste na característica das sentenças que apresentam mais de um sentido. São mostrados diversos fatores linguísticos que podem gerar ambiguidades, como a possibilidade de uma sentença ter duas análises sintáticas diferentes, um pronome com dois antecedentes, uma palavra com dois sentidos diferentes, um mesmo operador aplicado de duas maneiras diferentes, entre outros. Além disso, a ambiguidade também pode decorrer da dificuldade em discernir se as palavras foram utilizadas de forma literal ou indireta. O texto propõe um teste para identificar a ambiguidade em sentenças e apresenta exemplos de manchetes de jornais ambíguas. A atividade proposta é relatar um caso de interpretação equivocada de uma informação ou ordem, e é sugerida uma série de exercícios para analisar a ambiguidade em manchetes de jornais.


Em 'anglicismo', aborda o fenômeno dos anglicismos no português do Brasil, que são palavras e construções gramaticais que foram incorporadas do inglês ao longo do tempo. Essa incorporação acompanha a assimilação de artefatos, tecnologias e hábitos que esses termos nomeiam. Muitas palavras foram recebidas do inglês nos séculos XIX e XX, especialmente ligadas ao vestuário, comércio, esporte, cinema e tecnologia. Um exemplo é a informática, que trouxe uma grande quantidade de anglicismos para o português do Brasil. O texto também apresenta exercícios para identificar e compreender o significado de anglicismos em diversas áreas, como política, esporte e produção. Além disso, explora a origem e curiosidades de palavras inglesas incorporadas à língua portuguesa.


No capítulo 'antonímia',  o autor explica que antonímia é a exploração de palavras e frases que podem ser colocadas em oposição, com o objetivo de enriquecer a reflexão e a expressão. Antônimos são palavras que se referem a realidades opostas, como ações, qualidades, relações, entre outros. Essas oposições podem ter fundamentos diferentes, como diferentes posições numa mesma escala, início e fim de um mesmo processo ou diferentes papéis numa mesma ação. A antonímia pode ser encontrada em substantivos, adjetivos, verbos, advérbios, preposições, entre outros. Além disso, textos podem construir oposições entre palavras e expressões que não consideramos como antônimas. Atividades e exercícios são propostos para explorar esse recurso na linguagem.


O capítulo 'arcaísmo', somos levados à compreensão de que são expressões que caíram em desuso na língua, refletindo um estado mais antigo. Podem ser encontrados em diversos domínios da língua, como no vocabulário, morfologia e sintaxe. O uso de arcaísmos é mais comum na literatura e em autores que fazem do arcaísmo um recurso de estilo. Palavras e construções se tornam arcaicas devido a objetos, técnicas e hábitos em desuso, ou pela perda de ligação com outras palavras de origem comum. Exemplos de arcaísmos incluem expressões como "senhor" em substituição a "senhora", ou a palavra "dulcidão" em vez de "doçura". Além disso, foi apresentado um trecho de uma carta do século XVIII como exemplo de arcaísmos e foram propostos exercícios para identificar e compreender o uso de arcaísmos.


Foto: Arte digital / Divulgação


No capítulo 'campos lexicais', o autor esclarece que campos lexicais são conjuntos de palavras que nomeiam experiências semelhantes, como cores ou animais. A organização desses campos pode ser feita por meio da análise componencial, que quebra a significação das palavras em unidades menores, ou pela análise por protótipos, identificando indivíduos representativos da categoria. Exercícios propostos envolvem a aplicação desses conceitos, como associar marcas a produtos, distinguir palavras com traços específicos, e criar gráficos ou diagramas com palavras relacionadas. Além disso, é discutida a relação entre antigos fabricantes e marcas após fusões de empresas.


Em '(In-) compatibilidades entre partes de uma sentença',  aborda as incompatibilidades entre as partes de uma sentença, tanto no aspecto linguístico quanto no prático. São apresentados exemplos de combinações de palavras que causam estranheza ou não fazem sentido, devido às restrições de seleção lingüística. Além disso, são propostos exercícios práticos para identificar e compreender essas incompatibilidades, como completar frases corretamente, identificar coletivos, interpretar anúncios imobiliários e analisar diálogos que apresentam equívocos de entendimento. Através dessas atividades, mostra-se a importância de compreender as restrições de seleção nas sentenças para uma comunicação eficaz.


