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O surgimento da filosofia

A filosofia surgiu na Grécia antiga, precisamente no início do século VI a.C., marcando o início de uma nova era de pensamento. Tales de Mileto é frequentemente reconhecido como o primeiro filósofo. No entanto, foi Pitágoras quem cunhou o termo "filosofia", uma junção de "philos" (amor) e "sophia" (conhecimento), que significa "amor ao conhecimento".

A partir desse período, a filosofia se dedicou a compreender, identificar e comunicar a realidade através de conceitos lógico-racionais. Esse novo modo de pensar emergiu à medida que os gregos começaram a se afastar das explicações mitológicas, um processo conhecido como desmitificação, em busca de um conhecimento mais seguro e fundamentado.

Na consciência mítica, as explicações sobre o mundo eram fornecidas pelas histórias mitológicas, particularmente no contexto da mitologia grega, que era politeísta e repleta de deuses, titãs e outros seres. Essas entidades eram responsáveis por criar e dar sentido ao universo. As histórias tinham um caráter fantasioso e fabuloso, cheias de imagens vívidas, e eram transmitidas oralmente por poetas-rapsodos.

Por muito tempo, essas narrativas mitológicas foram a principal forma de explicar a cultura grega e a origem de todas as coisas. Naquela época, não havia distinção clara entre religião e outras esferas da vida; todos os aspectos da existência humana estavam associados aos deuses e divindades que governavam o universo.

Entretanto, ao longo do tempo, essa mentalidade começou a mudar. Uma série de fatores fez com que algumas pessoas na Grécia antiga começassem a questionar essas explicações mitológicas e a procurar novas formas de entendimento. Esse movimento de relativização do conhecimento tradicional levou à necessidade de encontrar explicações cada vez mais refinadas e convincentes para todos os fenômenos.

Esse processo de transição resultou na substituição da crença cega pela argumentação racional. A habilidade de convencer e fornecer explicações fundamentadas na razão, conhecida como lógos, ganhou importância. O lógos, que representa a fala objetiva, clara e ordenada, tornou-se o método preferido de investigação e explicação.

Assim, o pensamento grego gradualmente deixou de lado a consciência mítica, que dependia de crenças religiosas e explicações mitológicas, e assumiu a consciência filosófica, que valoriza o que faz sentido logicamente, o que pode ser explicado racionalmente pelo ser humano. Esta mudança marcou o nascimento da filosofia como uma disciplina dedicada ao amor ao conhecimento e à busca incansável pela verdade.

O surgimento da filosofia na história

A sociedade grega antiga alcançou um patamar de desenvolvimento significativo em diferentes áreas, principalmente devido à sua localização geográfica e à sua capacidade de comércio e navegação. Este crescimento teve implicações profundas não apenas na economia, mas também na cultura, na política e na filosofia, moldando o pensamento ocidental de maneiras duradouras.

O comércio e as navegações permitiram aos gregos estabelecer contatos com várias culturas ao redor do mar Mediterrâneo. Essa constante interação com outras civilizações trouxe uma riqueza cultural que desafiou os gregos a refletirem sobre suas próprias crenças e práticas. A relativização das culturas alheias contribuiu para uma visão mais crítica e diversificada da própria cultura grega. A exposição a diferentes formas de vida e sistemas de pensamento incentivou uma mentalidade mais aberta e analítica, permitindo que os gregos comparassem e contrastassem suas tradições com as de outras sociedades.

O surgimento da escrita alfabética foi uma revolução técnica que facilitou a troca de ideias e conhecimentos de maneira mais precisa e ampla do que os sistemas anteriores baseados em ideogramas. A escrita alfabética exigia um nível mais alto de abstração, pois reconhecia que as palavras eram compostas por sons que poderiam ser codificados e reproduzidos. Este avanço não só simplificou a comunicação, mas também permitiu um desenvolvimento mais sofisticado do pensamento abstrato e da filosofia, marcando o início de uma era em que o mito começou a ser substituído pelo logos, ou razão.

A introdução da moeda também reforçou a abstração e a racionalização nas transações comerciais. Diferente do escambo direto, onde os bens eram trocados de maneira direta e tangível, a moeda exigia a compreensão do valor abstrato. Isto simbolizou uma transição para uma economia mais complexa e eficiente, facilitando o comércio em grande escala e contribuindo para a prosperidade econômica das cidades-estado gregas.

A invenção do calendário foi outra realização marcante, permitindo uma organização sistemática do tempo. O calendário introduziu uma medida regular dos eventos naturais, como as estações, tirando a responsabilidade do clima e dos ciclos de plantio e colheita das mãos dos deuses e colocando-os nas mãos dos matemáticos e astrônomos. Este passo foi crucial na humanização e intelectualização da compreensão do mundo, fomentando uma visão mais científica e menos supersticiosa da realidade.

Com o desenvolvimento das pólis, ou cidades-estado, houve uma intensificação da vida pública e a emergência da política como um aspecto central da vida grega. A pólis era mais do que um espaço físico; era um espaço social onde os cidadãos discutiam, debatiam e tomavam decisões sobre o bem comum. Este aumento na participação cívica fez com que as relações com os deuses se relegassem a um papel secundário, dando lugar à lógica, ao debate racional e à necessidade de soluções práticas para os problemas cotidianos.

Finalmente, o surgimento da razão como um princípio orientador da vida e do pensamento grego marcou uma profunda transição cultural. Os gregos passaram a valorizar o ócio contemplativo, onde pensadores dedicavam-se a entender a natureza e suas leis através da observação e da lógica. A busca por explicações racionais e por uma compreensão ordenada do universo contribuiu para o desenvolvimento da filosofia, da ciência e das artes, consolidando os princípios de causalidade e ordenação que guiaram o pensamento ocidental por séculos.

A sociedade grega antiga, através de suas inovações e evolução, estabeleceu bases sólidas para o desenvolvimento da civilização ocidental. Estes avanços não só influenciaram o modo de vida e o pensamento dos gregos, mas também deixaram um legado duradouro que continua a impactar profundamente a cultura, a política e a ciência modernas.

Aristóteles: Biografia e vida


Aristóteles, um dos mais influentes filósofos gregos, nasceu em 384 a.C. na cidade de Estagira, na Macedônia. Aos 17 anos, ele se mudou para Atenas, onde ingressou na Academia de Platão, um dos centros de aprendizado mais prestigiados da época. Devido à sua origem, Aristóteles é frequentemente chamado de "o Estagirita".

Filho de uma família aristocrática, Aristóteles sempre impressionou seus contemporâneos com seu comportamento refinado e sua inteligência aguda. Sua dedicação aos estudos logo chamou a atenção de Platão, que o considerava um discípulo notável. Platão até fez uma analogia entre a Academia e uma entidade composta por um "corpo" e um "cérebro", no qual Aristóteles representaria o "cérebro" da instituição.

Aristóteles permaneceu na Academia até a morte de Platão em 347 a.C. Esperava-se que ele fosse o sucessor natural de Platão, dada sua proximidade e contribuição significativa ao pensamento platônico. Contudo, para a surpresa de muitos, foi um ateniense de nascimento que acabou assumindo a liderança da Academia, provavelmente devido a questões de cidadania e políticas internas da cidade de Atenas.

Após ser preterido para a direção da Academia, Aristóteles deixou Atenas e passou a viajar, eventualmente tornando-se tutor de Alexandre, o Grande. Esta associação influenciou significativamente o desenvolvimento de Alexandre e ajudou a difundir as ideias filosóficas de Aristóteles por diversas partes do mundo conquistado por Alexandre.

Em suas obras, Aristóteles abordou uma vasta gama de tópicos, incluindo política, ética, e moral, entre outros campos do conhecimento. Ele é amplamente reconhecido por ter sistematizado diversos ramos da filosofia, dando origem à chamada "fase sistemática" da filosofia grega. Essa fase é caracterizada por uma abordagem organizadora e abrangente de questões filosóficas, na tentativa de criar um corpo coerente e unificado de conhecimento.

