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A Serbian Film: censura à arte ou proteção à sociedade?



A Serbian Film (Srpski film) é um filme sérvio de terror de 2010 dirigido por Srđan Spasojević. O filme conta a história de Miloš, um ator pornô que está falido e aceita participar de um filme artístico para ganhar dinheiro. No entanto, ele logo descobre que o filme é na verdade um snuff film que envolve pedofilia, necrofilia e assassinato.

O filme é extremamente violento e perturbador, e contém cenas que podem ser consideradas ofensivas para alguns espectadores. O filme foi banido em muitos países, incluindo a Austrália, a Nova Zelândia e a Noruega.

O filme A Serbian Film é conhecido por seu enredo controverso e violento, que incomodou muitos espectadores e foi massivamente criticado. O diretor, Srdjan Spasojevic, alegou que a história contada não era voltada para chocar, mas sim, retratar elementos diretamente ligados a episódios que teria presenciado ao longo de sua vida.

Apesar disso, o filme foi proibido em vários países, com a justificativa de que ele estimulava a violência. Na Espanha, por exemplo, ‘A Serbian Film’ foi exibido em um festival e o diretor foi processado pelo Estado. Já no Reino Unido, a obra só foi liberada para ser transmitida nos cinemas após mais de 40 cortes de cenas, sendo considerado um dos filmes mais polêmicos já exibidos no país.

No Brasil, a produção foi censurada duas vezes. Em 2011, quando o filme foi lançado, uma liminar na Vara da Infância e da Adolescência chegou a ser pedida contra a exibição do longa no festival RioFan, no Rio de Janeiro. Logo depois, em 2012, um juiz aprovou a exibição da obra, depois de um grande número de cineastas, cinéfilos e críticos alegarem que a proibição seria uma forma de censura à arte.

O filme tornou-se um marco entre os piores já produzidos no mundo, e certamente, o mais inesquecível em todos os sentidos. A obra retrata cenas de abuso sexual, mutilação, estupro, necrofilia, pedofilia, assassinato, exploração, sadismo, masoquismo, dentre outras categorias absurdas da indústria cinematográfica.

A Serbian Film é um filme controverso, e há muitas interpretações diferentes sobre o seu significado. Alguns críticos acreditam que o filme é uma crítica à violência e à corrupção na sociedade sérvia. Outros acreditam que o filme é simplesmente uma exploração da violência e da depravação humana.

O filme foi lançado em 2010, e recebeu críticas positivas e negativas. Os críticos que elogiaram o filme o chamaram de “um filme perturbador e chocante que não é para os fracos de coração”. Os críticos que criticaram o filme o chamaram de “um filme repugnante e sem sentido”.

A Serbian Film é um filme que certamente não é para todos. É um filme extremamente violento e perturbador, e pode ser considerado ofensivo para alguns espectadores. No entanto, o filme é também um filme que é impossível de ignorar. É um filme que vai ficar com você por muito tempo depois de assisti-lo.

Aqui estão alguns dos temas principais do filme:

  • A violência e a depravação humana: O filme é repleto de cenas de violência e depravação humana. Essas cenas são apresentadas de uma forma gráfica e realista, o que pode ser muito perturbador para alguns espectadores.
  • A crítica à sociedade sérvia: Alguns críticos acreditam que o filme é uma crítica à violência e à corrupção na sociedade sérvia. O filme retrata uma sociedade em que a violência e a depravação são comuns, o que pode ser visto como uma crítica à situação política e social da Sérvia.
  • A exploração da violência e da depravação humana: Outros críticos acreditam que o filme é simplesmente uma exploração da violência e da depravação humana. O filme apresenta cenas de violência e depravação de uma forma que pode ser vista como sensacionalista e morbosa.

A Serbian Film é um filme que certamente vai causar polêmica. É um filme que é impossível de ignorar, mas que pode ser muito perturbador para alguns espectadores.

Assista ao trailer:

[REENHA #685] A vida afinal: conversas difíceis demais para se ter em voz alta, de Cynthia Araújo

 APRESENTAÇÃO

A partir de experiências profissionais e pessoais, e de um recorte de sua pesquisa de doutorado com pacientes com câncer metastático, Cynthia Araújo constrói uma reflexão sensível e contundente sobre o viver e o viver sob a perspectiva da morte. Como advogada da União, entre tantas atribuições, ela defendeu o Estado brasileiro em casos de fornecimento de medicamentos caros pelo SUS a pacientes com câncer. Centenas de processos e entrevistas com pacientes oncológicos depois, a autora levanta questões que interessam a cada um de nós, com câncer ou não, em A vida afinal.

Remédios que podem prolongar um pouco a vida de quem espera deles uma cura ou décadas inteiras pela frente — um abrir mão do presente com qualidade pela expectativa de um futuro que tantas vezes não vem. Escolheriam os mesmos tratamentos se soubessem o que realmente podem oferecer? Neste ensaio, o olhar da autora está voltado para as percepções sobre esse tempo a mais de vida de quem está próximo do fim e para a finitude que paira no ar de cada um. Sua escuta em depoimentos no Brasil e na Alemanha a conduzem pelo tortuoso caminho dos sentimentos, das emoções e das ações de quem não tem mais tanto tempo entre os seus afetos e sonhos.

RESENHA

A vida afinal é um livro escrito pela escritora e advogada Cynthia Araújo, publicado pela editora Paraquedas, selo da editora Claraboia.

O câncer é uma das doenças que mais matam no mundo. É conhecido por possuir tratamentos, mas não uma cura definitiva. Os medicamentos e as tecnologias atuais são, em sua maioria, uma tentativa de salvar a vida do paciente, o que nem sempre ocorre, levando em consideração o grau de avanço da doença pelo corpo. Um câncer metastático que está no auge de sua evolução requer paciência, compreensão e uma metodologia diferente das convencionais para o tratamento, não para a cura. Expor ao paciente de forma que ele entenda que está vivendo seus últimos dias é um dos processos mais complexos e difíceis da atualidade.

No Brasil, os registros dividem-se entre câncer de colon, próstata, mama e pele. Há, segundo estatísticas, 192 novos casos de câncer entre os homens a cada 100.000 habitantes, e entre as mulheres a taxa é de 179 casos a cada 100.000 habitantes. Em síntese, 51,4% para os homens e 48,6% para as mulheres.

