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Resenha: Se a rua beale falasse, de James Baldwin

Foto: Arte digital


APRESENTAÇÃO

Lançado em 1974, o quinto romance de James Baldwin narra os esforços de Tish para provar a inocência de Fonny, seu noivo, preso injustamente. Livro que inspirou o filme homônimo dirigido por Barry Jenkins, vencedor do Oscar por Moonlight.Tish tem dezenove anos quando descobre que está grávida de Fonny, de 22. A sólida história de amor dos dois é interrompida bruscamente quando o rapaz é acusado de ter estuprado uma porto-riquenha, embora não haja nenhuma prova que o incrimine. Convicta da honestidade do noivo, Tish mobiliza sua família e advogados na tentativa de libertá-lo da prisão.Se a rua Beale falasse é um romance comovente que tem o Harlem da década de 1970 como pano de fundo. Ao revelar as incertezas do futuro, a trama joga luz sobre o desespero, a tristeza e a esperança trazidos a reboque de uma sentença anunciada em um país onde a discriminação racial está profundamente arraigada no cotidiano. Esta edição tem tradução de Jorio Dauster e inclui posfácio de Márcio Macedo.

RESENHA


Em meio ao caos de nossa era, muitos escritores se veem em um dilema: tornar-se um porta-voz de causas ou refugiar-se na estética pura. No entanto, é justamente essa turbulência que oferece um terreno fértil para a criatividade literária, com uma diversidade de estilos e perspectivas à disposição do autor comprometido. Aqueles que buscam uma única métrica para avaliar a literatura podem não perceber que a uniformidade estética leva a uma expressão literária monótona e desinteressante.


James Baldwin, um escritor cuja trajetória nunca foi linear, enfrentou tanto aclamação quanto crítica, muitas vezes por razões equivocadas. Como escritor negro, ele navegou entre a condescendência e a pressão para representar uma experiência coletiva, quando, na verdade, cada voz é um símbolo único. Em alguns espaços, sua obra é louvada sem ser verdadeiramente lida, o que pode ser considerado um destino cruel para um escritor. E há aqueles que nunca aceitarão sua voz, independentemente de sua intenção de representatividade.


“Se a rua beale falasse”, o décimo terceiro livro de Baldwin, retrata uma comunidade negra em Nova York, lutando contra as adversidades sem o apoio dos movimentos radicais da época. Apesar de parecer um retrato de uma era passada, a narrativa ressoa com atualidade, destacando os laços emocionais que unem seus personagens. O romance celebra o amor em suas várias formas, incluindo o amor familiar que demanda sacrifícios.


Narrado por Tish, uma jovem de 19 anos, “Se a Rua Beale Falasse” é uma obra multifacetada, construída com economia e poesia. A história de Fonny, um escultor negro injustamente acusado, e sua luta pela justiça, é uma alegoria da incerteza dos destinos humanos. A gravidez de Tish simboliza a esperança e a determinação pela liberdade. No final, Fonny é libertado sob fiança, e o romance conclui com uma reflexão sobre a natureza provisória de nossas vidas, um testemunho silencioso e poderoso da experiência humana compartilhada.


James Baldwin, ao escolher Tish como narradora de sua complexa tapeçaria de personagens, fez uma aposta audaciosa que pagou com uma autenticidade surpreendente. Através de Tish, conhecemos uma alma jovem que nos guia por reflexões íntimas sobre amor, preconceito e a experiência da gravidez. Baldwin não romantiza essas emoções; ele as apresenta como alicerces psicológicos que podem determinar a sobrevivência ou a ruína de um indivíduo. Fonny, protegido pelo amor inabalável de Tish e pela luta incansável de sua família, escapa da desolação mental que aflige muitos encarcerados injustamente. No entanto, o pai de Tish, incapaz de suportar a pressão, encontra um fim trágico.


O romance se desenrola com uma tensão que é mais psicológica do que física, retratando seus personagens como seres humanos complexos, não apenas vítimas de uma divisão racial. Baldwin humaniza todos os envolvidos, incluindo figuras brancas simpáticas, como o advogado de Fonny, e até mesmo a mulher que o acusou, revelando camadas de desespero e desamparo que transcendem a cor da pele. A injustiça enfrentada por Fonny é um reflexo de uma verdade maior para Baldwin: a opressão é uma arma psicológica devastadora, e a dignidade humana é frequentemente o preço pago. O romance, contudo, termina com uma nota de esperança, destacando a importância dos laços familiares e comunitários em tempos de adversidade. À medida que a sociedade se fragmenta, esses laços se tornam o refúgio final e a fonte de força para enfrentar o futuro incerto.


“Se a Rua Beale Falasse” ressoa com a essência da experiência humana, uma narrativa que transcende o tempo com sua autenticidade e profundidade emocional. A história, enraizada na realidade, dispensa artifícios estéticos e modismos exagerados, destacando-se como uma obra de arte atemporal que toca o coração com sua verdade crua e sua representação vívida da humanidade.

Resenha: A sociedade da neve, de Pablo Vierci

Foto: Arte digital


APRESENTAÇÃO

Em outubro de 1972, um avião fretado da Força Aérea do Uruguai que rumava para o Chile se choca contra uma montanha nos Andes. Das 45 pessoas a bordo - a maioria fazia parte de um time de rúgbi amador -, 29 sobrevivem ao impacto, mas apenas dezesseis serão resgatadas, depois de improváveis 72 dias.
Durante esse longuíssimo período, os sobreviventes ficam cercados por rocha e gelo, sem roupas apropriadas, sob temperaturas de até trinta graus negativos, abrigados no que restara da fuselagem depois da colisão. Famintos, lançam mão de um recurso extremo: alimentar-se dos corpos dos amigos mortos.
Dez dias depois do acidente, a primeira notícia que ouvem do mundo exterior por um radinho recém-consertado é que as buscas pelo avião foram abandonadas. Como se não bastasse, uma avalanche soterra a fuselagem partida. Os que conseguem sobreviver ficam enterrados vivos durante três dias. Sem outra alternativa, decidem sair de lá por si mesmos. Mas para isso será preciso escalar o paredão de gelo que os separa de um horizonte desconhecido - que pode ser a salvação ou a desesperança final.

RESENHA

Nas páginas deste relato, as vozes dos dezesseis resilientes ecoam, narrando a odisséia vivida após o desastre nos Andes em 1972. Jovens na flor da idade, enfrentaram o frio cortante e a ausência de recursos básicos em uma altitude que desafia a própria vida. Cada sobrevivente compartilha sua perspectiva única sobre os setenta e dois dias de provações, a luta pela sobrevivência, o confronto com a morte e o impacto duradouro dessa experiência em suas existências.


Este livro transcende a simples cronologia dos fatos, oferecendo um mergulho profundo nas transformações indeléveis que marcaram essas dezesseis almas e as memórias eternizadas na montanha e nos corações dos que ficaram.


Pablo Vierci, mais do que um autor, é um testemunho vivo, um ex-colega dos sobreviventes que, um ano após a tragédia, iniciou a jornada de registrar essa história. A precisão com que reconstitui os eventos, desde os momentos que antecederam o acidente até as consequências que se seguiram, reflete uma conexão íntima com a narrativa e seus protagonistas. O epílogo não é apenas um fechamento, mas um testamento pessoal do significado dessa obra para ele. Os relatos são pontuados por reflexões profundas sobre a honestidade brutal que a situação impôs, a recusa em mascarar a verdade mesmo após o resgate e a angústia da possibilidade de ser o último a perecer, privado do consolo dos companheiros nos momentos finais. Essas são as histórias de sobrevivência, verdade e humanidade entrelaçadas no tecido da história.