A vida e o trabalho de Aristóteles tiveram um impacto duradouro na filosofia ocidental. Seus escritos não só influenciaram pensadores contemporâneos, mas também moldaram o desenvolvimento da filosofia e da ciência durante muitos séculos após sua morte. Ele deixou um legado que continua a ser estudado e admirado até os dias atuais.

Naquela época, Aristóteles estava profundamente envolvido em diversas atividades que transformariam para sempre o mundo do conhecimento e da filosofia. Sua mudança para Atarneus, após deixar Atenas, foi marcada pela colaboração com Hermias, um antigo colega e filósofo político que governava a região. A relação entre ambos se estreitou não apenas pelo ambiente intelectual, mas também pelo fato de Aristóteles ter se casado com Pítia, a filha adotiva de Hermias.

Porém, a estabilidade em Atarneus foi interrompida de maneira trágica. A invasão dos persas, que resultou na morte de Hermias, deixou Aristóteles novamente sem um lar e sem o ambiente propício para suas investigações filosóficas.

Em 343 a.C., sua vida tomou um novo rumo ao ser convidado por Filipe II da Macedônia para ser o preceptor de seu filho, Alexandre. Filipe ansiava que Alexandre se tornasse um líder não apenas forte, mas também sábio e filosófico. Assim, Aristóteles aceitou o convite e passou quatro anos na corte da Macedônia. Esse período foi crucial não só para a educação de Alexandre, que viria a ser chamado de Alexandre o Grande, mas também para que Aristóteles prosseguisse com suas pesquisas e desenvolvimentos teóricos em diversas áreas do saber.

Após a missão como tutor, Aristóteles retornou a Atenas em 335 a.C., onde tomou a decisão de fundar sua própria escola, o Liceu. O nome foi inspirado na sua localização, um edifício dedicado ao deus Apolo Lício. No Liceu, Aristóteles não apenas oferecia cursos técnicos avançados a seus discípulos, mas também ensinava o público em geral. A instituição tornou-se um centro de estudos abrangente, contemplando disciplinas como geometria, física, química, botânica, astronomia e matemáticas. Esse modelo de ensino refletia a visão holística de Aristóteles sobre o conhecimento e seu desejo de compartilhar saberes com a sociedade.

Contudo, a sua permanência em Atenas foi novamente interrompida em 323 a.C., com a morte de Alexandre Magno. A Grécia, dominada pela Macedônia sob o reinado de Alexandre, entrou em um período de incerteza e mudanças políticas. Aristóteles foi então acusado de ter colaborado com o governo déspota de Alexandre, o que o levou a abandonar Atenas mais uma vez, evitando assim possíveis perseguições e garantindo sua segurança.

A trajetória de Aristóteles, marcada por suas contínuas mudanças de residência e seus encontros e desencontros com o poder político, foi fundamental para a expansão do conhecimento e da filosofia. Sua vida e obra deixaram um legado duradouro que continua a influenciar diversas áreas do saber até os dias atuais.

Sócrates: O pai da filosofia

Sócrates, nascido por volta de 470 a.C. e falecido em 399 a.C., é uma figura central na filosofia ocidental e é frequentemente considerado o "pai da filosofia". Embora não tenha sido o primeiro filósofo da história, seu pensamento e métodos inovadores marcaram profundamente a filosofia grega e, por extensão, a filosofia ocidental como um todo.

Nascido em Atenas, uma cidade que no século V a.C. se consolidava como um núcleo cultural e intelectual da Grécia Antiga, Sócrates teve uma origem humilde. Seu pai, Sofronisco, era um escultor, e sua mãe, Fenarete, atuava como parteira. Essa combinação de influências familiares proporcionou a Sócrates um ponto de vista único sobre a vida e a filosofia. Inspirado pelo trabalho de sua mãe, ele desenvolveu a metodologia do "parto das ideias", onde ajudava seus interlocutores a "darem à luz" suas próprias verdades através do diálogo e da introspecção.

Sua aparência física e seus costumes eram, no mínimo, singulares. Descrito como corpulento, de olhos saltados, vestindo-se de maneira simples e frequentemente descalço, Sócrates se destacava tanto pela robustez de seu intelecto quanto pela peculiaridade de sua figura. Era capaz de ficar horas contemplando seus pensamentos, muitas vezes sozinho, mas também gostava de conversar e desafiar as convicções de seus discípulos e concidadãos.

Através dessas conversas, Sócrates introduziu uma nova era na filosofia grega, conhecida como a fase socrática ou antropológica. Diferente de seus predecessores pré-socráticos, que se preocupavam principalmente com a origem e a constituição do cosmos, Sócrates e seus contemporâneos voltaram-se para questões mais centradas no ser humano e na sociedade. Perguntas como "O que é a verdade?", "O que é o bem?" e "O que é a justiça?" começaram a dominar o discurso filosófico. Esse enfoque permitiu uma reflexão mais profunda sobre a natureza humana, ética e moral, influenciando não apenas a filosofia, mas também a política e a cultura ocidentais.

De fato, a importância de Sócrates reside tanto em seu método dialético quanto nas questões fundamentais que levantou. Através da maieutica, a arte de questionar e estimular o pensamento crítico, ele não apenas ensinava seus discípulos, mas também encorajava uma autêntica busca pela verdade. Sua influência se estende por milênios, moldando o pensamento de filósofos subsequentes e permanecendo relevante até os dias atuais.

Os ensinamentos de Sócrates

A filosofia de Sócrates é marcada pela busca das verdades universais, acreditando que existem princípios válidos para toda a humanidade, independentemente de tempo e espaço. Para ele, essas verdades não são apenas teóricas, mas acessíveis através da reflexão profunda e autoanálise. Esse processo começa com a famosa máxima "Conhece-te a ti mesmo", um recado de autoconsciência e humildade perante o conhecimento.

A partir dessa premissa, Sócrates desenvolve um método único de ensino e descoberta, conhecido como o Método Socrático. Utilizando o diálogo, ele leva seus interlocutores a reconhecerem sua própria ignorância, um processo inicial chamado de ironia ou refutação. Ao confrontar seus argumentos e crenças, ele visa desconstruir as certezas aparentes para abrir espaço a um entendimento mais profundo e autêntico.

Depois de desnudar essas falsas percepções, entra em cena a fase da maiêutica. Inspirado pelo papel de sua mãe, que era parteira, Sócrates emprega essa técnica para "trazer à luz" as verdades escondidas dentro de cada pessoa. Ele solicita exemplos concretos e examina-os atentamente para extrair a essência dos conceitos discutidos. Por exemplo, ao investigar o conceito de coragem com um general, ele não se contenta com descrições superficiais de atos heróicos, mas procura o que todos esses atos têm em comum.

Essa busca incansável pela essência das coisas revela a crença socrática de que a verdade está dentro do próprio indivíduo, mas obscurecida por preconceitos e falsas ideias. Derrubados esses obstáculos, torna-se possível alcançar o verdadeiro conhecimento, que Sócrates equipara à virtude. Para ele, o vício é resultado direto da ignorância e, portanto, ninguém faz o mal de forma consciente e voluntária.

Essa visão otimista sobre a possibilidade de alcançar o conhecimento verdadeiro e agir de forma moral se contrapõe radicalmente aos sofistas, que acreditavam ser a verdade relativa e manipulável conforme as conveniências. Sócrates, ao contrário, vê a busca pela verdade como um caminho para a virtude e um imperativo moral. Essa crença em um conhecimento universal e intrínseco ao ser humano coloca Sócrates numa posição distinta e mais idealista dentro da tradição filosófica ocidental.

Morte

Sócrates, uma figura central na Atenas antiga, era conhecido por seu distinto método de ensino e filosofia, que atraía uma legião de jovens seguidores. Ele difundia suas ideias por intermédio de diálogos públicos, nos quais desafiava e interrogava incessantemente seus interlocutores. Seu método, a maiêutica, envolvia uma série de perguntas que levava as pessoas a refletirem profundamente sobre suas crenças e valores, muitas vezes expondo a fragilidade dos mesmos.