Em  'definições',  aborda a importância de formular definições claras e corretas, destacando os defeitos mais comuns encontrados nesse tipo de texto. Ele mostra exemplos de definições bem formuladas e ressalta que uma boa definição ajuda a aumentar o vocabulário, eliminar ambiguidades e tornar preciso o uso de palavras vagas. São apresentadas características do que uma boa definição não deve ser, como uma simples enumeração de exemplos, definições circulares, obscuras, amplas, estreitas, figuradas, negativas e atividade de resolução de exercícios sobre definições.


Em 'Distribuição: os constituintes da oração',  aborda a distribuição dos constituintes da oração, destacando a importância da combinação de palavras de acordo com esquemas sintáticos conhecidos intuitivamente pelos falantes da língua. São apresentadas noções como oração bem formada, distribuição e constituinte, ilustradas com exemplos. São propostos exercícios para prática e análise da distribuição dos constituintes em frases, bem como sugestões de atividades e testes para aplicação prática dos conceitos apresentados.


Em 'estrangeirismos', explica que estrangeirismos são palavras ou expressões de outras línguas que são incorporadas ao português ao longo da sua história. Essa influência linguística enriquece a língua, mas também gera polêmicas e debates sobre a preservação do idioma. O uso de estrangeirismos é visto como uma forma de enriquecimento, mas também pode ser considerado um vício de linguagem. Além disso, existem projetos de lei, como o Projeto de Lei No 1676/99, que buscam regular o uso de palavras estrangeiras no Brasil. Argumentos contrários ao uso excessivo de estrangeirismos incluem a proteção da integridade da língua e a valorização do idioma nacional.


Em 'etimologia', o autor esclarece que etimologia é o estudo da origem das palavras e pode ser científica ou popular. A etimologia científica investiga a origem das palavras de forma histórica, mostrando a continuidade entre a forma e o sentido atual das palavras e suas formas mais antigas. Já a etimologia popular é uma prática não científica onde as pessoas modificam as palavras para explicar sua significação. A língua portuguesa no Brasil possui palavras de várias origens, como latina, grega, germânica, árabe, indígena e africana, além de palavras emprestadas de outras línguas ao longo dos séculos. A formação de novas palavras a partir de palavras pré-existentes na língua é um mecanismo importante na evolução da língua. Diversos exercícios são propostos para explorar a etimologia e a formação de palavras.


Em 'flexão nominal',  aborda a flexão nominal, que engloba variações de gênero, número e grau em substantivos e adjetivos. São apresentados exemplos de flexões e atividades para refletir sobre o tema, como a formação do feminino de palavras, o uso de adjetivos no comparativo e superlativo, e a intensificação de adjetivos. Também é discutida a diferença entre o uso genérico e específico do singular em manchetes de jornais.


Em 'Formação de palavras novas e sentidos novos na língua',  discute os principais processos de formação de palavras na língua portuguesa, como a sufixação, a prefixação e a composição. Ele também destaca a criação de novos sentidos para palavras já existentes. São apresentados exemplos de palavras formadas por esses processos, assim como atividades e exercícios para explorar a criação de novas palavras e significados na língua. Além disso, são mencionados neologismos que surgiram nos últimos anos.


Em 'Homonímia',  trata da homonímia, que são palavras que se pronunciam da mesma maneira, mas têm significados distintos. Exemplos dados incluem palavras que pertencem a classes gramaticais diferentes e palavras que se escrevem de maneiras diferentes. Apesar de causar ambiguidade, o contexto geralmente elimina as dúvidas causadas pela homonímia. O texto também apresenta atividades para identificar palavras de duplo sentido e explorar piadas e brincadeiras que utilizam a homonímia. Por fim, inclui um exercício que exemplifica como a interpretação de uma pergunta pode variar de acordo com o sentido de uma palavra.