Em meio ao branco imaculado e ao silêncio dos Andes, um grupo de jovens forjou uma comunidade resiliente, a “Sociedade da neve”, para enfrentar o inimaginável. Sua saga, agora eternizada na tela, é um testemunho da tenacidade humana e um espelho fiel das emoções e provações vividas por seus membros. “A Sociedade da neve” não é apenas um relato; é uma jornada visceral através dos olhos daqueles que a viveram. É uma celebração da vida, uma homenagem aos que persistiram e aos que se foram, um hino à coragem e à esperança que toca a alma. Este livro é uma recomendação incontestável, uma narrativa que transcende a ficção pela sua crua realidade.


Pablo Vierci, um observador atento e ex-colega dos sobreviventes, nos guia por esta história desde o seu início em 1973. Com uma reconstrução meticulosa dos eventos, desde a tragédia inicial até a luta pela sobrevivência e o impacto duradouro nas vidas dos envolvidos, Vierci nos aproxima de uma verdade que vai além dos fatos, transformando o acidente em um mosaico de experiências humanas.


Este livro é o fruto de uma história que amadureceu com o tempo, ensinando-nos que, mesmo diante da adversidade extrema, é possível forjar uma sociedade regida pela compaixão e pela capacidade de superar o impossível. O desastre nos Andes partiu a existência desses jovens, mas suas histórias se tornaram um marco na vida dos leitores. “A Sociedade da neve” reúne os dezesseis sobreviventes, permitindo que suas vozes ressoem através do tempo e deixem um legado indelével na história.

Resenha: Doze anos de escravidão, de Solomon Northup

Foto: Arte digital

APRESENTAÇÃO

Considerada a melhor narrativa já escrita sobre um dos períodos mais nebulosos da história americana, Doze anos de escravidão narra a história real de Solomon Northup, um negro livre que, atraído por uma proposta de emprego, abandona a segurança do Norte e acaba sendo sequestrado e vendido como escravo. Depois de liberto, Northup publicou o relato contundente de sua história, que se tornou um best-seller imediato. Hoje, 160 anos após a primeira edição, Doze anos de escravidão é reconhecido como uma narrativa de qualidades excepcionais. Para a crítica, o caráter especial do livro deve-se ao fato de o autor ter sido um homem culto que viveu duas vidas opostas, primeiro como cidadão livre e depois como escravo. “O livro nos encantou: a dimensão épica, o detalhamento, a aventura, o horror, a humanidade. Lia-se como um roteiro de cinema, pronto para ser filmado. Eu não podia acreditar que nunca ouvira falar nele. Pareceu-me tão importante quanto O diário de Anne Frank, só que publicado quase cem anos antes.” - Steve McQueen, diretor do filme 12 anos de escravidão “O primeiro filme que torna impossível continuar vendendo mentiras e mistificações sobre a escravidão.” - The New York Times. O livro pode levar sobrecapa relacionando o livro ao filme.

RESENHA

O livro, doze anos de escravidão, é a narrativa de Solomon Northup, um homem que, embora nascido livre, foi capturado e subjugado à vida de um escravo. Originário do condado de Saratoga, em Nova York, Solomon era um homem de família, casado com Anne e pai de três filhos. Sua liberdade foi abruptamente roubada por dois homens, Brown e Hamilton, que o sequestraram e o venderam como escravo em Washington. Durante doze longos anos, Solomon foi propriedade de vários senhores, entre eles Edwin Epps, um homem cruel e desumano, conhecido por sua brutalidade e por tirar prazer em castigar seus escravos até a morte. Solomon descreveu as cicatrizes em suas costas como testemunhas silenciosas do seu clamor por liberdade. Mais do que sua liberdade, foi-lhe roubada a identidade e tudo aquilo que ele representava. Qualquer tentativa de revelar sua verdadeira história resultava em punições severas. Seu nome foi mudado para Platt, e ele foi forçado a aceitar um destino cruel em terras desconhecidas, mantendo sua verdadeira identidade em segredo para sobreviver.


Solomon sabia que qualquer menção à sua liberdade anterior poderia resultar em sua morte. Assim, ele suportou o trabalho árduo e os castigos físicos como qualquer outro escravo. Embora todos os escravos temessem seus senhores, Solomon enfrentou-os em várias ocasiões, arriscando sua vida inúmeras vezes. No entanto, ele nunca perdeu a esperança de reconquistar sua liberdade e retornar ao seio de sua família. Ele elaborou planos de fuga e buscou se comunicar com amigos e familiares, mas foi traído, e a cada dia que passava, sua esperança diminuía.


A virada em sua sorte veio com a chegada de um indivíduo que se comprometeu a ajudá-lo, fazendo contato com a família de Solomon para organizar seu resgate. Em janeiro de 1853, Solomon Northup finalmente reconquistou sua liberdade e, no mesmo ano, compartilhou sua história através de um livro, que se tornou uma das mais importantes obras sobre a escravidão. O relato oferece uma perspectiva crítica sobre a prática da escravidão, o sistema judiciário de diferentes estados e as punições cruéis impostas aos negros. Solomon também reflete sobre o tratamento dispensado aos outros escravos, cujos sofrimentos ele testemunhou durante os doze anos de escravidão.


“12 Anos de escravidão” é uma obra-prima da literatura de não-ficção, onde Solomon Northup compartilha sua experiência angustiante com uma autenticidade que rivaliza com a ficção clássica. Sua narrativa detalha o período em que, apesar de ser um homem livre de Nova York, foi forçadamente submetido à escravidão. A história de Northup é única e ele a relata com uma clareza impressionante. Suas palavras fluem com a suavidade da seda, e sua franqueza ressoa com sinceridade. Ele inicia seu relato com uma premissa clara: “Minha exposição sobre a escravidão se limita ao que presenciei pessoalmente”, estabelecendo um compromisso com a verdade que permeia toda a obra.


“12 Anos de escravidão” é um documento histórico inestimável. Northup descreve a escravidão de maneira que transcende a simples discussão. Ele enfatiza a palavra “Escravidão” com um ‘E’ maiúsculo, sinalizando o profundo impacto que esses eventos tiveram em sua vida. Separado de sua família por uma dúzia de anos, ele viveu na incerteza de não saber se cada novo dia poderia ser o seu último. Contudo, o que mais cativa em Northup é sua recusa em atribuir a culpa aos proprietários de escravos por suas ações. Sua fé inabalável é evidente em suas palavras: “A crueldade do proprietário de escravos não é uma falha pessoal, mas sim uma consequência do sistema em que está inserido”. Essa perspectiva é surpreendente, considerando tudo o que ele testemunhou.


Northup destaca a figura de William Ford, um proprietário de escravos que o tratou com dignidade. Ele não o vê como um dos vilões de sua história, o que demonstra sua capacidade de discernimento. Curiosamente, Northup consegue superar seus opressores através de sua eloquência. Em um confronto verbal com um deles, ele é desafiado: “Maldito seja, pensei que você tivesse algum conhecimento”. A habilidade de Northup em detectar a gramática falha é patente em sua escrita impecável.


Um dos momentos mais marcantes da obra é quando Solomon Northup se dá conta de sua captura. Sua descrição é arrebatadora, expressando incredulidade diante da injustiça: “Como poderia um cidadão livre de Nova Iorque, que jamais transgrediu a lei ou causou mal a alguém, ser submetido a tamanha desumanidade?” Essa reflexão revela uma triste ironia da vida: frequentemente, as adversidades recaem sobre os inocentes. A autodescrição de Solomon infunde emoção profunda na narrativa, permitindo-nos conhecer intimamente quem ele é: um homem livre, um amante do violino, um nova-iorquino que não merecia o sofrimento imposto a ele. O capítulo se encerra com Solomon em lágrimas, adicionando uma camada de emoção à sua vulnerabilidade já palpável. Solomon Northup não se omite, ele não teme expressar suas emoções ou falar sua verdade. É essa honestidade que confere a “12 Anos de Escravidão” sua força e veracidade.