As constantes indagações de Sócrates resultavam frequentemente em embaraço para os cidadãos respeitados da polis, pois ele conseguia revelar a falta de sabedoria daqueles que se julgavam sábios. Esse comportamento o levou a acumular vários inimigos entre os poderosos e influentes de Atenas, que viam suas ações como uma ameaça à ordem estabelecida. A percepção de que Sócrates corrompia a juventude, incentivando-os a questionar as tradições e os deuses, consolidou ainda mais sua posição como um elemento perturbador.

Essas tensões culminaram em um julgamento em que Sócrates enfrentou graves acusações de corromper a juventude e de desrespeitar os deuses da cidade. O procedimento judicial foi rigoroso e dividido em duas etapas. Na primeira parte, os jurados decidiram sobre sua culpabilidade. O resultado foi bastante apertado: 280 votos a favor de sua condenação contra 220. Sócrates, mesmo diante dessa condenação, manteve sua postura questionadora e sugeriu uma multa como pena alternativa, tentando mostrar que sua contribuição à cidade era valiosa e, quem sabe, suavizar sua sentença.

Porém, essa sugestão foi amplamente rejeitada pelos jurados, que, na segunda fase do julgamento, determinaram a pena capital com uma votação significativamente mais desfavorável ao filósofo: 360 votos a 141. Sócrates, diante dessa decisão, mostrou uma aceitação serena do veredito, enxergando a morte não como um fim trágico, mas como uma parte natural da vida. Sua despedida refletiu sua contínua busca pelo desconhecido e sua perspectiva filosófica sobre a existência. Com sua famosa declaração, ele transmitiu a ideia de que a morte não deve ser temida, pois o que realmente importa é a qualidade de vida que se leva e a contínua busca pela verdade.

A história de Sócrates não só ilustra as tensões entre o pensamento inovador e as tradições estabelecidas, mas também destaca o poder transformador da filosofia. O legado de Sócrates perdura, servindo como um eterno lembrete da importância do questionamento contínuo e da busca pela sabedoria. Sua vida e morte desafiaram seus contemporâneos e continuam a inspirar gerações subsequentes a valorizar a integridade intelectual e a coragem moral.

Jean-Jacques Rousseau: Vida e obra



Jean-Jacques Rousseau foi um filósofo, escritor e compositor genebrino cuja filosofia política influenciou o progresso da era do Iluminismo em toda a Europa. Ele também desempenhou um papel importante em aspectos da Revolução Francesa e contribuiu para o pensamento político, econômico e educacional moderno. 

As obras de Rousseau, incluindo seu discurso sobre a desigualdade e O Contrato Social, são fundamentais para o pensamento político e social moderno. Seu romance sentimental Julie ou a Nova Heloísa teve um papel importante no desenvolvimento do pré-romantismo e romantismo na ficção. O tratado educacional Emílio ou Sobre a Educação explorou o lugar do indivíduo na sociedade. As Confissões publicadas postumamente, que inauguraram a autobiografia moderna, bem como os Devaneios inacabados do Caminhante Solitário representam exemplos da "Era da Sensibilidade" caracterizada pelo foco crescente em subjetividade e introspecção presentes posteriormente nas escritas modernas.

Biografia

Rousseau nasceu na República de Genebra, que na época era uma cidade-estado protestante associada à Confederação Suíça (agora um cantão na Suíça). Desde 1536, Genebra era uma república huguenote e lar do calvinismo. Cinco gerações antes de Rousseau, o seu antepassado Didier – que pode ter publicado panfletos protestantes como livreiro – escapou à perseguição dos católicos franceses fugindo para Genebra em 1549, onde se tornou comerciante de vinhos.

Rousseau tinha orgulho de que sua família, pertencente à classe média (ou ordem média), tivesse o direito ao voto na cidade. Durante toda a sua vida, ele estudou seus livros como "Jean-Jacques Rousseau, Cidadão de Genebra". Em comparação com os imigrantes ("habitantes") e descendentes nativos ("nativos"), os cidadãos eram uma minoria da população.

Houve muito debate político em Genebra que envolveu também os comerciantes. A discussão centrou-se principalmente na ideia de soberania popular, que foi ridicularizada pela oligarquia de classe dominante. Em 1707, Pierre Fatio, um reformador democrático protestou contra esta situação e afirmou que “Um soberano que nunca realiza um ato de soberania é um ser imaginário”. No entanto, ele foi baleado por ordem do Pequeno Conselho. O pai de Jean-Jacques Rousseau, Isaac, não estava presente na cidade naquela época, mas seu avô apoiou Fatio e sofreu consequências por isso.

Isaac Rousseau, pai de Rousseau, seguiu os passos do avô, pai e irmãos trabalhando como relojoeiro. Ele também ensinou dança por um breve período. Apesar de ser artesão, Isaac era bem educado e adorava música. Na verdade, segundo os escritos de Rousseau “Um relojoeiro de Genebra é um homem que pode ser apresentado em qualquer lugar; um relojoeiro parisiense só serve para falar de relógios”. 

Isaac encontrou obstáculos políticos em 1699 ao se confrontar com oficiais ingleses visitantes, que desembainharam espadas e o ameaçaram. As autoridades locais interviram, porém Isaac acabou sendo punido porque Genebra estava preocupada em manter sua relação com potências estrangeiras. 


Suzanne Bernard Rousseau, mãe de Rousseau, era de uma família rica e foi criada por seu tio pregador calvinista Samuel Bernard depois que seu pai Jacques faleceu aos 30 anos devido a problemas legais decorrentes de adultério. Em 1695, Suzanne enfrentou acusações por se disfarçar de camponesa para assistir a uma apresentação de teatro de rua e ver M. Vincent Sarrasin, a quem ela amava apesar do casamento. O Consistório de Genebra ordenou que ela nunca mais interagisse com ele após a audiência que se seguiu. Ela se casou com o pai de Rousseau quando tinha 31 anos; oito anos antes, a irmã de Isaac havia se casado com o irmão de Suzanne antes de serem punidos pelo Consistório por cometerem transgressões sexuais que resultaram na morte de seu filho durante o parto. Para o jovem Rousseau, que cresceu mais tarde, ele ouviu uma história inventada sobre como o amor juvenil foi recusado por patriarcas desaprovadores, mas acabou prevalecendo, levando duas famílias a se unirem por meio de casamentos duplos realizados simultaneamente em um dia, permanecendo alheios ao que realmente aconteceu entre eles. muitas décadas atrás (Rousseaus).

Nascido em 28 de junho de 1712, Rousseau contou mais tarde: “Nasci quase morrendo; havia pouca esperança de me salvar”. Ele foi batizado na grande catedral em 4 de julho daquele ano. Sua mãe morreu de febre puerperal nove dias após seu nascimento, que mais tarde ele descreveu como "o primeiro dos meus infortúnios". 

Ele e seu irmão mais velho, François, foram criados por seu pai e sua tia paterna também chamada Suzanne. Quando tinha cinco anos de idade, o pai de Rousseau vendeu uma casa que obteve boas-vindas da família materna com planos para seus filhos herdarem quando fossem adultos enquanto ele sobrevivesse dos juros até então acumulados. No entanto no final das contas o pai ficou com a maior parte do dinheiro arrecadado. Com essa venda da propriedade familiar eles deixaram um bairro nobre se mudando para apartamentos em uma área ocupada principalmente por artes como ourives, gravadores e relojoeiros. Crescendo rodeado pela cultura desses trabalhadores manuais fez surgir em Rousseau sentimentos planejados considerados artistas ao invés dos estetas prolíficos comentando: "aqueles tidos como importantes - os ditos artistas - na verdade só produzidos itens decorativos utilizados pelos ociosos ricaços cobrando preços arbitrários". Além disso nesse ambiente ele foi exposto às diferenças sociais existentes entre as classes; frequentemente esses profissionais protestavam contra aquele grupo privilegiado responsável pelo governo local de Genebra.

Rousseau não tinha memória de ter aprendido a ler, mas registrou que aos cinco ou seis anos seu pai o incentivava constantemente no amor pela leitura.