A morte é um tabu. A única certeza que temos na vida é que ela um dia acabará, não importa o que você pensa sobre a vida ou como ela terminará, o fim chegará para todos. Cynthia desenvolve em sua obra uma perspectiva que ilumina os pensamentos e reflexões acerca da morte. Desenvolvido através de uma tese de doutorado, a obra desvendará os pensamentos acerca da morte e a ressignificação da vida durante diagnósticos ou vivência de câncer e doenças em estado terminal. Para a autora, realizar planos desmedidamente sem refletir sobre o caráter imprevisível da vida é uma forma de limitar o ser humano a viver a vida com mais afinco e verdade.

Para a autora, o mais necessário durante o progresso da doença é a clareza e exposição dos reais acontecimentos acerca da finitude da vida, preparando a pessoa para o momento cautelosamente, criando assim, a certeza de uma morte digna. Desta forma, o paciente pode se preparar para viver sonhos e metas realistas, não se pautando na incerteza do amanhã ou de uma cura que não virá. Entender que se está nos últimos dias ou meses de vida é crucial para se viver uma vida com mais afinco.

A autora descreve como seu papel como advogada da união influenciou sua decisão em abordar este tópico em uma tese de doutorado: “minha pesquisa investigou o papel da esperança em casos de doenças graves e refletiu sobre como a ilusão de sobreviver e projetar um futuro pode desviar a atenção do viver o presente da melhor forma possível (p.21).” Neste mesmo relato, a autora fala sobre como os processos de solicitação de medicamentos para tratamentos avançados de câncer eram previsíveis e todos com estado de urgência com características, em sua maioria, de metástase. Isso a fez refletir se, de fato, aqueles pacientes acreditavam mesmo em uma possibilidade de cura ou melhora. Como no caso de alguém na casa dos trinta anos que está se tratando com o terceiro quimioterápico, se realmente acreditava em uma melhora, ou no caso de uma idosa de oitenta anos com um tumor agressivo em uma condição tão frágil de vida e saúde realmente desejava receber mais tratamentos.

Seguindo o raciocínio, a autora declara que uma fala de um colega de profissão, o Dr. José Luiz Nogueira, acendeu em si uma confirmação de que suas teorias estavam certas. Em determinado momento de uma conferência, ela perguntou ao doutor sobre os medicamentos que eram liberados para os pacientes com câncer, e ele respondeu: “Olha, esses medicamentos que o senhor leu aqui, o paciente vai morrer. Todos. Com ou sem medicamento. Não tem mágica, não tem jeito, são pacientes com câncer em estágio avançado, metastático, péssimas condições. (p.21)”.

A tecnologia e os inúmeros tratamentos e medicamentos existentes não fomentam maior recuperação ou regressão para diversas doenças, mas podem, em suma, melhorar, mas não agir com efeitos ou milagres nos pacientes. Quando pensamos na morte — e pensamos raramente — sempre pensamos que ela chegará apenas para o idoso e para o debilitado ou adoecido, mas ela chega para todos, e pode ser em qualquer momento, e ter ciência da finitude da vida é uma forma de aproveitar todos os dias como se fosse o último, porque um dia será. E assim como rejeitamos a ideia de proximidade e noção da morte, rejeitamos diagnósticos de doenças e a previsibilidade da aproximação da morte próxima de nós — família, amigos, cônjuges, filhos, e nós mesmos.


Mesmo jovens. Mesmo jovens demais.

Mesmo saudáveis. Mesmo saudáveis demais.

Idealizamos que quem morre é sempre o outro. Até que não é mais.


Em síntese, a obra de Cynthia Araújo abre precedentes para um debate acerca da vida através da reflexão na morte, através do poder de valoração do dia-a-dia e da companhia de quem amamos, pois cada instante pode ser o último. A obra também questiona o papel do poder público, dos familiares e amigos durante o processo de descoberta e vivência de cânceres, em especial os metastáticos, em relação à exposição da verdade para o acometido pela doença. As reflexões também pautam-se na esperança que se é fomentada por promessas e omissão de informações para os pacientes, sejam por protocolos ou por pedido dos familiares. A vida afinal é uma obra poderosíssima que reflete a finitude da vida e o papel ético em relação à morte ao processo de vida nos últimos dias do paciente. Uma obra poderosa e necessária.

Sobre a autora

Cynthia Pereira de Araújo é advogada da União, membro da Advocacia-Geral da União desde 2009, e coordenou a atuação contenciosa na área de saúde de Minas Gerais (2014-2015). Mestre e doutora em Direito pela PUC-Minas, sua tese, Existe direito à esperança? Saúde no contexto do câncer e fim de vida, foi indicada pelo programa de pós-graduação da PUC-Minas ao prêmio Capes de Teses 2020. Em 2021, foi convidada para expor sua pesquisa no 9º Simpósio Internacional Oncoclínicas e Dana Farber Cancer Institute.

Nasceu em Petrópolis, no Rio de Janeiro, e mora em Belo Horizonte, em Minas Gerais, com o marido Daniel e a filha Beatriz, para quem compôs a música “Beatriz II”, lançada em 2022

[RESENHA #684] A próxima onda: Inteligência artificial, poder e o maior dilema do século XXI, de Mustafa Suleyman e Michael Bhaskar

Arte gráfica / Editora Record / Todos os direitos reservados

APRESENTAÇÃO

Em breve o mundo estará cercado por inteligência artificial. As IAs organizarão rotinas, operarão negócios e ficarão responsáveis pelos principais serviços públicos. A humanidade passará a viver em um mundo de impressoras de DNA, computadores quânticos, patógenos artificialmente criados, armas autônomas, assistentes robôs e energia abundante.

Mas ninguém está preparado.

À medida que governos frágeis seguem no escuro em direção à catástrofe, o ser humano encara um dilema existencial: de um lado, males sem precedentes que podem emergir do surgimento incontrolável de novas tecnologias e possibilidades; de outro, a ameaça de uma supervigilância autoritária. Seria possível encontrar um meio-termo entre a catástrofe e a distopia?

Em A próxima onda, Mustafa Suleyman, cofundador da DeepMind, uma das principais empresas de inteligência artificial, explicíta o que as IAs representam para a próxima década, e como essas forças criarão imensa prosperidade, mas também podem colocar em risco os Estados nacionais, ou seja, a base da ordem global.

RESENHA

Suleyman, Mustafa. A próxima onda: inteligência artificial, poder e o maior dilema do século XXI / Mustafa Suleyman, Michael Bhaskar ; tradução Alessandra Bonrruquer, - 1. ed. - Rio de Janeiro: Record, 2023.

Este livro é uma obra inovadora em diversos momentos e por vários motivos. O primeiro e mais claro é o fato de que ele aborda a temática como sendo pessimista em relação ao futuro com a inteligência artificial e a biotecnologia. Diferente do que se espera, o autor não escreve uma obra descrevendo os efeitos como negativos em um todo, mas como uma ferramenta que não podemos parar, mas podemos moldar os seus efeitos sobre a sociedade e seu funcionamento.