A escravidão, para muitos, pode ser simplificada como a condição de ser mantido como escravo. No entanto, para Solomon Northup, essa definição é insuficiente. Após ler “12 Anos de Escravidão”, essa visão superficial também se torna inadequada para nós. Para ele, escravidão significa ser testemunha diária do sofrimento humano: ouvir os gritos lancinantes, ver o corpo se contorcer sob o açoite cruel, ser dilacerado por cães, morrer sem cuidados e ser enterrado sem cerimônia. É difícil imaginar testemunhar tais horrores ou suportar o que Solomon enfrentou. Seus relatos mostram que a escravidão o forçou a agir de maneiras que jamais consideraria em circunstâncias normais. Devido à sua inteligência, Solomon era constantemente provocado por seus senhores. Em um confronto, ele descreve um deles com “olhos serpentinos que destilavam veneno”, evocando a imagem de uma serpente ou entidade demoníaca. A habilidade de Solomon em tecer tais imagens em sua história sobre a escravidão é notável, e é evidente seu desprezo pelas figuras que menciona, sem receio de retratá-las negativamente.


“12 Anos de Escravidão” é uma obra que transcende o gênero da não-ficção, oferecendo um relato visceral e profundamente humano da experiência de Solomon Northup. A narrativa de Northup é uma jornada de resistência e resiliência, contada com uma honestidade que corta a alma. O livro não é apenas um testemunho da crueldade da escravidão, mas também um retrato da força do espírito humano diante da adversidade. A habilidade de Northup em descrever sua experiência, mantendo-se fiel aos fatos sem perder a sensibilidade literária, é notável. Ele não apenas relata os eventos, mas os infunde com uma emoção crua que permite ao leitor sentir a profundidade de seu sofrimento e a intensidade de sua esperança. O compromisso de Northup com a verdade é inabalável, e sua narrativa é um lembrete poderoso de que a história é composta por vozes individuais, cada uma com sua própria história para contar.

O que torna “12 Anos de Escravidão” particularmente impactante é a perspectiva de Northup sobre o sistema de escravidão. Ele não se limita a condenar os indivíduos, mas sim o sistema que permite tais atrocidades. Sua capacidade de ver além da maldade individual e reconhecer a falha sistêmica é uma lição de empatia e compreensão.


A obra é um documento histórico essencial que ilumina não apenas o passado, mas também o presente, desafiando-nos a refletir sobre as injustiças que persistem em nossa sociedade. “12 Anos de Escravidão” é, sem dúvida, uma leitura obrigatória para todos aqueles que buscam compreender a complexidade da experiência humana e a importância da luta pela dignidade e pelos direitos humanos.

Resenha: The Help (A resposta), por Kathryn Stockett

Foto: Arte digital

APRESENTAÇÃO

Aibileen é uma empregada negra de Jackson, Mississippi, em 1962, que sempre atendeu ordens em silêncio, mas ultimamente não consegue conter sua amargura. Sua amiga Minny nunca segurou a língua, mas agora precisa de alguma forma manter segredos sobre seu empregador que a deixam sem palavras. A socialite branca Skeeter acabou de se formar na faculdade. Ela é cheia de ambição, mas sem marido é considerada um fracasso. Juntas, essas mulheres aparentemente diferentes se unem para escrever um livro que conta tudo sobre o trabalho como empregada negra no Sul, que pode alterar para sempre seus destinos e a vida de uma pequena cidade.

RESENHA


Ambientado em 1962, em meio ao Movimento dos Direitos Civis em Jackson, Mississippi, “The Help” entrelaça as vozes de três mulheres distintas. Skeeter, uma aspirante a escritora branca, busca sua voz em uma sociedade que a cerca. Aibileen, uma empregada doméstica, e Minny, sua franca colega, são as narradoras afro-americanas que revelam uma realidade muitas vezes ignorada. O romance desafia a percepção de que as vidas das mulheres negras e brancas são desconhecidas entre si, mostrando que, na verdade, há uma profunda consciência compartilhada, uma sabedoria transmitida de mãe para filha.


O livro apresenta uma divisão racial clara entre seus personagens, com a linguagem servindo como um marcador da diferença. No Mississippi retratado por Stockett, somente os personagens negros falam um inglês vernacular, simbolizando a segregação linguística. A representação física dos personagens negros também é significativa, muitas vezes descritos de maneira estereotipada, enquanto os homens negros são marginalizados, exceto por Leroy, o marido de Minny, que se destaca na narrativa.


A trama central do livro gira em torno da iniciativa de Hilly Holbrook, que sugere banheiros segregados para as empregadas domésticas, refletindo as tensões raciais da época. A ironia é palpável, pois as mesmas mulheres negras são convidadas a entrar nas casas brancas para realizar tarefas íntimas. As vidas das mulheres da cidade, negras e brancas, são intrinsecamente conectadas, e o romance explora os limites sociais da época e as consequências de transgredi-los. Stockett, ao escrever, parte de suas próprias memórias de infância e da relação próxima com a empregada de sua família, conferindo ao livro um toque de autobiografia.

A narrativa desdobra a relação entre Skeeter Phelan, uma jovem branca, e as empregadas afro-americanas de sua cidade. Retornando à sua cidade após a universidade, Skeeter busca reencontrar Constantine, a empregada que marcou sua infância com momentos memoráveis. Como colunista, Skeeter aborda a vida das empregadas domésticas, o que a aproxima de Aibileen, Minny e outras mulheres afro-americanas que servem às famílias locais. Aibileen, dedicada babá na residência dos Leefolts, nutre um vínculo especial com a pequena Mae Mobley, que a adora. Skeeter, amiga da mãe de Mae Mobley, e Minny, que enfrenta o preconceito ao recusar-se a usar instalações segregadas, são figuras centrais na trama.


Hilly Holbrook, figura proeminente e velha conhecida de Skeeter, personifica a resistência ao progresso racial em Mississippi. Líder da Liga Júnior, Hilly propõe um projeto segregacionista de banheiros para as empregadas, ideia que Skeeter rejeita veementemente. Em busca de mudança, Skeeter se alia secretamente a Aibileen, desencadeando uma série de eventos que culminam na publicação de um projeto que desafia as normas sociais de Jackson.


O lançamento do livro e sua adaptação cinematográfica por Tate Taylor geraram debates acalorados. “The Help” permaneceu por 100 semanas na lista de best-sellers do New York Times e o filme se destacou como uma das produções mais marcantes de 2011. Ambos evocam e questionam representações culturais passadas, dando voz às experiências das mulheres afro-americanas. A obra e sua adaptação enfrentaram críticas por focarem na era dos Direitos Civis sob a perspectiva de uma escritora branca narrando as histórias de empregadas afro-americanas, um enfoque considerado por alguns como estereotipado e limitador.


A narrativa desvenda a realidade e os desafios cotidianos vividos por mulheres afrodescendentes. Predominantemente empregadas no setor doméstico, essas mulheres se dedicavam intensamente ao trabalho, muitas vezes sem o devido reconhecimento ou dignidade. A relevância do romance se mantém atual, refletindo a persistência do racismo na sociedade contemporânea. Através dos olhos das personagens femininas negras, o leitor é convidado a compreender uma perspectiva distinta, frequentemente invisibilizada. Composto por trinta e quatro capítulos, o livro reserva a narração de todos, exceto o vigésimo quinto, às vozes de Aibileen, Minny e Miss Skeeter. “The Help” traz à tona a história de uma jovem branca e educada que se propõe a amplificar as vozes de um grupo de empregadas negras em meio ao movimento pelos Direitos Civis em Jackson. A obra de Stockett tem sido objeto de debate, com críticos apontando que, apesar das boas intenções, há um equívoco histórico na representação dos negros, perpetuando estereótipos e mal-entendidos raciais. Tal prática literária, ao adotar perspectivas brancas para retratar personagens negras, acaba por reforçar constrangimentos e distorções sobre a identidade negra.