Todas as noites, depois do jantar, líamos um trecho de uma pequena coleção de histórias de aventura que pertencia à minha mãe. A intenção do meu pai era apenas melhorar minhas habilidades de leitura e ele achava que essas obras agradáveis ​​foram calculadas para me dar gosto por isso. No entanto, logo ficamos tão absortos nas aventuras que eles continham que alternávamos noites lendo-os juntos até terminar um volume inteiro. Às vezes pela manhã ao ouvir as andorinhas na nossa janela, ficamos um pouco envergonhados com esta fraqueza; meu pai gritou: "Vamos, vamos para a cama! Sou mais infantil do que você." (Confissões - Livro 1)

Rousseau foi profundamente afetado pela leitura de histórias escapistas como L'Astrée, de Honoré d'Urfé. Mais tarde, ele escreveu que eles "me deram noções bizarras e românticas da vida humana, das quais a experiência e a reflexão nunca foram capazes de me curar".  Depois de terminar esses romances, ele passou para uma coleção de clássicos antigos e modernos deixados pelo tio de sua mãe. Seu favorito entre eles era Vidas dos Nobres Gregos e Romanos, de Plutarco, que ele lia em voz alta para seu pai enquanto fazia relógios. Rousseau viu o trabalho de Plutarco como outra forma de romance - sobre nobres feitos heróicos - trazendo vida aos feitos dos personagens diante dele. Nas Confissões, Rousseau afirmou que a leitura de obras como as de Plutarco, juntamente com as conversas entre ele e seu pai, incutiram nele “um espírito republicano livre”. 

Observar a participação de moradores locais em milícias deixou uma forte impressão em Rousseau. Ele sempre se lembraria de um momento em que, após os exercícios militares, uma milícia voluntária começou a dançar ao redor de uma fonte e muitas pessoas das casas vizinhas vieram para se juntarem a eles, inclusive ele e seu pai. Para Rousseau, as milícias representavam o espírito popular oposto às forças do governo que ele considerava como mercenários vergonhosos.

Quando Rousseau tinha dez anos, seu pai – um ávido caçador – entrou em uma disputa legal com um rico proprietário de terras cujas terras ele havia invadido. Para evitar a derrota certa no tribunal, ele se mudou para Nyon, no território de Berna, levando consigo a tia de Rousseau, Suzanne. Casou-se novamente e a partir de então Jean-Jacques o viu pouco. Jean-Jacques ficou com seu tio materno, que enviou ele e seu filho Abraham Bernard para viver por dois anos como convidados de um ministro calvinista em uma vila nos arredores de Genebra, onde aprenderam matemática e desenho. Aqui, encorajado por serviços religiosos comoventes que o afectaram grandemente, Rousseua chegou a pensar em tornar-se ministro protestante durante algum tempo.

Rousseau viveu com Françoise-Louise de Warens em Les Charmettes de 1735 a 1736, que hoje é um museu dedicado a ele.

A maior parte das informações sobre a juventude de Rousseau provém de suas Confissões, publicadas postumamente. Apesar disso, a cronologia é um pouco clara e lacunas precisam ser preenchidas por meio da pesquisa em arquivos recentemente disponibilizados pelos estudiosos. Aos 13 anos, iniciou sua carreira como aprendiz primeiro com um notário e depois com um gravador que o agredia fisicamente. Fugiu de Genebra pela primeira vez aos 15 anos, no dia 14 de março do ano 1728 após retornar à cidade e encontrar as portas trancadas para não permitir que ninguém entre durante o toque instalado pelas autoridades locais.

Ele procurou refúgio com um padre católico romano na vizinha Sabóia, que o apresentou a Françoise-Louise de Warens, uma nobre de 29 anos de origem protestante que havia se separado do marido. Como proselitista leiga profissional, ela foi paga pelo rei do Piemonte para ajudar a trazer os protestantes para a Igreja Católica. Eles enviaram o menino para Turim, capital da Sabóia (que incluía o Piemonte – agora parte da Itália), para seu processo de conversão que exigia a renúncia à sua cidadania de Genebra; embora mais tarde ele tenha retornado ao calvinismo para recuperá-lo.

Ao se converterem ao catolicismo, tanto Warens quanto Rousseau provavelmente reagiram contra a insistência calvinista na depravação total do homem. Leo Damrosch explica que “uma liturgia de Genebra do século XVIII ainda tinha crentes declarando 'que somos pecadores miseráveis, nascidos na corrupção, transferidos para o mal, incapazes por nós mesmos de fazer o bem'”. Embora deísta de coração, Warens foi atraído pela doutrina católica do perdão dos pecados.

Encontrando-se isolado, uma vez que seu pai e tio o consideravam um renegado em potencial, Rousseau foi capaz de sobreviver temporariamente como servo, secretário e tutor enquanto vagava pela Itália (Piemonte e Saboia) e França. Durante esse período intermitente ele conviveu com frequência com de Warens - a quem ideolatrava chamando-a de mãe. Devido à sua adulação por ela, de Warens tentou introduzir-lhe formalmente na profissão musical. Em certo momento da vida do jovem aspirante ao sacerdócio frequentou brevemente um seminário no interesse futuro tornar-se pai.

Filosofia

Depois de ler a redação do concurso de redação da Dijon Academy, que ele venceria com sua resposta, Rousseau comentou mais tarde que se sentiu como "Eu vi outro universo e me tornei um homem diferente".  O ensaio resultante abordou uma de suas crenças centrais: embora a sociedade tivesse progredido na arte e na ciência, isso ocorreu à custa da degradação moral.  Entre aqueles que influenciaram esta perspectiva estavam Montesquieu, François Fénelon, Michel de Montaigne, Sêneca, o Jovem, Platão e Plutarco.

Rousseau baseou sua filosofia política na teoria dos contratos e na leitura de Thomas Hobbes. Reagir às ideias de Samuel von Pufendorf e John Locke também impulsionou seu pensamento. Todos os três pensadores acreditavam que os humanos que viviam sem autoridade central enfrentavam condições incertas num estado de competição mútua. Em contrapartida, Rousseau acreditava que não havia razão para que isto fosse sério, uma vez que não haveria conflito ou disputa de propriedade. Criticando especialmente Hobbes, Rousseau argumentou contra a afirmação de que "no estado de natureza... o homem não tem ideia do bem; ele deve ser naturalmente mau porque é vicioso por ainda não conhecer a virtude". Pelo contrário, segundo ele, uma moralidade incorrupta prevalecia no “estado de natureza”.

Teoria Política

Rousseau afirmou que a monarquia, a aristocracia e a democracia surgiram como resultado das desigualdades sociais em diferentes níveis. Infelizmente, essas formas de governo tendem a piorar as disparidades entre as pessoas até que uma revolução se torne necessária para derrubá-las. Apesar disso, Rousseau tinha fé na capacidade humana de autoaperfeiçoamento e argumentava que os problemas da humanidade eram criados por escolhas políticas, podendo ser resolvidos através do estabelecimento de um sistema político mais justo.

Em 1762, foi publicado o Contrato Social que colocou as bases para uma ordem política de legitimidade republicana clássica. Essa obra se tornou altamente influente na filosofia política ocidental e desenvolveu algumas ideias anteriormente mencionadas em um artigo anterior intitulado Économie Politique (Discurso sobre Economia Política), publicado na Encyclopédie de Diderot. Neste livro, Rousseau esboçou a imagem de um novo sistema político capaz de restaurar a liberdade humana. 

De acordo com Rousseau, o estado natural representa um estágio primitivo em que não existem leis ou moralidade e em que os humanos se afastaram em prol da necessidade de cooperação. Conforme a sociedade evoluiu, foi necessário introduzir instituições jurídicas para lidar tanto com a divisão do trabalho como também com a propriedade privada. No entanto, à medida que essa estrutura social degenera-se-á fazendo crescer entre indivíduos semelhantes uma tendência competitiva gerando maior dependência mútua ameaçadora para sua sobrevivência bem como liberdade individual.