Em 'Motivação icônica',  discute a motivação icônica na linguagem, que se baseia na relação entre forma e sentido. São apresentados exemplos de como essa motivação é utilizada na comunicação, como na onomatopeia, na ordem do texto e na proximidade das formas. Um experimento realizado por um psicolinguista é descrito para exemplificar como a linguagem pode ser intrinsecamente motivada. São propostos exercícios para explorar a motivação icônica na linguagem, como identificar nomes de pássaros que imitam a voz do próprio pássaro e analisar a representação de diferentes ruídos e sons na linguagem. O texto também discute a distinção entre onomatopeia primária e secundária, citando exemplos de como a linguagem pode ser icônica e simbólica em diferentes idiomas.


Em 'Nexos entre orações',  discute a possibilidade de estabelecer nexos entre orações para compreender melhor o papel das conjunções. Tradicionalmente, orações são descritas na sintaxe do período como coordenação e subordinação. São apresentados exemplos de conversão de orações em elementos substantivos, adjetivos e adjuntos. Além disso, são propostos exercícios práticos para identificar e analisar o uso de conjunções em diferentes contextos.


Em 'números',  aborda a importância dos números na nossa vida cotidiana, especialmente na linguagem. Os diferentes tipos de numerais são discutidos, assim como suas aplicações em diversas construções linguísticas. São propostos exercícios práticos para explorar a relação entre números e palavras, como analisar expressões que contêm numerais, realizar conversões de unidades de medida e refletir sobre o uso de numerais em diferentes contextos. O texto também destaca a presença de antigos numerais em formações linguísticas atuais e aborda a importância de interpretar corretamente informações numéricas em notícias e manchetes.


Em 'As palavras-pro', aborda o uso dos pronomes na língua portuguesa, questionando a ideia tradicional de que os pronomes "substituem" os nomes. Além disso, apresenta exemplos de diferentes usos dos pronomes, como identificar os participantes de um diálogo e funcionar como variáveis matemáticas. O texto também propõe atividades, como analisar diálogos e redigir regulamentos de jogos, que envolvem o uso correto dos pronomes na língua portuguesa.


Em 'Reconhecimento de formas de um mesmo paradigma flexional',  aborda a importância do reconhecimento de formas de um mesmo paradigma flexional, como verbos, substantivos e adjetivos, para fortalecer a noção de paradigma de conjugação. São apresentados exemplos de como identificar essas formas e exercícios para praticar esse reconhecimento, além de reflexões sobre a irregularidade da flexão, a utilização de adjetivos e verbos e a relação entre diferentes formas verbais. Diversos exemplos e atividades são propostos ao longo do texto para exemplificar e aprofundar o tema.


Em 'Polissemia',  aborda o conceito de polissemia, que se refere aos diferentes sentidos que uma mesma palavra pode assumir, tornando-a apta a ser utilizada em diferentes contextos. A polissemia é contrastada com a homonímia, pois para que haja polissemia é preciso que haja uma única palavra, enquanto a homonímia envolve mais de uma palavra. Além das palavras, a polissemia também afeta construções gramaticais. O texto apresenta exemplos de diferentes sentidos da palavra "velar" e propõe exercícios para explorar a diversidade de significados das palavras em diferentes contextos.


Em 'Predicados de predicados; predicados de eventos',  aborda a ideia de predicados de predicados e predicados de eventos, apresentando exemplos e diferentes formas de modificação dos predicados em uma frase. São discutidos também os diferentes tipos de advérbios, locuções adverbiais e verbos que podem ser utilizados para modificar predicados. Por fim, são propostos exercícios relacionados à aplicação dos conceitos discutidos no texto.


Em 'Sinonímia',  aborda a distinção entre substantivos contáveis e não-contáveis e explora o uso eficaz de ambos. Substantivos contáveis designam objetos discretos que podem ser contados no plural, enquanto os não-contáveis designam porções de substância que não são contáveis no plural. São fornecidos exercícios práticos para compreender essa distinção, como identificar palavras contáveis e não-contáveis em textos, completar frases com palavras adequadas do par, entre outros.