“The Help” é uma obra que captura a essência de uma época marcada por intensas lutas sociais e raciais, oferecendo uma perspectiva íntima e reveladora sobre as vidas das empregadas negras no Sul dos Estados Unidos. A habilidade da autora em tecer uma narrativa que entrelaça as histórias de Aibileen, Minny e Skeeter é notável, criando um mosaico de experiências que ressoa com autenticidade e profundidade emocional. Aibileen e Minny, com suas vozes distintas e poderosas, trazem à tona as realidades muitas vezes silenciadas das mulheres negras que serviram em lares brancos, enfrentando não apenas o racismo, mas também a desvalorização de seu trabalho e humanidade. Skeeter, por outro lado, representa uma ponte entre dois mundos, desafiando as normas sociais e buscando justiça para aquelas cujas histórias foram ignoradas.


O romance é um testemunho da coragem e da resiliência dessas mulheres, que, apesar das adversidades, encontram força na solidariedade e na esperança de um futuro mais justo. A narrativa não apenas destaca as injustiças da época, mas também celebra o espírito indomável das personagens, que se recusam a ser definidas pelas circunstâncias. Além disso, a obra de Stockett é um lembrete poderoso de que as questões de raça e classe ainda são pertinentes na sociedade contemporânea. Ao dar voz às empregadas negras, “The Help” desafia os leitores a refletir sobre o passado e a considerar o impacto duradouro das estruturas de poder e preconceito.


Em suma, “The Help” é uma contribuição valiosa para a literatura, oferecendo uma perspectiva necessária e enriquecedora que amplia nossa compreensão sobre a complexidade das relações humanas em meio a um período turbulento da história americana. É uma leitura essencial para aqueles que buscam entender melhor as dinâmicas raciais e sociais que moldaram e continuam a influenciar a sociedade.

Resenha: Nada de novo no front, de Erich Maria Remarque

Foto: Arte digital

APRESENTAÇÃO

Resenha: O cogumelo venenoso, de Ernst Hiemer (livro antissemita, a leitura requer cuidado)

Crianças alemãs leem um livro de propaganda antissemita intitulado 'Dear Gifpilz', 'o cogumelo venenoso' / Foto: Enciclopédia do Holocausto / reprodução


Caro leitor, gostaríamos de informar que a publicação que você está prestes a ler uma análise extensa sobre o livro, 'O Cogumelo Venenoso' de Ernst Hiemer, contém conteúdo sensível e polêmico. É importante ressaltar que o não apoiamos à publicação deste livro, nem endossamos ao seu conteúdo, pensamento ou momento político retratado na obra. Nosso objetivo ao disponibilizar uma análise  profunda de seus conteúdos e promover a reflexão e o debate sobre temas controversos, respeitando a liberdade de expressão e o direito à informação. Pedimos que mantenha uma postura crítica e respeitosa ao se envolver com o conteúdo apresentado. Obrigado pela compreensão.


O cogumelo venenoso é  um livro infantil de dezessete capítulos publicado por Julius Streicher em 1938, escrito por Ernst Ludwig Hiemer e ilustrado pelo cartunista/caricaturista alemão Fips (pseudônimo de Philipp Rupprecht). Foi um dos livros de texto adotados nas escolas alemãs como propaganda antissemita que resultou no holocausto judeu.

O livro "O cogumelo venenoso" de Ernst Hiemer é uma obra controversa que causou polêmica desde o seu lançamento. Com uma abordagem impactante, a obra aborda temas delicados como o antissemitismo e a propaganda nazista. Nesta matéria, iremos explorar a história por trás do livro, suas repercussões e o debate em torno da liberdade de expressão e da disseminação de ideologias intolerantes. "O Cogumelo Venenoso" foi lançado em 1938, durante o regime nazista na Alemanha. O autor, Ernst Hiemer, era um membro proeminente do partido nazista e usou o livro como uma forma de disseminar a propaganda antissemita do regime.


Confira uma breve exposição dos conteúdos dos capítulos da obra:


O cogumelo venenoso

Uma mãe ensina o seu filho, Franz, sobre os cogumelos venenosos na floresta, comparando-os às pessoas ruins na sociedade. Ela associa os judeus a esses cogumelos venenosos, explicando que eles são perigosos e devem ser evitados. Franz acredita nisso e entende que os judeus são perigosos como os cogumelos venenosos. A mãe destaca a importância de alertar as pessoas sobre os judeus e ensinar as crianças a reconhecê-los. O autor conclui que os jovens alemães devem estar cientes da Questão Judaica e que os judeus são vistos como demônios pela sociedade.

Como reconhecer um judeu?

Na aula do Sr. Birkmann, os alunos da 7a série estão aprendendo sobre os judeus e como reconhecê-los. Eles discutem características físicas como nariz torto, lábios grossos, olhos penetrantes e orelhas grandes, além de comportamentos como movimentos instáveis ​​e voz nasal. O professor encoraja os alunos a prestarem atenção e ficarem atentos para não serem enganados pelos judeus, levando-os a recitar um verso anti-semita. A atitude do professor e dos alunos na aula é preocupante e mostra a disseminação do preconceito e anti-semitismo.

Como os judeus vieram a nós?

A estória se passa em uma pequena cidade alemã, onde dois estudantes observam e fazem comentários preconceituosos sobre três "judeus do oriente". Eles descrevem de forma pejorativa as características físicas e comportamentais dos judeus e como eles se adaptam em diferentes países para não serem reconhecidos como tal. Os estudantes enfatizam a ideia de que, apesar das mudanças de aparência e comportamento, os judeus sempre serão reconhecidos como tal. Eles encerram com um poema que reforça a ideia de que, uma vez judeu, sempre judeu.

O que é o Talmud?

O texto descreve um diálogo entre um jovem judeu, Solly, e um rabino sobre os ensinamentos do Talmud, livro sagrado dos judeus. O Talmud ensina que apenas os judeus são considerados humanos, enquanto os não-judeus são vistos como gado. Solly é instruído pelo rabino sobre como os judeus devem agir em relação aos não-judeus, incluindo a permissão de enganá-los, roubar deles e até mesmo mentir sob juramento. O rabino enfatiza a importância de seguir as leis do Talmud, que são consideradas mais importantes do que as do Antigo Testamento, e o alerta que quem as quebrar merece a morte. O texto destaca algumas passagens do Talmud que justificam a conduta dos judeus em relação aos não-judeus, enfatizando a supremacia dos judeus e a permissão para agir de forma desonesta com os não-judeus.

Por que os judeus se permitem serem batizados?

Essa história mostra um casal judeu que foi batizado, mas as meninas loiras comentam que o batismo não faz deles não-judeus. Elas citam que assim como um negro não pode se tornar alemão pelo batismo, um judeu não deixa de ser judeu. Elas criticam o clero por permitir que judeus sejam batizados, acreditando que eles querem destruir a Igreja Cristã. A história conclui com um ditado que enfatiza que um judeu sempre será judeu, mesmo que seja batizado.

Como um camponês alemão foi expulso de sua casa e fazenda

Um fazendeiro alemão perde sua casa e fazenda para um financeiro judeu, que arruinou sua vida. O filho do fazendeiro promete nunca permitir que um judeu entre em sua casa quando tiver sua própria fazenda, pois acredita que os judeus são traiçoeiros. O pai concorda, acreditando que os judeus sempre irão nos trapacear e nos tomar nossas posses. O filho lembra do que aprendeu na escola sobre os judeus serem uma praga e sedentos por sangue, e promete expulsá-los se aparecerem em sua propriedade.

Como os negociantes judeus enganam

O texto narra a história de um vendedor ambulante judeu que tenta vender roupas ruins para uma jovem camponesa alemã durante uma noite festiva no vilarejo. O vendedor elogia a camponesa e tenta convencê-la a comprar seus produtos, mas ela não se deixa enganar, conhecendo a reputação dos judeus. O vendedor sai xingando, mas consola-se ao saber que pode enganar facilmente outros camponeses. No final, a história alerta sobre a desonestidade dos vendedores ambulantes judeus e a importância de comprar apenas de alemães.