Mustafa Suleyman é um pesquisador e empresário britânico de inteligência artificial, cofundador e ex-chefe de IA aplicada da DeepMind, uma empresa de inteligência artificial. Portanto, compreende-se que o autor fala de convicções pautando-se no conhecimento profundo do universo da IA. O título “A onda” é uma forma de expressar a rápida proporção social acerca da influência da inteligência artificial, como ocorreram com as NFTs ou com o metaverso, que, cada qual em seu período, gerou diversas especulações. A maioria delas levantando debates interessantes acerca de como somos moldados e dominados pelo mundo digital e pelas ondas dos virais sociais tecnológicos. Ele também a vê como parte de uma era tecnológica mais ampla, que está ligada à engenharia genética, especialmente à edição genética e à biologia sintética. Também apanhadas pelas correntes estão outras tecnologias potencialmente revolucionárias, como a computação quântica e a energia de fusão. Suleyman argumenta de forma convincente que nenhuma destas tecnologias se desenvolve isoladamente; elas procedem sinergicamente, à medida que o progresso numa área estimula o progresso nas outras.

O principal conteúdo e tese desta obra dialoga diretamente com o poder socioeconômico e político das grandes potências, que, como sabemos, poderão devastar a sociedade de formas avassaladoras, tudo com o poder em suas mãos através de uma tecnologia extremamente avançada e repleta de ganchos e macetes jamais vistos, trabalhando de forma autônoma e eficiente sem muito esforço ou programação.

Suleyman também diverge da linha mais comum da indústria tecnológica na forma como recorre de forma impressionante ao passado para nos ajudar a compreender o presente e a preparar-nos para o futuro. Vinhetas históricas sobre o progresso tecnológico, desde a Revolução Industrial ao motor de combustão e aos primórdios da Internet, estão envolventemente entrelaçadas ao longo do livro. Como demonstram estes exemplos, as ondas tecnológicas são quase imparáveis ​​— e, de qualquer forma, não deveríamos querer detê-las, porque a estagnação tecnológica não é a resposta. Como ele escreve astutamente: “A civilização moderna assina cheques que só o desenvolvimento tecnológico contínuo pode descontar”.

É particularmente interessante que Suleyman inclua uma discussão ampla e ponderada sobre medidas concretas e práticas que podemos tomar. Suas sugestões são notavelmente amplas e equilibradas. Ele rejeita veementemente o hiper-libertarianismo de magnatas da tecnologia como Peter Thiel, e defende uma regulamentação forte e a cooperação internacional, mas reconhece a natureza míope dos governos modernos e as inúmeras formas pelas quais a regulamentação falha. Em questões econômicas, ele não vai tão longe como algumas críticas contundentes aos fundamentos capitalistas da IA, mas vai muito mais longe do que a maioria na indústria tecnológica quando discute o papel dos incentivos financeiros no encorajamento da assunção de riscos perigosos. Ele também oferece algumas ideias intrigantes sobre política fiscal e reestruturação empresarial que merecem mais atenção.

Ainda não se sabe se o ChatGPT acabará sendo central para a onda que se aproxima ou apenas detritos levados para a costa pelas tecnologias que realmente importam. Em vez de nos concentrarmos nas aplicações que resistirão ao teste do tempo e nas start-ups que terão sucesso, devemos olhar para cima e reconhecer o que se aproxima rapidamente e que há muitas coisas que podemos fazer para nos prepararmos para isso. Suleyman fornece um guia muito necessário — e extraordinariamente atencioso, expansivo, historicamente enraizado e escrito de forma envolvente.

Ele acredita que dentro de alguns anos, os sistemas de IA entrarão no amplo mercado público, colocando um enorme poder computacional nas mãos de qualquer pessoa com alguns milhares de dólares e um pouco de experiência. Suleyman reconhece que isto poderia trazer benefícios notáveis, mas argumenta que os negativos são ainda maiores. Uma possibilidade assustadora é um indivíduo descontente usar IA pronta para uso para fabricar um vírus mortal e imparável. Outros cenários vão desde a perturbação dos mercados financeiros até à criação de inundações de desinformação.

Suleyman aceita que o gênio da IA ​​está muito fora da garrafa para ser colocado de volta; as questões agora são sobre contenção e regulação. Existe um modelo na estrutura estabelecida pelo setor biomédico para estabelecer diretrizes e limites morais sobre quais experimentos genéticos poderiam ser realizados.

[RESENHA #683] Humano, de Yan V.S. Machado

Arte gráfica / Este livro merece estar em um quadro, para que todos possam ver sua beleza.

APRESENTAÇÃO

Milênios atrás, os gregos avisaram: “Conhece-te a ti mesmo”. Mas duvido que alguém consiga ir até as profundezas de si e voltar para contar a história. Nós somos o grande mistério, escondendo nossas faces de nós mesmos e dos outros. Fingimos saber quem fomos, somos e podemos ser a cada minuto do dia, porém basta parar e refletir um pouco, e logo não queremos pensar mais. Talvez não exista nada a temer mais do que espelhos. Os reflexos que estão fora e, principalmente, os que estão dentro de nós. Somos fortes e fracos, tão complexos, mas tão simples. Rimos, choramos, nos apaixonamos com a mesma facilidade com que quebramos. No fim, somos humanos, e isso basta para dormirmos a noite, mesmo quando descobrimos que os monstros não estão embaixo, e sim em cima das camas. Não tenho ideia de como você lerá esses versos, se vão te fazer companhia em uma noite fria ou no calor de um ônibus lotado. Não sei se te tocarão com o mesmo significado que tinham quando brotaram de mim, porém não é essa a mágica da coisa? 

RESENHA

Humano, palavras lapidam pedaços de nós é uma obra de Yan Victor Silva Machado, também sua primeira obra. Publicado pela Alma, selo de poesia da editora Flyve, a obra tem como foco a análise da psiquê humana por meio da poesia. A obra se divide em quatro partes, que somam entre si uma unidade de sentido. O recurso psicológico adotado nas palavras do autor é reflexo do percurso metodológico do curso de psicologia que ele cursa.

