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Se a Parte Um (2024) foi a construção colorida e efervescente da amizade, "Wicked: Parte Dois" é a desconstrução brutal da inocência. Um ano após o intervalo que deixou o público em suspenso com Defying Gravity, o diretor Jon M. Chu retorna para concluir a adaptação do musical mais rentável do século, entregando um épico de fantasia que troca o brilho da Universidade de Shiz pelas sombras da guerrilha e do fascismo na Cidade das Esmeraldas. O resultado é um filme densamente político, visualmente avassalador e emocionalmente devastador.
Produção e Direção de Arte: O Lado Sombrio de Oz
A decisão de dividir a peça em dois filmes foi amplamente debatida, mas a Parte Dois justifica sua existência através da escala. O designer de produção Nathan Crowley expande o universo de Oz para além do deslumbramento. A Cidade das Esmeraldas, antes um farol de esperança, é recontextualizada como uma metrópole distópica, inspirada na arquitetura brutalista e nos regimes totalitários do século XX. O verde, antes vibrante, torna-se opressivo e militarizado.
A produção técnica brilha na integração de cenários práticos gigantescos com CGI. A sequência de "No Good Deed" (Nenhuma Boa Ação) é um tour de force visual. Chu utiliza efeitos atmosféricos — tempestades de areia, tornados mágicos — para espelhar o caos interno de Elphaba. O filme não tem medo de ser feio quando necessário; o covil de Elphaba no Oeste é árido e solitário, contrastando violentamente com o luxo excessivo e artificial do palácio do Mágico.
Os figurinos de Paul Tazewell atingem seu ápice aqui. O icônico vestido preto da Bruxa Má do Oeste não é apenas uma roupa, mas uma armadura que se desgasta e evolui conforme Elphaba assume seu papel de vilã aos olhos do público. Do outro lado, os vestidos de Glinda tornam-se cada vez mais volumosos e restritivos, simbolizando sua prisão dentro da própria imagem pública.
Roteiro e Narrativa: Corrigindo o Segundo Ato
Críticos de teatro sabem que o segundo ato do musical original é narrativamente apressado. O roteiro do filme aproveita a duração estendida para respirar. A transformação de Fiyero (Jonathan Bailey) no Espantalho e a trágica história de Boq (o Homem de Lata) ganham um peso dramático que muitas vezes se perde no palco.
O filme entrelaça habilmente a linha do tempo de Wicked com os eventos canônicos de O Mágico de Oz (1939). Vemos a chegada de Dorothy não como a aventura de uma heroína, mas como uma invasão alienígena catastrófica sob a perspectiva de Elphaba. O roteiro acerta ao manter Dorothy como uma figura periférica, quase sem rosto — uma força da natureza que não pode ser raciocinada, apenas temida.
O subtexto político é trazido para o primeiro plano. A manipulação da verdade pela Madame Morrible (Michelle Yeoh) e pelo Mágico (Jeff Goldblum) ressoa com a era da "pós-verdade". O filme é explicitamente sobre como a história é escrita pelos vencedores e como a propaganda transforma dissidentes em monstros.
Atuação: O Duelo de Divas
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Cynthia Erivo entrega a performance de sua vida. Se na Parte Um ela era a aluna incompreendida, aqui ela é a revolucionária exausta. Sua interpretação de "No Good Deed" é visceral; ela não canta apenas para atingir as notas, mas para expurgar a raiva. Erivo transmite a dor física da magia e o peso do isolamento com um olhar que corta a tela. É uma atuação digna de Oscar, equilibrando a ferocidade da "Bruxa Má" com a vulnerabilidade de uma mulher que perdeu tudo.
Ariana Grande surpreende ao navegar pelas águas mais profundas de Glinda. A personagem deixa de ser o alívio cômico para se tornar uma figura trágica de conformidade. Em "Thank Goodness", Grande captura a angústia de ter tudo o que sempre quis e perceber que não vale nada. A química entre as duas atinge o clímax em "For Good". A cena é filmada com uma intimidade crua, focada inteiramente nos rostos das atrizes, permitindo que a complexidade de sua amizade — marcada por amor, inveja e arrependimento — transborde.
Jonathan Bailey traz um heroísmo cansado para Fiyero, funcionando como o coração moral que une as duas protagonistas, enquanto Jeff Goldblum despe-se de seus maneirismos habituais para revelar a patética mediocridade do homem por trás da cortina.
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A mixagem de som merece destaque. A decisão de gravar os vocais ao vivo no set paga dividendos emocionais na Parte Dois. As vozes falham, o fôlego é audível; há uma crueza que o estúdio não replicaria. A orquestração é mais pesada e sombria, incorporando temas marciais para a Guarda do Mágico. O número "March of the Witch Hunters" é tratado quase como um filme de terror, com a multidão de Oz transformada em uma turba linchadora, evocando imagens reais de perseguição política.
Recepção e Veredito
A crítica internacional (Variety, The Hollywood Reporter) tem aclamado "Wicked: Parte Dois" como superior ao primeiro filme. Onde a Parte Um às vezes parecia alongada demais para cobrir a vida escolar, a Parte Dois tem urgência e perigo real.
Alguns puristas apontam que a expansão da trama dilui o mistério de certos personagens, e que o final (embora fiel ao musical) pode confundir o público geral que espera uma conexão direta e perfeita com o filme de 1939. No entanto, o consenso é que Jon M. Chu conseguiu o impossível: pegar um fenômeno cultural de palco e transformá-lo em cinema de verdade, não apenas teatro filmado.
Conclusão: "Wicked: Parte Dois" é uma tragédia operística deslumbrante. É um filme triste, maduro e visualmente espetacular que honra o legado de Oz enquanto questiona a natureza do heroísmo e da vilania. O final, agridoce e poderoso, cimenta Erivo e Grande como a dupla definitiva de Elphaba e Glinda para esta geração.
Nota: 4.5/5 estrelas.
Ficha Técnica:
Direção: Jon M. Chu
Roteiro: Winnie Holzman e Stephen Schwartz
Elenco: Cynthia Erivo, Ariana Grande, Jonathan Bailey, Michelle Yeoh, Jeff Goldblum.
Estreia: Novembro de 2025