A experiência de Hans e eles com um homem estranho

Um judeu tenta atrair as crianças com doces para sua casa, mas o menino Hans desconfia e acaba salvando sua irmã ao chamar a polícia. Sua coragem é elogiada e ele é recompensado com um pedaço de bolo de chocolate. A mãe ensina um ditado sobre o perigo dos estranhos e a importância de se manter seguro.

A visita de Inge a um médico judeu

Inge está doente e reluta em ir ao médico, pois sua líder da DBM afirma que médicos judeus são ruins e querem destruir o povo alemão. Sua mãe a obriga a ir ao médico judeu, Dr. Bernstein, e Inge tem uma experiência assustadora, onde se sente ameaçada pelo médico. Ela consegue escapar e ao contar sua experiência para a mãe, esta se arrepende de tê-la mandado ao médico judeu. Inge e sua mãe refletem sobre a situação e Inge mostra que é importante questionar e pensar por si mesma, mesmo que vá contra as crenças propagadas pela DBM. A história mostra a importância de não acreditar em estereótipos e preconceitos, e de pensar criticamente sobre as informações que recebemos.

Como o judeu trata os seus empregados

Rosa, uma jovem de 23 anos, arrumou um emprego em uma agência de empregos judaica em Viena e foi enviada para trabalhar em uma casa de judeus na Inglaterra. Ela relata em uma carta a seus pais sobre as condições desumanas em que foi tratada, sendo resgatada por uma mulher alemã e retornando para casa. No final da carta, Rosa expressa seu ódio aos judeus, baseado no preconceito e nos maus tratos que sofreu durante sua experiência.

Como 2 mulheres foram enganadas por advogados judeus

Duas mulheres alemãs são enganadas por advogados judeus que cobram taxas de ambas, mesmo representando acusadora e ré em um caso. Após serem condenadas juntas, as mulheres percebem que foram enganadas e decidem fazer as pazes, concordando em nunca mais recorrer a advogados judeus. A história destaca a falta de justiça e empatia dos advogados judeus, que visam apenas o lucro.

Como os judeus torturam os animais

Neste texto, é mostrada uma cena em que dois garotos assistem judeus abatendo um boi em um matadouro judaico. Os meninos presenciam a brutalidade e a alegria dos judeus durante o processo, o que os leva a concluírem que os judeus são as piores pessoas do mundo. Eles discutem sobre as acusações de assassinatos rituais cometidos pelos judeus e afirmam que eles são cruéis tanto com os animais quanto com os seres humanos. A narrativa reforça estereótipos antissemitas e propaga a ideia de que os judeus são malignos e precisam ser eliminados.

O que Cristo disse sobre os judeus?

A mãe camponesa ensina aos seus filhos que a cruz lembra o terrível assassinato dos judeus no Gólgota. Ela fala sobre como os judeus são descendentes do Demônio e cometem crimes, e que Jesus foi morto pelos judeus por falar a verdade sobre eles. Ela instrui as crianças a lembrarem-se disso sempre que virem uma cruz.

O dinheiro é o deus dos judeus

O texto fala sobre a visão de uma mãe para sua filha sobre a relação dos judeus com o dinheiro. A mãe explica que, para os judeus, o dinheiro é como um deus e que eles estão dispostos a cometer crimes para consegui-lo. Ela também afirma que os judeus não têm piedade e se dedicam exclusivamente a acumular riquezas, mesmo que isso signifique explorar e destruir outras pessoas. A mãe descreve os judeus como demônios que buscam dominar o mundo através do dinheiro. Liselotte tenta entender esses conceitos, enquanto a mãe reforça a ideia de que o dinheiro é o principal objetivo dos judeus, que farão qualquer coisa para alcançá-lo.

Como Hartmann se tornou um Nacional Socialista?

Um trabalhador alemão se junta aos Nacional-Socialistas de Hitler após se decepcionar com os líderes judeus do Partido Comunista. Ele decide se afastar dos judeus e abraçar o movimento de Hitler, alegando que os judeus são responsáveis pela ruína da Alemanha. A história destaca a importância da lealdade à pátria e a influência do discurso nacionalista e antissemita no contexto político da Alemanha pré-Segunda Guerra Mundial.

Existem judeus decentes?

O texto narra uma conversa em um restaurante entre quatro homens alemães, incluindo um judeu chamado Salomon. Salomon defende a dignidade dos judeus e se sente frustrado com os comentários negativos dos outros sobre sua religião. No final, um dos homens revela que Salomon havia mentido sobre sua participação na guerra e em outras ações nobres, o que leva Salomon a sair correndo envergonhado. A história destaca a importância de ser honesto e mostra que nem todos os judeus são honestos e dignos, assim como nem todos os não judeus são desonestos.

Sem resolver a Questão Judaica não há salvação para a humanidade...

O texto fala sobre a influência de Julius Streicher na Juventude Hitlerista, que admirava sua fala contra os judeus. Streicher era conhecido por sua retórica antissemita e era temido pelos judeus, o que o tornava popular entre seus seguidores. Ele discutiu a questão judaica em um discurso para milhares de pessoas, enfatizando a ameaça que ele acreditava representar o judaísmo. Streicher era visto como um defensor da Alemanha e era aclamado com entusiasmo por seus seguidores. Ele pregava a exclusão dos judeus e a restauração do mundo por meio da ideologia alemã.

Como o livro se de difundiu durante a segunda guerra mundial?

Em 1938, os editores do jornal nazista Der Stürmer lançaram um livro infantil intitulado Der Giftpilz, com o objetivo de ensinar às crianças que os judeus eram uma ameaça para a Alemanha. O livro comparava os judeus alemães a um cogumelo venenoso, alertando sobre os perigos de se envolver com eles. O autor e artista Phillip "Fips" Rupprecht criou uma série de contos ilustrativos, destacando estereótipos antijudaicos, como a suposta adoração por dinheiro e tentativas de sequestro de crianças alemãs por homens judeus. O Cogumelo Venenoso foi apenas um exemplo de textos infantis que promoviam o anti-semitismo durante a era nazista, alcançando sucesso e popularidade através de exposições e murais baseados no livro. Estas iniciativas contribuíram para disseminar a ideologia racial nazista entre crianças e adultos na Alemanha.

Quais livros infantis foram difundidos contra os judeus durante a segunda guerra?


O primeiro livro, intitulado "Der Giftpilz" ou "O Cogumelo venenoso" (à esquerda), foi publicado em alemão em 1938 e serviu como evidência nos Julgamentos de Nuremberg. A segunda obra, intitulada "Der Pudelmopsdackelpinscher" ou "O Mestiço", foi lançada em 1940 e defendia o assassinato de judeus. Já a terceira obra foi publicada em 1936 em Nuremberg, Alemanha, com o título em alemão "Você não pode confiar em uma raposa na charneca e em um judeu em seu juramento: um livro ilustrado para jovens e velhos". A capa apresenta uma raposa na charneca e um homem judeu prestando juramento, o livro foi escrito e ilustrado por Elvira Bauer (1915 - depois de 1943), professora de jardim de infância, estudante de arte e apoiadora nazista.

Como funcionava a propaganda nazista nas escolas?

A propaganda nazista nas escolas era uma ferramenta essencial do regime para disseminar suas ideologias e valores entre os jovens alemães. As escolas eram usadas para doutrinar as crianças com a ideologia nazista desde cedo, de forma a moldar suas crenças e visões de mundo de acordo com os princípios do regime.

Os alunos recebiam uma educação que enfatizava a superioridade da raça ariana, a necessidade de defender a pátria e o Führer (Adolf Hitler), e a importância de obedecer às autoridades e seguir as diretrizes do partido nazista. Os livros didáticos eram cuidadosamente selecionados para promover essas ideias e retratar o nazismo de forma positiva.