Como descrito na apresentação da obra, este livro é uma busca pelo reconhecimento e conhecimento do eu interior. As poesias giram em torno dos mistérios que envolvem a tomada de decisão humana, bem como os caminhos obscuros e os percursos adotados perante a vida. A obra também analisará de forma concisa e objetiva os medos e os anseios da mente humana. A primeira divisão da obra, intitulada “monstros em nós”, é uma análise profunda da tomada de decisões e caminhos da mente humana por meio de erros, fracassos ou escolhas mal resolvidas. Como dito no poema “vozes”, “tenho medo que me destrua. A voz que escuto parece não ser sua”. Essa é uma confissão autodeclarada de alguém que está com problemas mal resolvidos em relação a si próprio e ao descontentamento do fim de uma relação. O desfecho de um grande ápice amoroso. Assim sendo, sua problemática segue o assombrando em “esse eco só vai continuar”. O problema descrito no poema de abertura segue sendo explorado no poema seguinte, “solos de vidro”, onde o autor faz alusão a uma flor que migrou do solo para um solo carregado de vidros, onde, claro, não pode florescer, pois, como o poema se finaliza, “solos de vidro não são para flores, pois solos de vidro não guardam amores”. Levando em consideração que toda a primeira parte carrega um forte sentimento de perda de identidade, de amor e de abandono, podemos, de fato, concluir que este capítulo remete a uma série de reflexões profundas acerca das relações humanas, das dependências emocionais e do agravamento de sentimentos por delírios e problemas emocionais, que, em síntese, precisam ser tratados, mas que, poeticamente falando, são lindos e intensos.

A segunda parte da obra intitulada “metanoia” é uma parte que aborda o processo de ressignificação e superação. O poema de abertura, “estações”, é a descrição perfeita de como somos acometidos por reflexões e pensamentos que moldam quem somos durante momentos específicos da nossa vida, como durante o processo de conhecimento de alguém para se amar. O poema nos fala sobre alguém que está precavido emocionalmente. Ele entende que essa pessoa trouxe um frescor e uma novidade que antes se fizeram ausentes, mas ele também entende que todo frescor pode se tornar em frio ou dependência. Então, diferente do narrado anteriormente no primeiro capítulo, aqui, há uma poderosa introspecção poética sobre amor próprio: “uma andorinha só pode não fazer verão, mas um coração bem ancorado não vai ser despedaçado por uma simples estação”. Já o poema ''ciclos'' é o reconhecimento de que tudo se finda, e claro, uma poderosa reflexão de que ''um círculo que se encerra traz renovação''.

A terceira parte da obra, “fragilidade”, fala sobre os resquícios de alguém maltratado pelo amor. O eu lírico do poema traz em suas palavras reflexões acerca dos impasses emocionais tomados pela vida, que tornaram as relações mais complexas e baseadas em insegurança. No poema “quebrado”, o autor nos diz: “Mas você me fez assim, deixou marcas em mim, me acorrentou, e o pior de tudo é que você me amou”. As marcas das relações passadas também ecoam por todos os poemas e se fazem ainda mais presentes no poema “anacronismo”: “Não consigo parar, não consigo seguir, só consigo sentir o presente esvair” e, novamente: “Mesmo quando devia me sentir completo, isso sempre acaba parecendo incerto”.

O quarto e último capítulo da obra, intitulado “histórias”, é o resumo de todos os outros efeitos. Aqui, o autor tece belíssimas reflexões de resiliência e autocrítica: “Quem construiu os degraus do passado?”; "Cada um carrega o seu próprio portal, um caminho só seu, um mundo individual”. Em síntese, o autor cria uma atmosfera altamente inflamável, seus poemas penetram a alma e o sentimento de impotência e fraqueza. Sua escrita é poderosa e verossímil, e não há o que se dizer, apenas sentir. Certamente, espero que o autor trilhe caminhos sob essa mesma ótica e perspectiva, pois brilhará na poesia como nunca alguém brilhou. Uma leitura apaixonante.

[RESENHA #682] O pior dia na história de Wall Street, de Diana B. Henriques


APRESENTAÇÃO

Apelidado de “Segunda-Feira Negra”, o dia 19 de outubro de 1987 foi de longe o pior da história de Wall Street. O índice Dow Jones, um dos principais indicadores do mercado financeiro dos Estados Unidos, caiu chocantes 22,6%, declínio percentual quase duas vezes maior que o do pior dia da crise de 1929. Nem mesmo os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, o crash de 2008 e a decretação da pandemia de Covid-19 em 2020 causaram baque tão grande nos índices da Bolsa de Valores norte-americana em um único dia.


Os especialistas não são unânimes quanto ao motivo que levou à desvalorização tão brusca, mas concordam que novos protagonistas, como o uso de ferramentas computadorizadas nas negociações financeiras e o comportamento de manada, deram origem a um novo tipo de crise, que ainda ameaça a sobrevivência do mercado financeiro como o conhecemos hoje.

Partindo de extensa pesquisa e dezenas de entrevistas exclusivas, Diana B. Henriques conta uma história de oportunidades perdidas, ilusões de mercado e ações destrutivas que envolveu desde um escândalo na cotação da prata em 1980 até o papel das agências reguladoras de Washington, passando pela rivalidade entre as bolsas de Chicago e Nova York. Com o desenrolar dos acontecimentos, não foi possível evitar o iminente colapso do mercado, mesmo após heróis inesperados se colocarem na linha de frente para evitar desastre ainda maior.


Mais de trinta anos se passaram e investidores, reguladores e banqueiros parecem ignorar as lições de 1987, mesmo quando os sinais se repetiram de forma assombrosa, como na crise financeira de 2008. O pior dia da história de Wall Street apresenta esse episódio como uma forma não só de analisar os erros do passado, mas de alertar para a repetição deles.


RESENHA

O pior dia na história de Wall Street é um livro essencial para qualquer pessoa interessada em compreender as causas e consequências da crise financeira de 1987. A autora, Diana B. Henriques, é uma jornalista financeira premiada que oferece uma narrativa abrangente e informativa do evento.


O livro começa com uma descrição da segunda-feira Negra, o dia em que o Dow Jones caiu 22,6%, o maior declínio de um dia na história de Wall Street. Henriques então traça o caminho que levou a este evento, examinando as várias crises menores que o antecederam.


Ela mostra que a segunda-feira Negra foi o resultado de uma confluência de fatores, incluindo:


1. A desregulamentação do mercado financeiro na era Reagan, que levou a rápidas inovações financeiras com consequências imprevistas.


2. A adoção de novas tecnologias de negociação, que permitiram que as transações fossem executadas mais rapidamente e com menos supervisão.


3. O aumento da dominância dos investidores institucionais, que tomaram decisões baseadas em modelos matemáticos complexos.


Henriques também examina a resposta do governo e dos reguladores à crise. Ela argumenta que as autoridades foram lentas e ineficientes em sua resposta, e que as medidas que tomaram foram insuficientes para prevenir um colapso ainda maior.