Segundo Rousseau, ao aderir à sociedade civil por meio do contrato social e renunciar aos seus direitos naturais, os indivíduos conseguem manter sua liberdade. Isso acontece porque a obediência à vontade geral da população garante que não se subordinarão às vontades de outros indivíduos e também faz com que eles respeitem suas próprias leis já que são coletivamente deles.

Apesar de Rousseau argumentar que a soberania (ou o poder de fazer leis) deveria estar nas mãos do povo, ele também faz uma distinção clara entre o soberano e o governo. O governo é composto por magistrados responsáveis ​​pela implementação e aplicação da vontade geral. O “soberano” é idealmente decidido pela democracia direta em assembleia como expressão do Estado de Direito.

Em seu livro III, capítulo XV, Rousseau rejeita a ideia de que o povo deveria exercer sua soberania por meio de uma assembleia representativa. Ele defendeu um governo republicano para as cidades-estado e teria visto Genebra como modelo ideal se fosse reformado seguindo seus princípios. No entanto, segundo Rousseau, a França era grande demais e não conseguiu alcançar o seu ideal de Estado. Muitas das controvérsias em torno do trabalho desse autor giram em torno da divergência sobre suas afirmações acerca da obediência à vontade geral como libertadora dos cidadãos obrigados ao cumprimento dessa norma.

A noção de vontade geral é parte integrante da teoria de Rousseau sobre a legitimidade política. No entanto, continua a ser uma ideia infelizmente obscura e controversa. Alguns comentadores vêem-na como nada mais do que a ditadura do proletariado ou a tirania dos pobres urbanos (como visto talvez durante a Revolução Francesa). Mas não era isto que Rousseau pretendia; ele esclareceu no seu Discurso sobre Economia Política que existe uma vontade geral que visa proteger os indivíduos da opressão das massas, em vez de exigir o seu sacrifício por elas. Rousseau tinha plena consciência de que os homens possuem interesses egoístas e seccionais que podem levá-los a oprimir os outros - tornando a lealdade ao bem comum um imperativo para todos (o compromisso não é exclusivo). Esta ênfase garante uma formulação bem sucedida através da participação mútua, pelo que a intenção partilhada verdadeiramente genuína deve ser cumprida.

Teoria Econômica

Os escritos de Rousseau, incluindo o "Discurso sobre a Desigualdade", o "Discurso sobre a Economia Política" e "O Contrato Social", bem como os seus projectos constitucionais para a Córsega e a Polónia, oferecem uma riqueza de pensamento económico. Enquanto economistas posteriores, como Joseph Schumpeter, criticaram a teoria de Rousseau por falta de rigor e por ser esporádica por natureza, os historiadores do pensamento económico elogiam-no pela sua visão matizada das finanças e pela compreensão madura do desenvolvimento. É amplamente aceito que Rousseau criticava a riqueza e o luxo modernos, ao mesmo tempo que os associava ao agrarianismo e à autarquia. No entanto, o historiador Istvan Hont modifica esta leitura, indicando que Rousseau pode ser simultaneamente crítico e apoiante do comércio - endossando um comércio bem regulamentado sob uma governação adequada. Além disso, os estudiosos Ryan Hanley e Hansong Li argumentam que, como qualquer legislador moderno - embora evite rejeitar o amor ou as perspectivas de negócios - eles defendem que a economia deve ser domesticada para servir a sociedade em geral. 

Principais Obras

  • 1743 Dissertação francesa sobre música moderna.
  • Reescrita: Discurso a respeito das Artes e Ciências (Disours sur les sciences et les arts), no ano de 1750.
  • Narciso, or The Self-Admirer: A Comedy, 1752.
  • Discurso sobre a origem e fundamento da desigualdade entre os homens (Discurso sobre l'origine et les fondements de l'inégalité parmi les hommes ), 1754
  • Carta sobre música francesa, 1753 (Lettre sur la musique française [fr])
  • Discurso sobre economia política, 1755 (Discurso sobre economia política [francês])
  • Lettre à D 'Alembert sur les spectacles, 1758 (Carta a M. D'Alembert sobre os espetáculos)
  • Julie ou a Nova Heloísa, 1761.
  • "Emile ou On Education (Émile ou de l'éducation), 1762 (incluindo 'O Credo de um Padre from Savoy')"
  • "O contrato social ou os princípios do direito político", obra intitulada originalmente "Du contrat social" e publicada em 1762.
  • Em 1762, Quatro Cartas foram escritas para M. de Malesherbes.
  • Cartas escritas da montanha, 1764 (Lettres écrites de la montagne [Fr]) -
  • Dicionário de Música Inalterado, 1767 (Dicionário de Música)
  • As Confissões de Jean-Jacques Rousseau (Les Confessions), inicialmente escritas em 1770, foram publicadas em 1782.
  • Projeto Constitucional para a Córsega, 1772.
  • Reflexões sobre o Governo Polonês, 1772
  • Cartas sobre Elementos Botânicos
  • Um ensaio publicado "Essai sur l'origine des langues" foi publicado em 1781, abordando a origem das línguas.
  • A obra "Rousseau Juiz de Jean-Jacques" foi publicada em 1782.
  • A obra incompleta "Devaneios do Caminhante Solitário" foi publicada em 1782 sob o título "Rêveries du promeneur solitaire".

Racionalismo: Da Filosofia à Matemática


 
O racionalismo é uma postura epistemológica ou filosófica que se destaca pela atribuição de autonomia a pelo menos uma das três teses seguintes: 1) razão e intuição devem ser privilegiadas em relação à sensação e experiência na busca do conhecimento; 2) toda ou grande parte de nossas ideias são inatas, ao invés de adquiridas durante o curso da vida; e 3) a certeza do conhecimento deve ter prioridade sobre sua mera probabilidade nas investigações filosóficas. Uma característica compartilhada por todos os principais representantes dessa corrente – como René Descartes, Baruch Espinoza e Gottfried Wilhelm Leibniz – é também a crença na realidade substancial como princípio fundamental unificador das coisas.

O racionalismo sustenta que a existência de tudo é atribuível a uma causa inteligente, mesmo que essa origem não possa ser comprovada empiricamente, como no caso da criação do universo. Este sistema valoriza o uso da razão para obter conhecimento em detrimento das experiências sensoriais. Dessa maneira, a dedução é vista como sendo um método superior na investigação filosófica. Pensadores modernos notáveis ​​nesse campo incluem René Descartes, Baruch Espinoza e Gottfried Wilhelm Leibniz. No entanto Georg Wilhelm Friedrich Hegel vai além disso ao associar o racional ao real numa suposição de compreensão total deste último. (Observe que também corrigi alguns erros sutis de sintaxe e gramática no texto original)

Segundo o pensamento de Kant, o racionalismo se fundamenta na busca pela certeza por meio da demonstração e análise. Esse processo é sustentado pelo conhecimento a priori - que não é inato nem derivado da experiência sensorial - mas sim produzido exclusivamente pela razão.

René Descartes

"O racionalismo é um princípio central no pensamento liberal que busca identificar, estabelecer e propor formas de atingir determinados objetivos [3]. Esses objetivos são postulados em nome do bem comum (comunidade), que constitui a base para Anglo- O liberalismo saxão e também contribui para o estabelecimento do racionalismo, por sua vez, sustenta o planeamento da organização económica e da reprodução social espacial."

Matemática racionalista

A doutrina do racionalismo surgiu no século I aC, destacando que todas as coisas têm uma causa. Mais tarde, os filósofos modernos tentaram utilizar instrumentos matemáticos para explicar a realidade com o intuito de alcançar esse objetivo. Com isso em mente, Descartes propôs um método científico baseado na geometria e composto por quatro regras formuladas especificamente para essa especificamente: as chamadas Regras do Método Científico.