Além disso, os professores eram incentivados a participar de organizações nazistas e a promover a ideologia do partido em suas aulas. As crianças eram encorajadas a denunciar qualquer oposição ao regime por parte de seus colegas ou familiares, o que criava um ambiente de medo e controle nas escolas.

Em resumo, a propaganda nazista nas escolas tinha como objetivo criar uma geração de jovens fanáticos e leais ao regime, que estivessem dispostos a defender o nazismo e seus líderes a qualquer custo.

Assista ao vídeo abaixo para uma explicação do que ocorria na prática.

Resenha: O Brasil como problema, de Darcy Ribeiro

 

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APRESENTAÇÃO

Os textos aqui reunidos são um retrato da paixão imensa que Darcy Ribeiro tinha pelo nosso país. Ele sonhou o Brasil como uma nova civilização, e foi à luta. Aqui Darcy fala claramente o que pensa sobre o Brasil e seus desafios, a história das sociedades humanas, as Américas, abrangendo as relações sociais básicas e os meios de subsistência dos povos.


RESENHA


O livro 'O Brasil como problema', do autor Darcy Ribeiro, é uma antologia de ensaios e estudos acerca dos problemas de desenvolvimento, sustentabilidade e sociedade no país. A obra é dividida em quatro seções, sendo elas: "O Brasil em causa", que visa analisar sob várias óticas os problemas relacionados à crise ética e política, às causas, aos problemas e ao envolvimento dos indígenas na história do desenvolvimento do Brasil. A segunda parte, intitulada "ensaios", é uma análise minuciosa da origem e formação dos povos latino-americanos, da Amazônia e de seus povos e das diferenças existentes entre o governo e o ato de governar e pensar social da Suíça como exemplo a ser seguido. O terceiro capítulo, "temas e fazimentos", narra o memorial da América Latina e a universidade do terceiro milênio, enquanto o quarto e último capítulo, "temas e problemas", se dedica a uma investigação empírica da urgência de temas como o Estado, as universidades e a chacina promovida pela lei agrária no país.


O Brasil é um país que se construiu independentemente dos desígnios de seus colonizadores, surgindo como um novo povo distinto de qualquer outro. Resultado da colonização europeia nas Américas, o Brasil é uma mistura de raças e culturas que se fundiram para criar uma nova civilização. Apesar de suas origens europeias, africanas e indígenas, os brasileiros são únicos e desafiados a se reinventarem, sendo herdeiros de uma terra exuberante que precisa ser preservada. O país é uma nação étnica e coesa, com potencial para se tornar uma civilização autônoma, solidária e influente no mundo. A população brasileira é unida pela língua e cultura, marcada pela criatividade e diversidade provenientes das influências de suas matrizes. Apesar dos desafios enfrentados, como a inclusão dos povos indígenas e negros, a pluralidade do Brasil é sua força para conquistar um futuro baseado no desenvolvimento.


Os capítulos podem ser analisados separadamente ou em uma única unidade de sentido, analisando o panorama proposto pelo autor em relação aos problemas que impedem, de certa forma, o desenvolvimento do Brasil e as problemáticas que povoam mortes e pobrezas entre os povos mais explorados.


Se pudéssemos analisar de forma mais elaborada as idéias do autor, poderíamos começar inferindo que a crise ética e política no Brasil é evidente, com escândalos de corrupção e desmandos que comprometem a normalidade institucional. O impeachment do Presidente da República e as investigações no Congresso Nacional mostram a gravidade da situação. A falta de punição para os envolvidos e as tentativas de limitar as investigações levantam questões sobre a capacidade do país de combater a corrupção e formar cidadãos íntegros. O Parlamento e o Judiciário também são alvo de críticas, com acusações de corrupção, injustiça e falta de transparência. A população exige uma atuação ética e responsável dessas instituições, que devem estar a serviço da nação e não de interesses particulares. Também menciona os desafios enfrentados pelo país na atual conjuntura, ressaltando a importância de uma política econômica voltada para a soberania nacional e o desenvolvimento independente e sustentável. Por fim, enfatizamos a necessidade de negociar a dívida externa e preservar as empresas públicas como estratégias para garantir o futuro do Brasil.


O autor destaca a corrupção e o clientelismo como graves problemas que afetaram a máquina administrativa brasileira, causando distorções e prejuízos. Ele critica a prática de nomeações políticas para cargas públicas e aponta a influência nociva das grandes empresas e multinacionais na economia nacional. Além disso, ele questiona a capacidade do empresariado brasileiro em promover o progresso e a distribuição de riqueza, apontando para a concentração de renda e a predominância de interesses estrangeiros no cenário econômico. As elites do Brasil, formadas por patronado e patriciado, são responsáveis ​​pela falta de ameaças no país, privilegiando a concentração de riqueza e poder em suas mãos. Enquanto nos Estados Unidos, as elites abriram oportunidades para os pioneiros cultivarem terras, no Brasil, a lei de terras de 1850 instituiu o monopólio da terra.


O atraso e a pobreza no Brasil são causados ​​principalmente pelo caráter retrógrado das classes dominantes, que sempre atuaram em benefício próprio, explorando o país para atender demandas externas. É preciso buscar caminhos de superação do subdesenvolvimento autoperpetuante e romper com a perversão econômica que perpetua a pobreza da maioria da população. É um desafio encontrar uma solução para os problemas comuns do Brasil e do mundo subdesenvolvido, que aguardam uma mudança de postura em relação ao mercado internacional. Vivemos uma conjuntura trágica, onde as diretrizes econômicas são insensíveis e alienadas aos interesses nacionais. Para avançar, é preciso formular um projeto de integração baseado no desenvolvimento social e na associação com os povos explorados. Todos somos prejudicados pela desigualdade social, pela falta de preocupação com as necessidades do povo e pela manutenção de uma sociedade injusta. 

Diante da atualidade marcada pela dívida externa e pela política de privatizações, os brasileiros enfrentam o desafio de compreender e equacionar essas questões para o destino da nação. Em um contexto em que um pensamento de direita é predominante, é necessário buscar alternativas diante do fracasso das esquerdas socialistas. As sociedades evoluem de maneiras diversas, com algumas se destacando e impondo sua hegemonia sobre outras. O Brasil, por absorver os frutos da Revolução Industrial sem se tornar um polo autônomo, acabou se tornando dependente e recolonizado. No entanto, o país, com suas condições únicas e sua população homogênea, tem potencial para se tornar uma sociedade vanguardeira, autônoma e próspera. A política atual, baseada no lucro e na privatização, leva ao empobrecimento generalizado e à concentração de riqueza. É necessário buscar uma abordagem mais responsável, que promova a colaboração das empresas estrangeiras com os interesses nacionais e a distribuição equitativa dos investimentos regionais. A submissão ao mercado global, sem uma vigilância eficaz, pode comprometer a soberania e as potencialidades do povo brasileiro.


Atualmente, o Brasil enfrenta dois desafios cruciais: a negociação da dívida externa, principalmente com os EUA, e o aumento das privatizações inspiradas pelo FMI. A dívida externa tornou-se um instrumento de chantagem e extorsão dos países ricos, controlando as nações pobres que produzem insumos para o capitalismo. O governo Collor tentou resistir aos banqueiros internacionais, mas acabou impondo medidas que causaram recessão e desemprego. Já o governo Itamar aprofundou o neoliberalismo, alegando não haver alternativa para a modernização econômica. O histórico da dívida brasileira remonta ao Império, onde o endividamento se tornou um vício. A exceção foi Getúlio Vargas, que modernizou o Estado e lançou as bases do desenvolvimento autônomo. Atualmente, não se sabe ao certo a situação real da dívida externa brasileira, que explodiu na última década, tornando-se a causa principal da crise econômica.