Em 'Sufixos', o autor esclarece que sufixos são unidades significativas adicionadas à direita de um radical para formar novas palavras. Existem diversos sufixos na língua portuguesa, como -ismo, -ista, -ando, -ento, -ável, -udo, entre outros. Eles podem ter mais de um sentido e são utilizados para formar palavras de classes específicas. Um exemplo é o sufixo -izar, que forma verbos transitivos a partir de substantivos e adjetivos. Alguns sufixos, como -ismo, -ista, -ável, podem indicar uma opinião negativa em certas palavras. Os sufixos não são aplicados aleatoriamente e cada um se aplica a palavras de uma classe determinada, criando palavras também de classes específicas.


Em 'termos genéricos e termos específicos',  discute a diferença entre termos genéricos e termos específicos, mostrando que os termos genéricos são mais abrangentes, enquanto os termos específicos são mais precisos. Ele exemplifica essa ideia com o uso de hipônimos e menciona a importância de usar termos específicos para fornecer mais informações sobre um objeto. Em seguida, propõe exercícios para praticar a distinção entre termos genéricos e específicos. Além disso, apresenta situações cotidianas em que o uso de termos genéricos pode gerar problemas de comunicação. Por fim, inclui uma anedota e uma questão de vestibular que abordam o tema.


Em 'Variação diastrática e de registro',  aborda a variação diastrática e de registro na linguagem, destacando a convivência de diferentes variedades linguísticas na sociedade brasileira e a influência de fatores como a educação formal e a informalidade da situação de fala. Apresenta características do português substandard, como a tendência a tornar paroxítonas as palavras proparoxítonas, redução de ditongos, trocas de letras e o uso de formas específicas. Além disso, discute a importância do registro na linguagem, que varia conforme a situação de comunicação, como o número de participantes, formalidade, assunto e veículo de comunicação. Também menciona as linguagens próprias de grupos sociais, como gírias e expressões técnicas, e propõe atividades e exercícios para reflexão sobre essas questões.


O livro "Introdução ao estudo do léxico - brincando com as palavras" de Rodolfo Ilari é uma obra completa e essencial para quem deseja compreender de forma profunda a linguagem e o significado das palavras. O autor, com sua vasta experiência na área, conduz os leitores em uma jornada reflexiva sobre diversos aspectos da linguagem, preparando futuros professores de forma crítica e independente. Os capítulos abordam temas como ambiguidade, anglicismos, antonímia, arcaísmo, campos lexicais, incompatibilidades entre partes da sentença, entre outros, proporcionando uma visão abrangente e enriquecedora sobre o léxico. Os exemplos e exercícios propostos ao longo do livro são um grande diferencial, permitindo aos leitores uma compreensão prática e aprofundada dos conceitos apresentados. Em suma, o livro é uma fonte de conhecimento indispensável para quem busca aprimorar sua compreensão e ensino da linguagem de forma eficaz.

Resenha: O português da gente: a língua que estudamos, a língua que falamos, de Rodrigo llari e Renato Basso

Foto: Arte digital / Divulgação


APRESENTAÇÃO

O português do Brasil é falado por mais de 170 milhões de pessoas em um imenso território, mas muita gente teima em afirmar que ele não existe, ou, pior, não deveria existir. Ilari e Basso, seguindo uma tradição iniciada nos anos 20 por Mário de Andrade e Amadeu Amaral, oferecem-nos, em O português da gente, um estudo da língua que nós falamos e que pouco a pouco vai conquistando seus direitos. Este é um livro para ler, estudar e discutir, na sala de aula e fora dela.

RESENHA

ILARI, Rodolfo; BASSO, Renato. O português da gente: a língua que estudamos, a língua que falamos. São Paulo: Contexto, 2006. p. 151-196.