"O primeiro método era o de jamais acolher alguma coisa como verdadeira que eu não conhecesse evidentemente como tal; isto é, de evitar cuidadosamente a precipitação e a prevenção, e de nada incluir em meus juízos que não se apresente tão clara e tão distintamente a meu espírito, que eu não tivesse nenhuma ocasião de pô-lo em dúvida.
O segundo método era o de dividir cada uma das dificuldades que eu examinasse em tantas parcelas quantas possíveis e quantas necessárias fossem para melhor resolvê-las.
O terceiro método era o de conduzir por ordem meus pensamentos, começando pelos objetos mais simples e mais fáceis de conhecer, para subir, pouco a pouco, como por degraus, até o conhecimento dos mais compostos, e supondo mesmo uma ordem entre os que não se precedem naturalmente uns aos outros.
O quarto método era o de fazer em toda parte enumerações tão completas e revisões tão gerais, que eu tivesse a certeza de nada omitir."

As ideias de René Descartes influenciaram vários pensadores, incluindo o filósofo holandês Spinoza e o matemático e político alemão Leibniz. Além de desenvolver o cálculo infinitesimal ainda em uso hoje, Leibniz defendeu o racionalismo, que afirma que algumas ideias e princípios existem dentro de nós, mas não são derivados de experiências sensoriais - um ponto de vista partilhado com Descartes. Ele cita conceitos geométricos junto com lógica e aritmética como exemplos de conhecimento inato.

O que é a filosofia analítica?

A filosofia analítica é uma escola de pensamento contemporânea reivindicada por filósofos bastante distintos e com a caracterização de duas ações distintas cuja filosofia precursora surgiu da superação da filosofia sintética do século XIX.  Originalmente, o seu ponto comum era a ideia de que a filosofia trata da análise do significado das declarações linguísticas; em outras palavras, reduz-se à pesquisa sobre a linguagem. Desde cerca de 1960, houve um fim na chamada “virada linguística”, de modo que a Filosofia analítica não tem mais nenhum compromisso particular com a análise da linguagem. Atualmente, poderia ser melhor descrito como tendo espírito científico (em sentido amplo): os problemas filosóficos são tratados como questões factuais resolvidas através de técnicas de argumentação. É muito típico deste ramo usar ferramentas das ciências formais (como matemática ou lógica), juntamente com resultados derivados das ciências naturais, como física, biologia, neurologia, psicolinguística, antropologia). A Filosofia Analítica permanece amplamente difundida até agora, predominantemente nos países de língua inglesa (EUA, Canadá, Reino Unido, Austrália), embora existam centros de pesquisa significativos tanto na América Latina, na Europa continental, como em qualquer outro lugar do mundo. Como consequência, a difusão geográfica relacionada, juntamente com o abandono em direção a perspectivas linguísticas, tornou-se extremamente diversificada, afastando-se significativamente até mesmo de seus pressupostos linquísticos e positivistas originais, responsáveis ​​por dar início à sua história em primeiro lugar.

Contexto histórico

Durante a transição do século XIX para o século XX, a filosofia passou por uma nova e profunda transformação conhecida como "virada linguística", influenciada por Frege, Bertrand Russell e Wittgenstein. A atividade filosófica passou a ser considerada principalmente como um método lógico para analisar o pensamento. Este esforço foi motivado por hipóteses de que a lógica criada durante este período por Gottlob Frege, Bertrand Russell e outros poderia ter amplas implicações filosóficas e ajudar no esclarecimento de conceitos e ideias. Um dos exemplos mais claros desta tendência é a análise de Russell de sentenças contendo proposições definidas.

Frege, Russell, George Edward Moore e Ludwig Wittgenstein foram os primeiros filósofos analíticos. Na Inglaterra, com Russell e Moore na vanguarda, opuseram-se às escolas de pensamento derivadas do idealismo alemão – principalmente ao hegelianismo representado por JME McTaggart e FH Bradley. O surgimento da filosofia analítica marcou, portanto, uma nova divisão nos métodos de fazer filosofia. O termo 'Filosofia Continental' foi cunhado pelos próprios filósofos analíticos para se referir a várias tradições filosóficas originárias da Europa Continental; particularmente Alemanha e França.

No início da filosofia analítica, existiam diversas correntes, uma delas sendo o positivismo lógico. Isto se distingue por rejeitar qualquer forma de metafísica. O Círculo de Viena foi um grupo neopositivista fundado por Moritz Schlicke e composto por filósofos austríacos e alemães como Carnap, eventualmente Hans Reichenbache nos primeiros anos e Wittgenstein. Suas foram apresentadas no manifesto "Concepção científica do mundo" em 1929. Devido ao início da Segunda Guerra Mundial, muitos dos principais membros tiveram que fugiram para os Estados Unidos onde ocorreram uma visão geral entre sua filosofia - o positivismo lógico- com as ideias americanas gerando assim uma nova corrente denominada Pragmatismo ou "Pragmatismo moderno". Essa vertente já foi explorada há mais tempo pelos autores William James (1842-1910), Charles Sanders Peirce (1839-1914) e John Dewey (1859-1952). Posteriormente esta vertente será vista pelos autores ligados ao Círculo de Viena como um método utilizado na análise do significado das proposições científicas; também é associado à tentativa feita pelo autor Peter Strawson utilizando-a na descrição dos conceitos fundamentais presentes no nosso esquema conceitual levando assim a chamada Filosofia da Linguagem Ordinária.

Ao longo de suas sucessivas manifestações, a filosofia analítica sempre se dividiu em duas correntes: o empirismo lógico e a filosofia da linguagem comum. Na primeira geração de pensadores, G. Frege representou o empirismo lógico com sua obra fundamental na lógica moderna, Begriffschrift (Halle 1879). Ele seguiu o projeto suspenso de Leibniz de uma "linguagem característica", culminando em Grundgesetze der Arithmetik (Breslau 1884), que estabeleceu a primeira definição lógica dos números cardinais. Enquanto isso, H. Sidgwick (1838-1900) resistiu ao idealismo neo-hegeliano na Inglaterra, representando o pensamento empírico inglês tradicional através de seu Método de Ética (1874) dentro da filosofia da linguagem comum. A segunda geração nos trouxe Russell como um expoente do empirismo lógico e George Edward Moore na filosofia da linguagem comum

.Assim, autores como Saul Kripke, Hilary Putnam e Tyler Burge passaram a abordar temas como a relação entre sujeito e mundo – ou mais precisamente, entre a subjetividade e seu ambiente físico-social -, condições para a identidade do objeto através de mundos possíveis, entre outros.

Atualmente, a filosofia analítica é o campo de estudo dominante nos departamentos de filosofia das universidades nos países anglófonos, bem como na Escandinávia. Ela também tem uma forte presença em certas nações da Europa Oriental, como a Polônia e Israel. oposto à filosofia continental; no entanto, deve-se notar que algumas das suas raízes derivam da Europa - por exemplo, através do trabalho de Franz Brentano sobre a intencionalidade e dos seus seguidores como Alexius Meinong - sugerindo que esta alegada oposição pode ser simplesmente superficial.

A filosofia analítica não possui uma ideia unificadora ou dogma específica além da referência original à lógica contemporânea.

Embora a epistemologia e a lógica de Frege tenham sido confirmadas ao empirismo, muitos filósofos posteriores seguiram a análise como os positivistas lógicos e Quine defenderam concepções empíricas em detrimento do racionalismo defendido por Frege. No entanto, pensadores analíticos modernos como Tyler Burge refutaram o pensamento empirista aderindo novamente à ideia de racionalidade na construção do conhecimento.

Na lógica, Frege se opôs ao “psicologismo” de John Stuart Mill. Certas ideias atribuídas a Mill - por exemplo, a de que os nomes próprios carecem do que ele chama de conotação - foram debatidas entre filósofos analíticos. Saul Kripke, por exemplo, defende uma teoria miliana de nomes próprios como um desafio contra o suposto descritivismo no que é chamado de "concepção de Frege-Russell".

Russell, junto com outros, defendia pontos de vista realistas. Enquanto isso, seu primeiro aluno e mais tarde colega, Wittgenstein, parecia ter sido um antirrealista, pelo menos durante algum tempo.

O Círculo de Viena e a filosofia da linguagem cotidiana se opõem a todas as formas de metafísica. Atualmente, há um ressurgimento da metafísica na filosofia analítica.