O livro é escrito em um estilo claro e acessível. Henriques usa uma linguagem simples para explicar conceitos complexos, e ela evita jargões financeiros. Ela também fornece um contexto histórico valioso para a crise, mostrando como ela se relaciona com eventos anteriores e posteriores.


O pior dia da história de Wall Street é um livro importante que oferece uma visão perspicaz sobre uma das crises financeiras mais significativas da história. É uma leitura obrigatória para qualquer pessoa que deseja entender as causas e consequências deste evento e aprender com os erros do passado.


O livro é um trabalho de pesquisa abrangente e bem escrito que oferece uma compreensão profunda da crise financeira de 1987. Henriques fornece uma visão equilibrada dos eventos, examinando as causas e consequências da crise de uma perspectiva histórica. O livro é uma leitura essencial para qualquer pessoa interessada em compreender este evento importante.


O livro é um lembrete de que as crises financeiras são eventos complexos que podem ser causados por uma variedade de fatores. Ele destaca a importância da regulamentação do mercado financeiro para prevenir crises futuras. Ele também fornece uma visão perspicaz sobre a natureza dos mercados financeiros e a maneira como eles podem ser vulneráveis ​​às crises.


A pesquisadora publicou um estudo abrangente sobre um período crítico de 20 anos na história da indústria financeira. Ela argumenta que uma mudança fundamental ocorreu nesse período, com os mercados passando de um sistema voltado para os investidores individuais para um dominado por corporações gigantes. Essas corporações negociavam por conta própria, usando algoritmos de computador complexos e processadores de alta velocidade.


O estudo também fornece um relato detalhado das semanas que se seguiram ao crash de 1987. Henriques descreve as diferentes reações dos participantes do mercado, incluindo o choque, a negação e o pânico. Ela também destaca a importância da “rede de confiança, coragem e improvisação” que ajudou a evitar um colapso ainda maior.


A pesquisa de Henriques é um estudo importante sobre a evolução dos mercados financeiros. Ela fornece uma análise perspicaz das forças que levaram ao crash de 1987 e à crise financeira de 2007-8.

[RESENHA #681] Meditações, de Marco Aurélio

APRESENTAÇÃO

Conjunto de doze livros escritos originalmente em grego entre os anos 170 e 180, trata-se de diários repletos de anotações, aforismos, citações célebres e reflexões pessoais de um homem preocupado em encontrar a maneira mais correta de viver em sociedade e de acordo com a própria consciência.

O estoicismo, escola filosófica que Marco Aurélio integrava, preconiza a felicidade principalmente por meio do autocontrole e do autoexame ― faculdades que estão ao alcance de todos nós. A paz interior e o bem comum são possíveis mesmo diante das adversidaes, mas, para tal, é preciso equilíbrio, humildade e serenidade ― virtudes que podem ser conquistas pelo exercício da razão, a capacidade humana mais incrível de todas.

Seja no século 2 ou no 21, o mundo sempre apresentou desafios, guerras, discórdia, traições e corrupção de valores. Alguns indivíduos, no entanto, lutam bravamente para o aprimoramento do espírito, e o imperador-filósofo Marco Aurélio está nesse ilustre rol.

Meditações é um guia prático e filosófico para aqueles que desejam encontrar a felicidade e a paz interior, o bom convívio social e um mundo mais justo e harmonioso. Esta edição da Paz & Terra conta com prefácio inédito do historiador, professor e um dos maiores intelectuais brasilieros da atualidade, Leandro Karnal.

Uma aventura através de um clássico e em prol do bem viver.

RESENHA

Lúcio Aurélio Antonino Maximiliano, em latim Lucius Aurelius Antoninus Maximilianus, nasceu em 26 de abril de 121 e faleceu em 17 de março de 180, tendo sido imperador de Roma de 161 a 180. Foi um dos governantes de Roma conhecidos como os cinco notáveis imperadores e o último imperador da Pax Romana.

O período de governo de Lúcio Aurélio foi marcado por conflitos militares. No Oriente, o Império Romano enfrentou com sucesso um Império Parta revitalizado e o Reino insubordinado da Armênia. Lúcio derrotou os Marcomanos, Quados e Sármatas nas Guerras Marcomânicas; no entanto, esses e outros povos germânicos passaram a representar uma ameaça preocupante para o Império. Acredita-se que a perseguição aos seguidores do cristianismo no Império Romano tenha aumentado durante seu reinado. A Peste Antonina irrompeu em 165 ou 166 e causou uma devastação na população do Império Romano, resultando na morte de cinco milhões de pessoas.

Reflexões foi escrito em grego Koiné, intitulado Τὰ εἰς ἑαυτόν, literalmente "coisas para mim mesmo", é uma série de 12 volumes em que Lúcio Aurélio registra suas anotações pessoais sobre o estoicismo como fonte de orientação e autodesenvolvimento. Lúcio Aurélio enfrentava desafios, conspirações e obstáculos durante o dia, e à noite se entregava a uma profunda reflexão e registrava suas anotações pessoais antes de dormir.

O estilo de escrita que permeia o texto é simplificado, direto e reflete a perspectiva estoica de Lúcio, que não se considerava parte da realeza, mas sim um homem entre outros homens, permitindo ao leitor se relacionar com sua sabedoria.

Um tema central das reflexões é a importância de analisar o julgamento de si mesmo e dos outros em uma perspectiva cósmica. A aceitação da morte e a discussão sobre a existência ou não de uma divindade são temas recorrentes em todo o livro.

É relevante explicar o termo "daemon", amplamente utilizado ao longo do texto. Daemon (em grego δαίμων) pode ser traduzido como “divindade” ou “espírito”. O termo em latim é daemon, que deu origem à palavra em português “demônio”.

Algumas das citações mais marcantes da obra:

1. Do meu avô Verus [aprendi] bons costumes e a controlar o meu temperamento.

3. Com minha mãe, aprendi a devoção aos deuses, a generosidade e a abstinência, não apenas de más ações como também de maus pensamentos, além do estilo de vida simples, muito distante do excesso dos ricos.

10. Com Alexandre, o Gramático, a abster-me de encontrar defeitos e não repreender aqueles que proferiram barbarismos, solecismos ou expressões estranhas, mas introduzir de modo hábil na minha reposta ou confirmação a expressão que deveria ter sido empregada, ou propor alguma outra sugestão adequada, ou ainda investigar a coisa em si e não a palavra.

13. Com Catulo, a não ser indiferente quando um amigo faz críticas, mesmo quando essas são infundadas, mas a tentar fazer com que ele recupere sua disposição habitual. E a estar pronto para falar bem dos professores, como faziam Domício e Atenodoto, e a amar meus filhos com sinceridade.