O livro 'o português da gente' aborda a língua portuguesa falada no Brasil, com o objetivo de apresentar informações sobre sua história, variedades e desmistificar preconceitos. Os autores enfatizam a importância de entender a variabilidade linguística como um fato natural. O conteúdo inclui exposições temáticas, encartes sobre variedades do português e uma cronologia de eventos relevantes para o desenvolvimento da língua no Brasil. O livro não busca impor respostas, mas sim propor boas perguntas para que os leitores possam aprofundar seu conhecimento sobre o assunto. É destinado a estudantes, professores e a todos que se interessam pela língua portuguesa.

O português foi implantado no Brasil pela colonização portuguesa, que começou com o descobrimento da terra por Pedro Álvares Cabral em 1500. As origens da língua remontam ao ano 1000, com a formação da nação portuguesa e o desenvolvimento de uma língua própria. A língua portuguesa deriva do latim vulgar, que foi uma variedade falada do latim romano durante o Império Romano. Os movimentos de Reconquista na Península Ibérica também tiveram influência na diferenciação do português e na expansão da língua para o Brasil. A convivência entre árabes e cristãos também influenciou a língua, resultando em palavras de origem árabe presentes no português. Ao longo dos séculos, a língua portuguesa se desenvolveu e se diferenciou em relação às outras línguas românicas, mantendo sua identidade e riqueza linguística.


Foto: Arte digital / Divulgação



O português chegou ao Brasil no século XVI e se expandiu ao longo dos séculos através da ocupação territorial, incorporando novas regiões ao país. A formação do território nacional foi marcada por ciclos econômicos e movimentos de exploração e colonização. A expansão territorial do português resultou na formação do maior país de língua portuguesa em extensão territorial e número de falantes. O processo de ocupação foi feito por um português marcado por influências de línguas indígenas e africanas, resultando na difusão de línguas como o nheengatu. As disputas territoriais na região sul do Brasil e mudanças de mãos de cidades e regiões resultaram em situações linguísticas complexas. O Tratado de Madri dividiu a região dos rios Uruguai e Prata entre Portugal e Espanha, culminando nas Guerras Guaraníticas. Na Amazônia, a aquisição do Acre foi marcada pela construção da ferrovia Madeira-Mamoré, envolvendo trabalhadores de diversas origens linguísticas.

O autor também discute algumas características do português brasileiro, destacando diferenças em relação ao português europeu. Aponta que o português do Brasil é considerado uma "língua mais antiga" do que o português europeu, através de análises filológicas. O texto também aborda a influência de diferentes pronúncias e construções sintáticas, além de características fonéticas e fonológicas específicas do português brasileiro. Também explora as flexões dos verbos e dos nomes na língua, apontando diferenciações em relação às demais línguas românicas e a presença de algumas irregularidades linguísticas.

O capítulo que mais me chamou atenção foi Português do Brasil: a variação que vemos e a variação que esquecemos de ver,  abordando a variação linguística do português do Brasil, destacando a existência de nacionalismo na afirmação da uniformidade da língua, mas ressaltando que a variação é um fenômeno normal. São apresentadas as variações diacrônica, diatópica e diastrática da língua, enfatizando que o português brasileiro não é uniforme. São citados exemplos de variação diatópica do português brasileiro, mostrando a influência das migrações internas no país. Há também a análise de anúncios do século XIX, evidenciando as mudanças linguísticas ao longo do tempo.

Já em Linguística do português e ensino,  aborda a relação entre a linguística do português e o ensino da língua materna, destacando a importância da estandardização e da fixação de uma norma para a estabilidade da língua. Fala-se também sobre a ortografia do português ao longo da história, destacando os processos de evolução e as reformas ortográficas. Além disso, são abordados o papel dos lexicógrafos na fixação da língua, a importância dos dicionários na normatização do vocabulário e a história da lexicologia do português, com destaque para autores brasileiros. É destacada a importância da ortografia, do dicionário e do registro civil das palavras na normalização da língua portuguesa.