Estudos do professor Luiz Fernando Victor da Universidade de Brasília mostram que, de 1956 a 1988, o Brasil assumiu empréstimos e financiamentos de 267 bilhões de dólares, enquanto pagava 287 bilhões de dólares em serviço da dívida. Além disso, o país recebeu 33,5 bilhões de dólares em capitais de risco, mas remeteu 24,5 bilhões em lucros e dividendos, resultando em um saldo positivo de apenas 4,5 bilhões de dólares. Isso evidencia que o Brasil é, na verdade, um exportador de capital, com uma dívida crescente. A situação se agrava na América Latina, onde houve um prejuízo de 200 bilhões de dólares de 1982 a 1988 devido à transferência líquida de capital para os países credores. A política de privatizações, fortemente influenciada pelos países ricos, não resolverá os problemas econômicos do Brasil e apenas agravará a situação. A privatização da Companhia Siderúrgica Nacional foi um escândalo na história econômica do Brasil, sendo entregue a banqueiros por um preço muito baixo. A empresa junto com a Companhia Vale do Rio Doce representaram um marco na industrialização nacional, mas foram espoliadas por interesses privados durante a ditadura militar. Atualmente, a Vale possui um patrimônio enorme e está na mira dos tecnocratas que querem privatizá-la. Outras empresas estatais como Petrobras, Eletrobras e Embratel estão sendo alvo de privatização, o que representaria um prejuízo irreparável para o país. A tendência de privatização adotada pelo governo brasileiro está sendo questionada, pois em outros países, a desestatização é feita de forma mais cautelosa e responsável. A privatização na Inglaterra, por exemplo, resultou em problemas sociais e na queda do país no ranking das potências mundiais. O processo de privatização no Brasil está sendo conduzido de forma imprudente e prejudicial à economia nacional.


A importância da etnia na formação do ser humano é destacada, ressaltando que a comunidade étnica é essencial para a transmissão de conhecimento, valores e cultura. A língua e os saberes verbais são fundamentais para a identidade e sobrevivência de um grupo étnico. Mesmo diante de ameaças e influências externas, as comunidades étnicas têm uma notável capacidade de resistência, desde que consigam manter a tradição e criar os filhos dentro dos valores e conhecimentos do grupo. Além disso, é destacado que as microetnias, formadas a partir da divisão de grupos maiores, tendem a manter uma identidade própria e uma hostilidade em relação a outras microetnias.


Temas e problemas: Qual a causa real de nosso atraso e pobreza?

Esse capítulo, em especial, critica a ideia de Estado mínimo defendida pelos neoliberais, argumentando que o Estado brasileiro precisa ser recuperado e fortalecido para cumprir suas funções essenciais, como assistência social, educação e segurança. Destaca a necessidade de um Estado que atue em prol do povo brasileiro e não apenas dos interesses dos mais ricos. Critica também as políticas neoliberais que resultaram na precarização dos serviços públicos e na deterioração da máquina do Estado. Propõe uma reforma do Estado que o torne mais eficaz, ético e responsável, capaz de promover o desenvolvimento nacional autônomo e garantir o bem-estar da população. Em vez do Estado mínimo, defende o Estado necessário.


O capítulo também ameaça de genocídio imposta pela Lei Agrária brasileira, que impede a distribuição de terras improdutivas para os sem-terra. O movimento dos sem-terra reivindica direito à terra para viver e trabalhar, em oposição à concentração de terras nas mãos de poucos latifundiários. A história do regime fundiário brasileiro é descrita como injusto e desigual, resultando na expulsão de milhões de pessoas do campo para as cidades. A reforma agrária proposta por João Goulart foi interrompida pelo golpe de 1964, impedindo a distribuição de terras e perpetuando o domínio dos latifundiários. A solução para a questão agrária no Brasil requer a distribuição de terras improdutivas aos sem-terra e a promulgação de uma lei do uso lícito da terra, revertendo terras mal adquiridas para programas de colonização. O texto conclui que o Brasil precisa escolher entre manter o sistema fundiário arcaico e injusto ou construir uma sociedade livre, justa e participativa.


O texto se consolida também narrando a experiência de vida do autor que dedicou sua vida a lutar por diversas causas, como a salvação dos índios, a escolarização das crianças, a reforma agrária e o socialismo em liberdade. Ele se inspirou na generosidade e no compromisso dos antigos comunistas e acredita que a juventude atual precisa se engajar mais politicamente para superar as desigualdades e injustiças no Brasil. Ele ressalta a importância da unidade nacional, do orgulho da identidade brasileira e da responsabilidade histórica de construir uma sociedade mais justa e democrática. Ele conclama os jovens a se envolverem ativamente nas lutas por uma economia mais justa e pela democratização do acesso à terra.


O livro se finaliza com um capítulo intitulado 'Universidades, para quê?' com um discurso pronunciado durante a cerimônia de posse do reitor Cristovam Buarque, em 16 de agosto de 1985. Onde reflete sobre a importância e o significado da Universidade de Brasília, destacando as figuras que contribuíram para sua criação e desenvolvimento. Ele ressalta a necessidade de uma universidade séria no Brasil que possa promover a criatividade científica e cultural, e critica a universidade brasileira anteriormente existente. Darcy também elogia o novo reitor, Cristovam Buarque, e expressa a esperança de que a UnB renasça e cumpra seu papel como uma instituição de ensino de alta qualidade.


Em resumo, 'O Brasil como problema' é uma obra rica em análises e reflexões sobre os desafios enfrentados pelo Brasil em seu desenvolvimento como nação. Darcy Ribeiro apresenta uma visão crítica e propositiva, apontando os problemas estruturais e éticos que impedem o progresso do país, ao mesmo tempo em que destaca o potencial e a força da cultura brasileira. O autor enfatiza a necessidade de uma atuação responsável por parte do Estado e da sociedade, visando a construção de uma nação mais justa e solidária. É uma leitura fundamental para quem busca compreender as complexidades do Brasil e as possibilidades de transformação rumo a um futuro mais promissor.

Resenha: Campo geral, de João Guimarães Rosa

Foto: Arte digital

APRESENTAÇÃO

A infância é o tempo de descobertas. É a fase da vida em que o ser humano recebe e retribui os sentimentos à sua volta com maior vigor e integridade. Com Miguilim, menino que protagoniza esta novela de João Guimarães Rosa, não é diferente. Contudo, a visão de mundo repleta de sensibilidade que vinca a personalidade da criança transforma o conjunto de situações que ela experimenta num redemoinho sem precedentes de sensações. Os leitores de Campo Geral naturalmente se envolvem e se emocionam ao tomar contato com as impressões e conclusões do menino sobre o mundo que o cerca. Tanto os medos mais profundos de Miguilim quanto seus sonhos mais intensos são concebidos pelo pincel multicor de Guimarães Rosa.

O convívio familiar, o cultivo das amizades, a dura vida no sertão e a necessidade incontornável de encarar os desafios que a condição humana apresenta são elementos centrais desta narrativa. Neste livro, tem-se o privilégio de captar o âmago da vida no sertão através do olhar de uma criança, uma escolha que revela a grandeza literária de Guimarães Rosa.

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RESENHA

O livro “Campo Geral”, escrito por João Guimarães Rosa, é uma obra que nos transporta para o sertão mineiro, onde a vida se desenrola em meio à simplicidade e à complexidade das relações humanas. Através da história de Miguilim, um menino de oito anos, somos convidados a explorar os sentimentos, as memórias e os conflitos que permeiam sua existência.

O cenário é o remoto lugar chamado Mutúm, nos Campos Gerais. A mãe de Miguilim, apesar de bela, vive entristecida pela distância de tudo e pelo tempo sempre sombrio. O morro que separa o Mutúm do mundo exterior é uma barreira que ela não consegue transpor. A mata próxima causa medo em Miguilim, que tenta compreender o inexplicável.