4. [parte 2] lembra-te de quanto tempo adiaste tais coisas e quantas vezes recebeste uma oportunidade dos deuses, e ainda assim não a usaste. Deve perceber finalmente de que universo fazes parte e de que administrador universal tua existência fluiu. Um tempo limitado foi designado para ti. Se não fizeres uso dele para dissipar as nuvens de tua mente, ele passará, tu partirás, e não haverá uma segunda chance.

15. [parte 2] ''Lembra-te de que tudo é opinião'' é manifesto esse dito cínico Mônimo. É manifesta é também utilidade do que foi dito, desde que se compreenda o cerne daquilo o que foi dito.

2. [parte 4] Que nenhum ato seja feito sem propósito, nem de outro modo que não seja de acordo com os princípios perfeitos da arte.

17. [parte 4] Não ajas como se fosse viver dez mil anos. A morte paira sobre ti. Enquanto viveres, enquanto estiver em teu poder, sê bom.

27. [parte 4] Seja o universo bem-organizado ou um amontoado de caos, ele permanece sendo o universo. Mas seria possível haver determinada ordem em ti e a desordem no Todo. E sendo tudo de tal forma separado, difuso, simpático?

O AUTOR

Marco Aurélio Antonino Augusto (121, Roma/Itália – 180, Vindobona/Aústrai) foi um imperador romano, filósofo e escritor, sendo último grande expoente do estoicismo. Seu único livro, Meditações, foi escrito como um diário de autoaperfeiçoamento, e não se sabe se havia intenção de torná-lo público. Marco Aurélio é considerado no Ocidente um dos “Cinco Bons Imperadores”, símbolo magno da Era de Ouro do Império Romano. Após a sua morte, Roma mergulhou rapidamente em declínio.

[RESENHA #680] Até a última gota, de Danilo Brandão

APRESENTAÇÃO

Até a última gota é um livro-performance. As quatro narrativas que compõem a coletânea se encontram no conflito entre os dramas pessoais de seus protagonistas e os problemas que estão na ordem do dia da sociedade. Temas como desigualdade social, crise dos refugiados, machismo e transfobia se cruzam com questões intimistas como o luto, desejo e rancor. Portanto, aqui, o leitor encontrará mais do que apenas boas histórias.

Ele(a) vai encontrar estruturas inteligentes que desafiam visões bidimensionais do mundo. São narrativas densas, por vezes delirantes e vertiginosas, que buscam capturar o caos de uma sociedade sempre a ponto de explodir. Afinal, como se acalmar em um mundo com tantos temas urgentes? Um bom ponto de partida pode estar na leitura dessas histórias.

RESENHA

Até a última gota é um livro de ficção escrito pelo autor e jornalista brasileiro Danilo Brandão. O livro possui como foco uma narrativa contemporânea que visa trazer de forma clara as nuances descritas na prosa atual, apresentando uma narrativa lúdica acerca das vivências cotidianas de seus personagens centrais. As histórias abordam temas diversos e alternam entre as problemáticas e a frequência dos fatos que se tornaram comuns no Brasil nos últimos anos: machismo, transfobia, medo, insegurança e oportunismo. A prosa criada pelo autor é repleta de bom gosto, com intercalações pontuadas e classificações que nos lembram José Saramago - embora, mesmo assim, não negue a influência de outros autores - transformando o enredo em uma verdadeira via de mão dupla ao narrar os acontecimentos de forma crua e lúdica.

A obra se desdobra entre passado, presente e futuro, narrando com deslocamento de frases e contexto, o que requer uma leitura mais atenta do leitor que pode facilmente se perder da narrativa, uma vez que a escrita utiliza um recurso próprio de amostragem de acontecimentos, transmitindo através das pontuações (ou da ausência delas) os sentimentos de euforia dos personagens, criando uma atmosfera de vislumbre entre as críticas aguçadas e introspectivas em seus enredos.

O primeiro conto narra a vida de um repórter que carrega o fardo de sua mãe e decide realizar uma visita até a cidade de Roraima para cobrir uma matéria no jornal local sobre uma série de pessoas em situação de desabrigo, deixadas à própria sorte na rodoviária central da cidade.

O segundo conto, homônimo ao título da obra, conta a história de um personagem trans que reflete sobre questões sociais do livro “Ilíada” enquanto transita nas linhas de um metrô. Durante o percurso, o personagem encontra uma figura conhecida de seu destino e a partir daí, inicia-se uma série de reflexões sobre vida, preconceito, masculinidade tóxica e abandono parental.

O terceiro conto narra a história de um porteiro de uma clínica de reabilitação para viciados em drogas. A narrativa faz críticas severas ao apoio e assistência recebidos pelos internos, assim como ao oportunismo empregado pelos colaboradores do local, que, em sua essência, abusam continuamente dos residentes. Há vários pontos interessantes neste conto, a maioria deles ligados ao abandono familiar das vítimas dos vícios, bem como aos pensamentos e preconceitos enraizados na busca pela ressocialização. É claro que a obra aborda outras nuances críticas sociais, mas as mais evidentes estão relacionadas à internação e às problemáticas decorrentes de um local tomado pelo caos e abandono.

Em síntese, a obra do autor Danilo Brandão nos convida a refletir acerca do existencialismo e da pluralidade de acontecimentos que não são enxergados no Brasil. Histórias de abandono, ausência de oportunidades, vícios, transsexualidades, medo e inseguranças são pautas frequentes elaboradas pelo autor. Um livro contemporâneo carregado de energias críticas e simbólicas do retrato do Brasil que só se é enxergado por quem possui olhos atentos para a sociedade.

[RESENHA #679] Acorrentada pela mente, de Claudia Carvalho

APRESENTAÇÃO

Ser filha de uma portadora de doença psiquiátrica, além de não ser bom, traz muito sofrimento. Não é bom, porque você não pode contar com a mãe em nenhum momento, pois ela quem precisa de ajuda. Traz sofrimento, além de sensação de abandono, rejeição e, como se não bastasse, ainda tem o preconceito em todo lugar que você passa. Preciso destacar que os rótulos que recebi foram duros de aguentar, como: Aquela ali é a filha da doida; Claudia tem duas caras; Nossa, que gênio difícil a Claudia tem!; Será que ela é doida igual à mãe dela?

Sentia-me diferente o tempo todo e ficava com muito medo de ter herdado o transtorno afetivo bipolar que ela tinha. Minha mãe biológica não está mais entre nós, ela se foi aos 58 anos de idade e eu sinto muito, porque só agora percebo a dimensão do peso que ela carregava nos ombros. 