Até o início dos anos 1950, a filosofia analítica era predominantemente dominada pelo movimento do positivismo lógico. No entanto, em 1951 houve um golpe fatal para este movimento com a publicação de "Dois Dogmas do Empirismo" por Quine, resultando no fim do positivismo lógico como principal força na área da filosofia analítica. De lá para cá essa corrente se ramificou e evoluiu em diversas áreas relevantes: surgiram estudos sobre ciência cognitiva e filosofia da mente que tomaram lugar antes ocupados pela disciplina linguística; além disso tem-se visto uma ascensão significativa de metafísica e até a mesma teologia analítica. Também foram desenvolvidas novas abordagens políticas – tais quais as concepções expressadas pelos pensadores John Rawls ou Robert Nozick - bem como crescentes investigações acerca das questões embutidas na ética contemporânea.

O que é a filosofia continental?

O estilo único do intelectual frio, exótico e engajado, em contraste com o pensador analítico conservador e acadêmico, tem aparecido frequentemente em representações comuns da filosofia continental.

O termo "Filosofia Continental" originou-se no uso anglo-americano para se referir à filosofia não analítica. Ganhou popularidade dentro da filosofia acadêmica analítica como um conjunto vagamente organizado de tendências filosóficas contemporâneas da Europa continental, às vezes acompanhadas de desqualificação quanto ao seu valor filosófico em comparação com os critérios analíticos britânicos.  Consequentemente, não há consenso sobre o que constitui a “tradição filosófica continental”, e alguns autores até rejeitam totalmente a ideia, negando qualquer coerência interna entre estas tendências; em vez disso, afirma que se trata mais de uma divisão cultural, acadêmica e histórica do que de ser estritamente filosófica.

Alguns filósofos comumente identificados como exemplos de filósofos continentais incluem Hegel, Marx, Nietzsche, Husserl, Heidegger, Sartre, Gadamer, Derrida, Michel Foucault e Baudrillard. Os movimentos continentais também abrangem o Hegelianismo, o Marxismo, o Estruturalismo, o Pós-Estruturalismo, a Teoria da Desconstrução, a Crítica, a Hermenêutica, a Fenomenologia e o Pós-modernismo. As altas críticas contra estas tentativas de organizar a filosofia continental apontam que algumas filosofias relevantes da tradição continental foram deixadas de fora porque não conseguiram cativar a atenção anglo-americana; por exemplo, Personalismo, Epistemologia Francesa, Filosofia Neoescolástica ou outras formas de filosofia católica. A ênfase na divisão entre filosofia analítica/continental é criticada por ignorar inspirações e interseções comuns entre ambas as facções em casos como a fenomenologia que, apesar de ser classificada tipicamente sob um projeto continental, pode ser encontrada presente entre autores analíticos como JL Austin, Gilbert Ryle e Ludwig Wittgenstein. 

No entanto, apesar das suas origens e das críticas que lhe são dirigidas, o conceito de filosofia continental tem experimentado um ressurgimento positivo entre os novos filósofos, tanto em espaços tradicionalmente continentais como em ambientes anglófonos academicamente hegemónicos. Alguns filósofos franceses contemporâneos foram classificados como parte desta tradição. Em ambientes anglófonos, versões locais da filosofia continental são apresentadas como uma nova onda no discurso filosófico atual.

O mito da caverna, de Platão


O Mito da Caverna, ou Alegoria da Caverna, é uma passagem famosa do filósofo grego Platão. Ao utilizá-la, Platão oferece uma profunda reflexão sobre o conhecimento, a percepção e a realidade. Através dessa história, ele ilustra seu dualismo filosófico, diferenciando entre o mundo sensível das aparências e o mundo inteligível das ideias.

Na narrativa, Platão descreve um grupo de pessoas que estão aprisionadas em uma caverna desde a infância. Esses prisioneiros estão acorrentados de tal forma que só conseguem olhar para o fundo da caverna, onde veem apenas sombras projetadas por objetos que passam diante de uma fogueira, colocada atrás deles. Os objetos são carregados por outros homens que caminham ao lado da parede que oculta seus corpos, de modo que os prisioneiros percebem apenas as sombras dos objetos, acreditando que essas sombras são a única realidade existente.

Essa metáfora serve como uma analogia para a condição humana em relação ao conhecimento e à ignorância. A escuridão da caverna representa a ignorância e a condição limitada dos sentidos humanos. As sombras, por sua vez, simbolizam as aparências enganosas e a superficialidade das percepções sensoriais. Para os prisioneiros, essas sombras constituem toda a realidade, uma vez que desconhecem a existência do mundo exterior e da verdadeira fonte de luz e conhecimento.

Um ponto crucial da alegoria ocorre quando um dos prisioneiros é libertado. Ele inicialmente sofre ao confrontar a luz da fogueira e, em seguida, a luz do sol fora da caverna. Esse processo doloroso simboliza a dificuldade inerente à busca do conhecimento verdadeiro e à superação da ignorância. Ao sair da caverna, o prisioneiro finalmente compreende que as sombras são simples ilusões e descobre a realidade autêntica representada pela luz do sol.

A fuga da caverna e a revelação da verdadeira realidade além das sombras ilustram a distinção entre o mundo sensível e o mundo inteligível, que são centrais na filosofia de Platão. O primeiro é o mundo das coisas físicas, que percebemos através dos sentidos e que está em constante mudança. O segundo é o mundo das ideias ou formas, que são imutáveis e perfeitas, sendo acessíveis apenas através da razão.

Por fim, o Mito da Caverna não é apenas uma reflexão filosófica abstrata, mas também uma homenagem a Sócrates, mentor de Platão, que dedicou sua vida à busca do conhecimento e à instrução dos outros. Platão, ao apresentar essa alegoria em A República, convida-nos a questionar nossas próprias percepções e a reconhecer a importância da filosofia na busca pela verdade e pelo entendimento profundo da realidade.

Dessa forma, o Mito da Caverna permanece uma das mais poderosas ilustrações da importância do conhecimento e da constante necessidade de ultrapassarmos as aparências em direção à verdadeira compreensão do mundo e de nós mesmos.

Os filósofos da era Socrática

Os filósofos pré-socráticos, do primeiro período da filosofia grega, desenvolveram suas teorias do século VII ao V a.C. Antes de Sócrates, buscaram nas elementos da natureza as respostas sobre a origem do ser e do mundo, sendo chamados de “filósofos da physis” ou "filósofos da natureza". 

Responsáveis pela transição da consciência mítica para a filosófica, abandonaram a cosmogonia da mitologia grega em favor da cosmologia baseada no lógos. Essa mudança deu origem a uma produção de conhecimento que serviu como base para o desenvolvimento da cultura ocidental. 

1. Tales de Mileto: Considerado o primeiro filósofo ocidental, Tales propôs que a água era o princípio fundamental de todas as coisas. Ele acreditava que tudo no mundo poderia ser explicado pela transformação da água.

2. Anaximandro: Discípulo de Tales, Anaximandro sugeriu que o "ápeiron" (ilimitado ou infinito) era a origem de todas as coisas. Ele considerava o ápeiron uma substância indefinida e eterna da qual tudo se origina e para a qual tudo retorna.

3. Anaxímenes: Outro filósofo de Mileto, Anaxímenes acreditava que o ar era o princípio básico do universo. Ele afirmava que todas as coisas surgem da condensação e rarefação do ar.

4. Heráclito: Conhecido pelo seu aforismo "Tudo flui", Heráclito acreditava que a única constante no universo era a mudança. Ele identificava o fogo como o elemento primordial e a luta entre opostos como o motor das transformações.

5. Parmênides: Em contraste com Heráclito, Parmênides defendia que a mudança era uma ilusão. Ele argumentava que o ser é único, eterno e imutável, e qualquer percepção de mudança é enganosa.

6. Pitágoras: Principalmente conhecido como matemático, Pitágoras também tinha uma forte vertente filosófica. Ele acreditava que os números eram a essência de todas as coisas e que a harmonia das proporções numéricas explicava o universo.

7. Empédocles: Empédocles introduziu a teoria dos quatro elementos clássicos: terra, água, ar e fogo. Ele sustentava que todas as coisas são compostas por combinações desses elementos em diferentes proporções, unificadas por forças de amor e separadas por forças de ódio.