Um certo Miguelin, seu pai e seus irmãos, longe, longe daqui, muito depois da Vereda-do-Frango-d’Água e de outras veredas sem nome ou pouco conhecidas, em ponto remoto, no Mutúm. No meio dos Campos Gerais. (p.7)

A narrativa nos leva a passeios pela fazenda dos Barbóz, momentos de brincadeira, comida e interações com animais. Miguilim nutre um carinho especial pelos cachorros e, principalmente, pela cachorra Pingo-de-Ouro. Quando ela é levada por tropeiros, Miguilim chora e espera seu retorno, mesmo sabendo que ela está quase cega. A história triste do Menino que perdeu sua cuca no mato ecoa em sua mente, e ele passa a chamá-la de Cuca, nunca a esquecendo. No entanto, a vida de Miguilim não é apenas marcada por momentos felizes. Ele presencia a briga violenta entre seus pais, o pai agredindo fisicamente a mãe. Vovó Izidra é a única a defendê-lo, mas os irmãos estão acostumados com as brigas. Miguilim, em castigo, reflete sobre a natureza e o vaqueiro que prevê chuva. Seu sorriso para Dito, seu irmão, é um gesto de apoio silencioso.

Miguilim presencia uma briga entre seus pais, em que o pai agride fisicamente a mãe. O irmão mais novo, Dito, tenta distraí-lo e levá-lo para longe da situação, mas Miguilim entende o que está acontecendo. O pai bate em Miguilim, que chora e é colocado de castigo, enquanto a mãe chora no quarto. Vovó Izidra defende Miguilim, mas ninguém mais o protege. Os irmãos estão acostumados com as brigas, mas Dito espiava de longe, preocupado. Miguilim fica pensando enquanto está de castigo, até que o cachorro Gigão entra e ele brinca com suas verônicas, misturando suas lágrimas. Miguilim estava sob castigo, com sede, mas não queria pedir água para não ouvir reprimendas. 

— Pai está brigando com Mãe. Está xingando ofensa, muito, muito. Estou com medo, ele queira dar em Mamãe…(Pág. 14)

O Dito era considerado a melhor pessoa, mas não devia conversar com Mãitina, que bebia cachaça e falava bobagens. Mãitina era uma mulher velha, negra fugida do cativeiro, que acharam há muito tempo. A casa envelhecida durante a tempestade é um microcosmo de crenças e superstições. Miguilim, apesar de sua pouca idade, absorve as nuances do mundo adulto e busca compreender os mistérios que o cercam.

Miguilim passa seu último dia de vida deitado na cama, cercado pelo ambiente da fazenda e pelos cuidados de sua família. Ele reflete sobre a vida e a morte, sentindo saudades de todos que ama. Enquanto Drelina o consola, ele teme a morte iminente. Seo Aristeu chega para ajudar, mas Miguilim sente que está morrendo e chama pela mãe. Um dia triste chegou quando o Patorí foi encontrado morto. O pai precisou fazer uma visita ao Cocho, enquanto a mãe levou a família em um passeio noturno, sob a lua cheia. A morte de Dito abala profundamente Miguilim. Ele se sente desorientado e diferente dos outros, alternando entre tristeza e raiva. As lembranças da Mãe abraçando o corpo de Dito o atormentam, e ele busca desesperadamente guardar cada detalhe desse momento crucial de sua vida. No entanto, Miguilim ainda se sente perdido e confuso, buscando respostas em meio às conversas triviais dos outros.

[...] veio uma notícia meia triste: tinham achado o Patorí morto, parece que morreu mesmo de fome, tornadiço vagando por aquelas chapadas. Pai largou de mão o serviço todo que tinha, montou a cavalo, então carecia de ir no Cocho, visitar seo Deográcias, visita de tristezas. (pág.78)

Miguilim estava desorientado e entristecido com a morte do Dito e a presença de tantas pessoas em seu velório. Ele se sentia diferente de todos e tinha dificuldade em lidar com suas emoções, alternando entre tristeza e raiva. Lembranças da Mãe abraçando o corpo do Dito o atormentavam e ele se perguntava o que teria sido se o irmão não tivesse morrido. No meio de sua dor, Miguilim buscava desesperadamente guardar cada detalhe desse momento. Miguilim precisava de respostas sobre o Dito, havia falecido, mas todos ao seu redor só falavam de assuntos triviais. A única pessoa que parecia compreender seu sofrimento era a Rosa, que descrevia o Dito como uma alma especial. Miguilim e Mãitina decidiram fazer um enterro simbólico para o Dito, e Miguilim se emocionou ao ver as lembranças dele sendo enterradas. 

O Pai o obrigava a realizar tarefas na roça, mesmo quando ele não estava bem. Miguilim sentia raiva do Pai, que o tratava com desdém. Seu único amigo era o gato Sossõe, que o fazia se lembrar do falecido amigo Patorí. Seu pai expressava descontentamento com ele, comparando-o sempre ao falecido irmão Dito, que era considerado um bom menino. Mesmo se sentindo mal, ele pensou em cumprir uma promessa de rezar três terços e ficar um mês sem comer doces, frutas e café. Mesmo com o apoio de seu irmão, ele começou a se sentir fraco e com dor de cabeça. No entanto, ao sentir o cheiro da terra sombreada e lembrar de momentos felizes na fazenda dos Barboz, ele encontrou um pouco de conforto. 

Miguilim estava capinando quando de repente começou a sentir mal-estar, tonteira e tremores de frio, vomitando e sendo levado para casa carregado por Luisaltino. Ele estava com uma dor forte na nuca e acabou ficando prostrado e doente, perdendo a força e sendo cuidado por sua família. Enquanto estava doente, Miguilim viu seu Pai chorar desesperadamente, preocupado com a doença dos filhos. Ele também recebeu um presente do Grivo e viu seu pai trazer frutas para tentar melhorar sua saúde. Ele queria sonhar com seu irmão Dito, mas não conseguia. Quando Miguilim finalmente melhorou, descobriu que seu pai havia matado Luisaltino e se enforcado no mato. Vovó Izidra cuidou dele e contou sobre a morte do Pai, mas também falou sobre a eternidade de Deus e Jesus Cristo. Miguilim rezou e dormiu, buscando paz em meio à tragédia que envolveu sua família.

Seu Pai também está morto. Ele perdeu a cabeça depois do que fez, foi achado morto no meio do cerrado, se enforcou com um cipó, ficou pendurado numa môita grande de miroró… Mas Deus não morre, Miguilim, e Nosso Senhor Jesus Cristo também não morre mais, que está no Céu, assentado à mão direita!… Reza, Miguilim. Reza e dorme!” (pag. 116)

Miguilim após a morte de seu pai, com a chegada de parentes e vizinhos para prestar condolências. Miguilim está doente e se recupera aos poucos, recebendo visitas de Seo Aristeu e de um homem de fora. Aos poucos, Miguilim melhora e começa a apreciar a comida e a natureza ao seu redor. Ele sorriu para o tio que se parecia com o pai. Todos estavam chorando, inclusive o doutor. Miguilim entregou os óculos ao doutor e sentiu um soluço. Todos se despediam com tristeza, exceto Miguilim, que sempre foi alegre. Ele não sabia o que era alegria e tristeza. Sua mãe o beijava e sua irmã preparava doces para ele levar na viagem. 

Através de uma narrativa rica em detalhes e sentimentos, João Guimarães Rosa nos presenteia com uma obra poética e cheia de simbolismos. A história de Miguilim nos convida a refletir sobre a vida, a morte, o amor e a solidão, explorando de forma sensível as complexidades da existência humana. Com uma linguagem cuidadosamente elaborada, o autor nos transporta para o sertão mineiro e nos faz sentir a poesia e a melancolia que permeiam cada página. “Campo Geral” é uma obra que nos emociona e nos faz refletir sobre a nossa própria jornada, destacando a importância do amor e da memória na construção de nossas experiências. Uma leitura imperdível para quem busca se conectar com as profundezas da alma humana.

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