Espero profundamente que essa obra literária desperte pessoas que ainda não se atentaram para esse e outros transtornos que dificultam a vida, como, manter um relacionamento, permanecer num emprego, preservar amizades. Hoje me trato com psiquiatra, hipnoterapia, medicamentos, meditação e, a melhor parte, aprendi a me amar e a cuidar daquela criança que ficou abandonada lá atrás. Garanto que este livro irá te surpreender! 

RESENHA

Acorrentada pela mente é um livro biográfico escrito pela autora e jornalista capixaba Cláudia Carvalho, lançado através do selo Voe da Editora Flyve. O livro apresenta como proposta a exposição dos acontecimentos na vida da autora em relação à doença mental da mãe.

Já no primeiro capítulo a autora aborda sobre como sua mãe quase a abortou enquanto ainda estava internada em um manicômio, apresentando quadros graves e diversas tentativas de acabar com a gestação. A introdução é realizada em poucas linhas, sem grandes detalhes ou proporções, com uma apresentação trabalhada com poucos detalhes e pouco foco, o que não fomentam maiores esclarecimentos acerca deste período.

A narrativa segue uma ordem não-linear abordando temáticas sobre um episódio em que sua mãe tentou jogá-la de uma ponte para se afogar em um rio próximo, um episódio de hepatite A causados pela contaminação (e talvez ingestão) de água poluída por na época morar próximo de um ribeirão, abusos sexuais sofridos por parentes, depressão na primeira gravidez, a fome e os problemas decorrentes da ausência de apoio, auxílio ou socorro, o pai desconhecido, os períodos difíceis com os apelidos que as pessoas lhe davam pela condição de sua mãe, dentre tantos outros.

Por mais que obras biográficas sejam em sua essência impactantes, acredito que, a autora descreveu sua história com pouco foco e trabalho. As histórias de desenlaçam na mesma proporção e rapidez com as quais se diluem, não há um trabalho introdutório de cada episódio em sua vida, tudo é jogado ao ar de forma desmedida e sem nenhum empenho descritivo acerca dos períodos, talvez, por ausência de lembranças, pela pouca idade durante os períodos difíceis em sua vida, pela infância tomada ou por qualquer ausência de esforço de pesquisa que fomentasse grandes debates e descrições dos acontecimentos.

Ainda que a doença da mãe seja o ponto principal da narrativa, a obra em si, fala basicamente sobre a vida da autora e do impacto da doença da mãe em sua vida. Ela descreve períodos difíceis para lidar com os acontecimentos, tornando assim, o acontecimento central secundário, uma vez que toda noção de dor e sofrimento da mãe é basicamente eliminada, não havendo assim, noção da filha em relação à dor da mãe, criando assim, uma teia de acontecimentos que sempre retornam ao ponto de loucura da mãe, colocando-a como vilã e causadora de todos os problemas, uma vez que, um problema mental a impedia de participar da vida da filha como noutros lares.

A descrição chave da obra não está nos capítulos, mas na descrição da obra, quando a autora cita: Ser filha de uma portadora de doença psiquiátrica, além de não ser bom, traz muito sofrimento. Não é bom, porque você não pode contar com a mãe em nenhum momento, pois ela quem precisa de ajuda. Traz sofrimento, além de sensação de abandono, rejeição e, como se não bastasse, ainda tem o preconceito em todo lugar que você passa.

O que podemos perceber é que não, a autora não herdou a doença da mãe, apenas se afundou profundamente em uma depressão tomada por lembranças horríveis de seus períodos com sua mãe e as dificuldades da vida, o que a fez buscar ajuda e auxílio para retomar sua vida.

Uma obra interessante para uma leitura rápida, mas há diversos pontos que necessitam de uma repaginação, talvez, numa segunda edição com mais afinco, detalhes e confissões mais descritivas.

A AUTORA

Claudia Carvalho, 49, reside atualmente em Piúma, litoral sul do ES; é mãe de dois filhos, graduada em Letras/Língua Portuguesa-Literatura, amante da natureza, dos livros e apaixonada por uma boa conversa entre familiares e amigos.  Filha primogênita, criada por sua avó materna, em Guaçuí, sul do ES, devido sua mãe biológica apresentar, ainda na gestação, problemas psiquiátricos graves, Claudia teve uma infância e adolescência não muito fáceis. Filha de um pai desconhecido, fato que a incomodava muito na juventude e vida adulta também. Tudo sempre foi muito difícil de compreender. Mudanças constantes no humor, que a levavam ao fundo do poço e a traziam à superfície em longos ou curtos espaços de tempo.  Neste livro a autora fala sobre os momentos mais difíceis que marcaram sua alma. Aqui, nestas linhas, talvez você, leitor(a), se identifique com alguma situação e passe a se ajudar ou ajudar alguém que conheça com uma história parecida.   

[RESENHA #678] Sociologia da educação, de Nelson Piletti


O que a Sociologia tem a ver com a educação escolar? Muito! Pois a escola não está isolada em relação à comunidade e à sociedade em que está inserida. A escola é, até certo ponto, reflexo das condições e das exigências estabelecidas pela sociedade, em seu sentido mais amplo, e pela comunidade, no mais restrito. Por outro lado, no interior da escola, multiplicam-se os grupos sociais, formados por todos os agentes do processo educacional, que têm enorme influência sobre a educação e o comportamento dos alunos. Com linguagem acessível, Nelson Piletti estimula neste livro a reflexão sobre esse entrecruzamento de relações que se estabelece entre a sala de aula, a escola, a comunidade e a sociedade. O autor apresenta a contribuição da Sociologia da Educação por meio de dois aspectos: o teórico, de conhecimento da realidade educacional, e o prático, de mudança para melhor dessa mesma realidade a partir desse conhecimento. Além disso, no final de cada capítulo, traz textos complementares e questionamentos que se constituem em estímulo à pesquisa, à reflexão e à discussão.

RESENHA


Em sociologia da educação, o professor e autor Nelson Piletti estuda a importância de compreensão do círculo social em sala de aula para uma compreensão mais assertiva acerca da sociedade, como instrumento de fomento dos fenômenos na aprendizagem em detrimento das particularidades de cada aluno.

A obra desvencilha em seus capítulos a importância de se conhecer e estudar os reflexos particulares dos efeitos da sociedade e das comunidades na vida do aluno. Para tal, o professor fornece ferramentas acessíveis de estudo que viabilizem concisamente a interpretação dos sinais do aluno em suas dificuldades latentes em sala de aula, para que assim, torne-se, de forma facilitada, a compreensão real das problemáticas que refletem significativamente no desempenho do aluno nos processos de aprendizagem. O autor também estuda como se dá o processo de organização e hierarquização da sala de aula entre professor e aluno, criando, assim, discussões acaloradas do papel do profissional da educação no centro do seio do ensino em sala de aula.