Em síntese, o livro aborda a evolução do português, desde sua origem em Portugal até sua chegada ao Brasil, destacando a influência de diferentes povos na formação do português brasileiro. Discute também a coexistência de duas normas linguísticas, a culta e a substandard, e questiona a abordagem da escola em relação a essa última. Destaca a importância de compreender e valorizar a diversidade linguística, além de combater o preconceito linguístico e promover a inclusão social. O livro enfatiza a importância de amar, conhecer e estudar o português brasileiro, buscando compreender sua história e sua diversidade, em vez de simplesmente impor regras e correções. O livro "O Português da Gente" é uma obra extremamente relevante e esclarecedora sobre a língua portuguesa falada no Brasil. Os autores conseguem apresentar de forma clara e acessível informações sobre a história e as variedades linguísticas do português brasileiro, desmistificando preconceitos e enfatizando a importância de compreender a variabilidade linguística como algo natural. Além disso, o livro propõe boas perguntas aos leitores, estimulando o aprofundamento do conhecimento sobre o assunto. Destinado a estudantes, professores e a todos que se interessam pela língua portuguesa, a obra é fundamental para ampliar a compreensão da riqueza linguística do país. Em suma, "O Português da Gente" é uma leitura enriquecedora e esclarecedora, que contribui significativamente para a valorização e o entendimento do português brasileiro.

Resenha: TOXIC: Mulheres, fama e a misoginia dos anos 2000, de Sarah Ditum

Foto: Arte digital


APRESENTAÇÃO


Britney, Paris, Lindsay, Aaliyah, Janet, Amy, Kim, Chyna, Jennifer. Em Toxic: Mulheres, fama e a misoginia dos anos 2000 , a jornalista Sarah Ditum descreve como cada uma delas sofreu por ser uma celebridade em uma das épocas mais hostis para ser mulher.

Considerando o período entre 1998 e 2013, o livro de Ditum mostra como a cultura de celebridades considerava aceitável difamar mulheres, revirando a vida delas de cabeça para baixo, porque, afinal, ser “famosa” significava não ter privacidade. Tudo era assunto para os tabloides, desde a virgindade de Britney Spears, o divórcio e a fertilidade de Jennifer Aniston, as consequências do vício de Amy Winehouse, ao fatídico show de Janet Jackson no Super Bowl... O limite do que temos como tolerável hoje em dia era constantemente ultrapassado em todos os casos discutidos.

Com escrita afiada, Toxic destrincha a misoginia que estampava as manchetes e impulsionava vendas e cliques. Ainda adolescente na época retratada neste livro, a autora levanta a questão: tivemos conquistas nos últimos vinte anos, como leis contra crimes virtuais e uma forma mais empática de ver o outro, mas talvez, com a cultura de cancelamento, será que as coisas mudaram tanto assim?


RESENHA


Toxic narra os problemas de gênero na sociedade e a forma com a qual os crimes sexuais ou de violação de espaço no universo das celebridades femininas nos anos 2000 foram crescendo em uma escala acelerada e jamais vista antes, sobretudo, pelo advento dos celulares com câmeras digitais, onde, de certa forma, todos estavam com seu espaço privado inundado pela ausência de responsabilidade jurídica, retirando assim, a culpa da invasão de privacidade dos homens, que eram, em sua maioria, os grandes responsáveis pelos atos. Para ilustrar a raiz do problema, a autora narra um episódio ocorrido em 2006, quando uma jovem anônima teve a parte debaixo de sua saia fotografada sem sua permissão, o que levou a prisão do indivíduo, que foi, posteriormente inocentado sobe a desculpa de que 'a pessoa fotografada não estava em local com expectativa razoável de privacidade', em outras palavras,  a privacidade não lhe assegurada em ambientes públicos, uma vez, que, não se espera este direito em um ambiente público de livre circulação, onde, claro, estamos aptos a nos deparar e até mesmo presenciar situações constrangedoras como esta. A nota do júri foi replicada em outros casos, o que deixou as mulheres em uma situação desfavorável e complicada em relação à sua privacidade.