8. Anaxágoras: Este pensador trouxe a ideia do "nous" (mente ou intelecto) como princípio organizador do cosmos. Para Anaxágoras, o nous possuía um papel central na formação e na ordem do universo.

9. Demócrito: Junto com seu mentor Leucipo, Demócrito desenvolveu a teoria atômica. Eles afirmavam que o universo era composto por átomos indivisíveis e eternos que se moviam no vazio, formando todas as coisas através de suas combinações.

Esses filósofos pré-socráticos foram pioneiros na busca por explicações racionais e naturais para o mundo ao seu redor. Suas teorias e ideias lançaram as bases da filosofia e da ciência ocidental, influenciando gerações posteriores de pensadores e cientistas.

A ética em Kant

Immanuel Kant, filósofo de grande influência na história do pensamento ocidental, propôs uma concepção ética que fosse completamente independente de justificações morais religiosas e fundamentada unicamente na razão humana. Seu principal objetivo era criar uma bússola moral universal, capaz de guiar as ações dos indivíduos sem a necessidade de recorrer a autoridades externas, sejam estas religiosas ou estatais.

A pedra angular da ética kantiana é o Imperativo Categórico, uma formulação que exige que nossas ações possam ser universalizadas. Em outras palavras, para que uma ação seja moralmente correta, deve ser possível desejar que todos agissem da mesma forma em circunstâncias semelhantes. Esse imperativo não se submete a condições específicas ou circunstâncias individuais, mas é uma exigência incondicional da razão. Através dele, Kant procurava identificar princípios morais objetivos e universais, fundamentados apenas na lógica e na capacidade racional do ser humano.

Kant se inspirou no modelo revolucionário introduzido por Nicolau Copérnico, que mudou profundamente a compreensão do universo físico ao deslocar a Terra do centro do universo. Kant almejou um impacto semelhante na esfera moral, propondo que o ser humano, através de sua razão, poderia encontrar e seguir princípios éticos de forma autônoma, sem necessidade de um sistema moral imposto externamente.

A obra "Fundamentação da Metafísica dos Costumes" é onde Kant desenvolve meticulosamente sua teoria ética. Nesse livro, ele argumenta que o conceito de dever deve ser radicado em uma estrutura racional que seja imutável e universal. O dever, para Kant, não é algo imposto de fora para dentro, mas sim uma exigência que nasce da própria racionalidade humana.

Ao propor essa ética universal, Kant estava declarando a competência e a responsabilidade moral de cada indivíduo, ressaltando a importância da autonomia e da dignidade humana. Ele acreditava que cada ser humano possui a capacidade inata de compreender e seguir princípios morais racionais, sem a necessidade de intervenção ou coerção externa.

Ao longo do desenvolvimento de sua filosofia, Kant delineou um sistema de moralidade que continua a influenciar o pensamento ético contemporâneo, oferecendo um robusto framework para a análise e compreensão das obrigações morais em um mundo cada vez mais complexo e diversificado.

Moral: Kant x Cristianismo

A moral cristã e a moral kantiana representam dois pilares distintos no desenvolvimento do pensamento ético. A moral cristã, profundamente enraizada nas tradições religiosas e nos ensinamentos bíblicos, conduz a vida moral dos indivíduos a partir de uma perspectiva heterônoma, ou seja, as normas e valores são impostos de fora para dentro. A autoridade divina e os mandamentos religiosos funcionam como guias para a conduta humana, oferecendo um conjunto de regras e princípios que devem ser seguidos para alcançar uma vida virtuosa e moralmente correta.

Por outro lado, a moral kantiana surgiu como fruto do Iluminismo, movimento que trouxe à tona a necessidade de questionar e reformular os conceitos tradicionais de conhecimento, verdade e moralidade. Immanuel Kant, uma das figuras centrais desse movimento, propôs um sistema ético baseado na autonomia e na capacidade racional dos indivíduos de legislar para si mesmos. Na moral kantiana, o dever não é uma regra ditada por uma autoridade externa, mas sim um imperativo categórico oriundo da própria razão. A autonomia moral é, portanto, uma característica fundamental da ética kantiana; as normas são estabelecidas de dentro para fora e baseiam-se na racionalidade e na universalidade das máximas que podem ser aplicadas a todos os seres racionais.

Enquanto a moral cristã vê a aderência aos mandamentos divinos como o caminho para a virtude, a moral kantiana propõe que a moralidade reside na intenção de agir conforme princípios que podem ser universalizados. Nesse sentido, a ação moral, para Kant, deve ser realizada não por temor a uma autoridade divina ou para alcançar recompensas celestiais, mas porque a razão reconhece essa ação como um dever em si mesmo.

A distinção entre moral cristã e moral kantiana não implica necessariamente em conflito, mas em abordagens distintas para o entendimento do que significa viver uma vida ética. A moral cristã encontra seu fundamento na fé e na revelação divina, oferecendo um sentido de propósito e obediência a uma ordem transcendente. Em contraste, a moral kantiana enfatiza a capacidade humana de autodeterminação e a importância da razão como guia supremo da conduta moral.

Em suma, a transição do pensamento heterônimo da moral cristã para a autonomia moral kantiana representa uma evolução significativa no pensamento ético. Kant buscou substituir a autoridade da Igreja pela autoridade intrínseca da Razão, concedendo aos indivíduos a capacidade de serem senhores de suas próprias ações através de um processo racional de deliberação ética. A laicidade e independência da moral kantiana marcam uma redefinição do que significa agir moralmente, afastando-se das prescrições religiosas e aproximando-se de um ideal iluminista de razão e autonomia.

Imperativo categórico

O Imperativo Categórico proposto por Immanuel Kant é uma tentativa de fornecer uma estrutura racional e universal para a moralidade. Kant acreditava que as ações morais não deveriam ser baseadas em desejos ou consequências, mas sim em princípios racionais que poderiam ser universalmente aplicados. Essa abordagem resulta em três formulações do Imperativo Categórico, cada uma oferecendo uma perspectiva única, mas complementares, sobre a moralidade.

Na primeira formulação, "Age como se a máxima de tua ação devesse ser erigida por tua vontade em lei universal da Natureza," Kant sugere que uma ação só pode ser considerada moral se puder ser convertida em uma lei universal da natureza. Em outras palavras, antes de agir, deve-se perguntar se a máxima que guia essa ação poderia ser adotada por todos, sem exceção. Essa formulação enfatiza a universalidade e a necessidade de consistência moral, esperando que as leis da moralidade sejam tão inquestionáveis quanto as leis naturais, como a gravidade.

A segunda formulação, "Age de tal maneira que trates a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de outrem, sempre como um fim e nunca como um meio," propõe um respeito incondicional à dignidade humana. Aqui, Kant introduz o conceito de humanidade como um fim em si mesmo. Isso significa que em todas as ações deve-se tratar cada ser humano como um indivíduo valioso, e nunca como um meio para alcançar outros objetivos. Este principio refuta a ideia de que "os fins justificam os meios" e rejeita qualquer abordagem utilitarista onde as pessoas são usadas como instrumentos para fins maiores.

A terceira formulação, "Age como se a máxima de tua ação devesse servir de lei universal para todos os seres racionais," reúne os elementos das duas primeiras formulações e enfatiza a racionalidade humana. Nesta perspectiva, Kant destaca a capacidade dos seres humanos de agir de acordo com princípios racionais e não meramente por reações causais. A ação moral deve ser guiada por máximas que possam ser universalizadas, mas aqui o foco é na racionalidade e na autonomia do agente moral em criar leis que possam ser seguidas por todos os seres racionais.

Essas três formulações juntas formam a base da moralidade kantiana, orientando as ações pela razão de modo que os princípios internos (máximas) possam ser universalizados e sempre respeitem a dignidade humana. Ao agir conforme essa moralidade, a ação transcende o particular e abarca o universal, assegurando que as decisões individuais reflitam um compromisso com princípios éticos que poderiam ser adotados por toda a humanidade.

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