Para que se torne facilitada a compreensão das realidades, o livro também carrega em si um capítulo dedicado a suprimir o isolamento do aluno, criando assim, um ambiente de cooperação entre alunos e o professor, para que assim, todos possam se inteirar e participar concisamente na aprendizagem do conteúdo por meio da participação mútua, isso pode ser elaborado de forma categórica mediante trabalhos de grupo ou numa simples disposição das cadeiras em sala de aula para uma maior participação e controle do aprendizado por meio da figura do profissional ao centro da sala, que assim, controla de forma mais assertiva a participação de todos os envolvidos em seu campo de visão.

Em síntese, a obra fornece detalhes e estudos que fomentam uma participação maior do professor, não apenas na ministração da aula propriamente referida, mas também na participação e observação dos fenômenos sociais em sala de aula e das diferentes visões e realidades presentes no seio escolar.

O estudo de sociedades com culturas diferentes desempenha um papel importante na análise sociológica. Ao compreendermos como diferentes culturas se reproduzem e educam seus indivíduos, podemos obter uma visão mais abrangente dos processos estruturais que compõem a educação na totalidade. A sociologia da educação é uma extensão da sociologia que se dedica a estudar a realidade socioeducativa, permitindo aos pesquisadores compreender que a educação ocorre no contexto da sociedade, e não apenas na sala de aula. Isso caracteriza a relação entre ser humano, sociedade e educação, explorando diferentes teorias sociológicas.

A sociologia da educação teve suas bases estabelecidas por pensadores como Marx e Engels, que discutiram o surgimento dessa disciplina em capítulos específicos de suas obras. Eles relacionaram a educação à produção, analisando as sociedades de sua época. Suas concepções surgiram durante a Revolução Industrial, quando propuseram a ideia de uma educação politécnica, que combinava a instituição escolar com o trabalho produtivo. Eles acreditavam que essa relação poderia ser um poderoso meio de transformação social.

O AUTOR
Nelson Piletti é graduado em Filosofia, Jornalismo e Pedagogia; mestre, doutor e livre-docente em Educação pela Universidade de São Paulo (USP); ex-professor do ensino fundamental e médio; ex-professor de Sociologia do ensino médio e superior; professor aposentado do Departamento de Filosofia da Educação e Ciências da Educação da Faculdade de Educação da USP. Pela Contexto, é autor do livro Aprendizagem: teoria e prática, além de coautor de O Brasil no Contexto 1987-2017; Dom Helder Camara: o profeta da paz; Psicologia do desenvolvimento; Psicologia da aprendizagem; História da educação; Principais correntes da Sociologia da educação e Sociologia da educação: da sala de aula aos conceitos gerais.

[RESENHA #678] Fumo, de Juliano Costa

APRESENTAÇÃO

Fumo é o diário de alguém que tenta parar de fumar, mas acaba gostando tanto de escrever sobre cigarro que passa a questionar sua decisão. Ao longo das páginas e dos dias, a dúvida que surge é: escrever para parar de fumar ou fumar para continuar escrevendo?

RESENHA

Fumo, de Juliano Costa, é um emaranhado poético descritivo acerca do uso do cigarro. Assim como aconteceria com qualquer outro, aconteceu com o autor. O livro é parte da iniciativa do em parar de fumar enquanto registrava seu progresso em um diário, porém, ao iniciar seu processo, o autor interessou-se demasiadamente pela força da escrita, do que pelo dito exercício do cessar do cigarro, o que ocasionou em reflexões acerca da real necessidade de se parar. Assim surgiu este livro. O autor narra em diversas histórias uma série de acontecimentos que se casam com o uso do cigarro, suas nuances transitam entre amizade, trabalho e cotidiano e são carregadas de um sentimentalismo extremamente forte e exagerado acerca da vida, o que torna a leitura muito mais palpável e interessante do que se espera, e isso é uma poderosa armadilha para nos fazer cativar por sua escrita.

Publicado pela editora Patuá, a obra possui uma característica única que é parte crucial da narrativa: ela é crua. Já no primeiro conto, intitulado não me abandone jamais, o autor faz alusão do corpo a um barco de luxo. Assim como em um barco, onde as tarefas são cautelosamente distribuídas, e cada qual ultrapassa seus limites cientes das consequências, assim é o vício com o cigarro. O autor conta que sua jornada em busca de por fim ao vício durou 28 dias, e que agora, seria para valer. Suas metáforas acasalam-se perfeitamente com a noção de poder que o cigarro tem sob a vida e visão das pessoas em suas participações sociais.

Já o sexto conto consta com uma forte referência ao filme Harry Potter (a pedra filosofal), o autor descreve em detalhes as primeiras cenas, onde, o professor Dumbledore com sua varinha (aqui, isqueiro) suga na primeira cena todas as luzes dos postes, enquanto se aproxima dele uma senhora que logo se transforma de um gato para sua real figura (Sra. Mcgonagall), seguido do surgimento de uma moto que aterriza sob o asfalto (Hagrid). Seguindo:

[...] Dessa vez, minha mãe interceptou a correspondência e deu fim nela. No dia seguinte, dezenas de corujas pairavam sobre a minha casa, jogando os envelopes por toda a construção. [...] a partir desse momento tudo fez sentido e eu soube o que sempre fui aquilo o que me tornara: um fumante.

No dia 11, o autor descreve o retorno para casa de uma peça de teatro de Mel Lisboa, o autor descreve que, em um ponto de ônibus, encontrou-se com uma mulher que tirou do bolso um maço de malboro vermelho e o colocou na boca para fumar despreocupadamente pensando em absolutamente nada, com a mente vaga. Aquela cena faz o autor pensar em como sua vida estava triste e vazia, comparando aquele momento com um buraco na minha alma (p. 52).

O livro segue uma linha tênue de descrições cotidianas, sempre intercalando sua luta com o cigarro e as reflexões do autor, algo extremamente inusitado em termos de literatura, ainda que o tópico não seja novo, podemos notar que há sempre algo de inovador em cada linha, o autor transfere uma carga reflexiva e emocional forte para suas histórias breves, que poderiam, sem nenhuma dúvida, render cada uma um livro único. A atmosfera criada pelo autor é altamente penetrante e única, o que torna a leitura cada vez mais prazerosa e enriquecedora.

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