Ela ainda explica que, o site, Fleshbot, responsável por replicar fotos debaixo das saias de mulheres famosas sempre se postulavam como 'inocentes', uma vez, que, as mulheres famosas sempre mostram 'sem querer' suas partes famosas para os paparazzis é, justamente, de forma proposital, afinal, que jeito melhor de chamar a atenção da mídia para se manter no estrelato? Após o ocorrido, sites que divulgam fotos de mulheres seu seu consentimento as levando ao constrangimento, perseguições de paparazzis e apoio da rede jurídica, este problema se tornou cada vez mais avassalador, uma vez, que, tornou-se demasiadamente complicado evitar que situações como essas ocorressem, uma vez, que, o tempo, normalizaria tudo. Emma Watson, atriz da série de filmes Harry Potter, comenta ao Daily Mail que em seu aniversário de 18 anos, na época, fora inundado por fotógrafos que empenhavam-se cada vez mais em tirar fotos de si com o semblante de bêbada, sobretudo, debaixo de suas saias, alguns, até deitando no chão. Ela comenta como isso se tornou um problema que a fez duvidar de sua privacidade e se sentir extremamente violentada.


Ditum explora como a cobertura negativa dessas mulheres afetou não apenas elas, mas também as mulheres que as consumiam. Com o advento das redes sociais, as celebridades ganharam mais controle sobre suas narrativas, mas ainda enfrentam desafios em relação à privacidade.


A jornalista britânica Ditum começa seu ensaio analisando o início da carreira de Britney Spears, cujo álbum de estreia “…Baby One More Time” foi lançado em 1998. Segundo a autora, o sucesso da estrela pop era baseado em sua capacidade de combinar sensualidade e inocência, especialmente por ter sido uma ex-membro do Mickey Mouse Club que usava um anel de pureza. A questão da virgindade de Spears era constantemente discutida, culminando em uma entrevista polêmica com Diane Sawyer, na qual a cantora foi levada às lágrimas ao falar sobre sua vida sexual. Ditum destaca que o tema do sexo foi tratado de forma séria e sombria, fazendo com que Spears se sentisse pressionada a se desculpar publicamente.


A autora também destaca a diferença entre celebridades como Spears e Lindsay Lohan, que se tornaram famosas antes da era digital; Paris Hilton, que se tornou uma estrela durante essa revolução; e Kim Kardashian, que se destacou depois que smartphones e a pornografia na internet se popularizaram. No segundo ensaio, Ditum se concentra em Hilton, a herdeira que ganhou destaque como socialite em 1999. A autora retrata Hilton como uma jovem empreendedora e adaptável, que entendia que seu papel na mídia era representar um estilo de vida privilegiado.


Sobre Kardashian, Ditum comenta que sua busca pela fama ocorreu no final da década, o que lhe permitiu utilizar a internet a seu favor, ao invés de ser prejudicada por ela. A autora destaca a habilidade de Ditum em trazer novos insights sobre figuras conhecidas, além de sua capacidade de argumentar sobre a importância de ídolos e bodes expiatórios na sociedade, como no caso da comunidade negra em resposta ao abuso de R. Kelly.


O livro Toxic: Mulheres, fama e a misoginia dos anos 2000, de Sarah Ditum, é uma leitura extremamente relevante e necessária para entendermos como a cultura de celebridades tratava as mulheres durante essa época. A autora apresenta uma análise afiada e perspicaz sobre os problemas de gênero na sociedade e como isso afetava as celebridades femininas, como Britney Spears, Paris Hilton, e Kim Kardashian. Ditum expõe de forma corajosa e incisiva a misoginia que permeava a cobertura midiática dessas mulheres, mostrando como a invasão de privacidade, o julgamento público e a objetificação eram constantes em suas vidas. Além disso, ela destaca o impacto que essa cobertura negativa tinha não só sobre as celebridades em si, mas também sobre as mulheres que consumiam essa mídia.


Com uma escrita envolvente e argumentos bem fundamentados, Ditum nos faz refletir sobre como a cultura de celebridades mudou ao longo dos anos e se as conquistas em termos de leis e empatia realmente foram suficientes para proteger as mulheres no mundo do entretenimento. Toxic é uma obra que nos faz questionar o papel da mídia e da sociedade na forma como tratamos as mulheres famosas e nos faz repensar nossos próprios preconceitos e julgamentos.

© all rights reserved
made with by templateszoo