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[#LeiaNacional] Entrevista com Pedro Jucá, autor de ❝Coisa amor❞


1. Primeiramente, fale-nos um pouco sobre você.

Oi, gente! Meu nome é Pedro Jucá, nasci em Fortaleza, em 1989, mas moro em Curitiba com os gatos mais lindos do planeta Terra: Willow, Hopper e Nimbus. Sou formado em Direito e pós-graduado em Escrita Criativa. Gosto de me definir como escritor, mas também trabalho como Procurador do Estado do Paraná e já tive um percurso pela Psicanálise. Entre as três áreas de saber, me divirto, labuto, rio, choro, sofro e me deleito (não necessariamente nessa ordem).

2. Há quanto tempo você escreve, como começou?

A rigor, escrevo desde criança, quando, ainda ali pela alfabetização, minha avó me estimulou a contar histórias. Não tinha o instrumental adequado, claro, mas foi ali que comecei a fabular. Meu primeiro contosério eu escrevi ali pelos quinze, dezesseis anos. Hoje estou com 33, então já tem muita história para contar.

3.Você teria algum segredo de escrita?

Algo que faça com que você se sinta inspirado/a antes de iniciar um novo livro? O segredo é não ter segredo. Quero dizer: é desmistificar a escrita. Escrever é ofício. Para mim, não tem chá, meditação, reza ou ritual que facilite o que, no fundo, é um trabalho: o negócio é sentar a bunda na cadeira (pode ser deitado também), alongar os dedinhos e começar a escrever.

É claro que escrever não é só isso: passa pela criação de referências, pelo enriquecimento de um repertório de leituras e, até mesmo, pela famigerada inspiração. Ela existe, é importante, mas não é escrita ainda. Aquela ideia que aparece no banho só vai parar no papel se você colocá-la lá. É ofício, é suor.

4. Quais foram suas principais referências na literatura, arte e/ou cinema?

Eu amo arte de maneira geral. Estou sempre repetindo que existem duas coisas nessa vida que dão sentido a essa vida: comida e arte. Minhas primeiras referências de leitura foram com os Gibis da Turma da Mônica (é interessante mencionar isso, diante das polêmicas recentes). Depois passei por Harry Potter, que me arrebatou quando criança/adolescente. Com leituras mais maduras, posso citar o Kundera (A Insustentável Leveza do Ser é meu livro favorito da vida), a Alice Munro, o Milton Hatoum com Dois Irmãos, e, claro, a Elena Ferrante e sua Tetralogia Napolitana, que foi outra série que me engoliu inteiro.

Em termos de Artes Plásticas, meu pintor favorito é o Edward Hopper, que vivo a citar por aí. De cinema, meu filme favorito é Annie Hall, mas também poderia citar o Michael Haneke como um dos meus diretores favoritos.

5. Qual foi seu trabalho mais desafiador até hoje em relação à escrita?

Além do Coisa Amor, meu livro de contos, escrevo uma coluna quinzenal de crônicas no Curitiba Cult e estou com um romance finalizado, que, com sorte e suor, deve sair até o final de 2024. Vamos vendo. O mais desafiador, claro, foi o romance. Uma narrativa longa passa por muitos processos complexos idealização, criação das personagens, estruturação da história, busca pelo tom do narrador e do texto, a escrita em si, a revisão, o preparo etc. etc. etc., é um mergulho longo, exige fôlego e uma capacidade mental que eu nem achava que tinha. Mas tenho, mas tive. Que bom.

6. Qual a parte mais difícil de se escrever um livro?

Tudo. São muitas fases importantes, que acho que dividirei em três momentos. Primeiro, existe a criação da história na cabeça do escritor o que, no meu caso, surge a partir de questões que, de alguma forma, me atormentam enquanto sujeito. É um momento bem prazeroso. Depois, existe o momento da própria escrita. É quando começa o trabalho propriamente. É, talvez, a parte mais difícil. Colocar no papel e depois burilar o escrito revisar, revisar, revisar pode ser bem desgastante. Mas, quando o resultado final é bom, a sensação é maravilhosa. Por fim, e isso eu só descobri depois de lançar o Coisa Amor. Existe a fase da divulgação. Tenho aprendido a colocar a cara à tapa e até passar um pouquinho de vergonha na internet para poder fazer meus textos alcançarem mais pessoas. O que todo escritor quer é ser lido.


7.Qual foi seu primeiro livro, o que pensou ao iniciar sua escrita?

O que te incentivou? Meu primeiro livro foi o Coisa Amor, meu livro de contos que saiu pela Editora Urutau e que agora tem circulado o mundo. Ele começou a ser escrito há muitos anos, com contos esporádicos que, revisados e reestruturados, se juntaram a outros que eu escrevi mais recentemente. Minha escrita é sempre motivada por questões minhas questões psicológicas, existenciais, corporais, qualquer coisa, enfim, que me atormente e que peça para ser colocada no papel.

8.Tem algum personagem que você tenha criado ao qual foi difícil desapegar?

Não sei se acredito muito nisso. Nos contos, o apego ao personagem tanto para o leitor, quanto para o escritor é um pouco mais superficial. A história passa rápido, não há tanto espaço-tempo para a construção de um vínculo mais profundo com a personagem. O que existe é da ordem da identificação mas aquela relação umbilical, figadal, que acontece com algumas personagens se dá mais no romance, acredito. E mais para o leitor do que para o escritor. Ao assistir a primeira temporada da série My Brilliant Friend, na HBO, eu chorei em quase todos os episódios, como se reencontrar Lila e Lenu fosse reencontrar algum parente querido que eu não via há algum tempo. Ainda não publiquei o romance, então não cheguei a passar pelo processo de desapego de Marcelo e Inês, irmãos e protagonistas da história. Vamos ver se, no futuro, depois de publicar o livro, terei saudade deles.


9. Quais são suas principais referências literárias na hora de escrever?

Acho que já mencionei alguns acima. De maneira geral, os realistas me atraem mais. Realista no sentido estético, não necessariamente histórico. Amo a forma, mas gostaria de ser visto mesmo como um contador de histórias. Pontualmente, falo do Machado, do Kundera, da Munro, da Ferrante, do Roth, do McEwan. A lista é longa.


10.Você teria algum segredo de escrita?

Algo que faça com que você se sinta inspirado(a) antes de iniciar a escrita de um novo livro? Sem segredos o negócio é trabalhar. Existem técnicas e muletas do bem: planejar, fazer esquemas, anotar um perfil das personagens. O resto é colocar a mão na massa. O caminho só é trilhado enquanto se trilha. Não existe receita pronta.

11. Você reúne notas, anotações, músicas, filmes e/ou fotografias para se inspirar durante a escrita?

Notas, sim. Planejamento é crucial. De resto, preciso estar no mais absoluto silêncio e sobriedade para escrever. A coleta de repertório vem antes. Uma professora minha uma vez disse: um escritor precisa se encharcar de arte de todos os tipos para poder, com muito esforço, gotear seus textos. Vejam: gotear. Estamos falando de gotículas, coisa pequena. Consumir arte de maneira geral é essencial para o ofício de escritor de artista em geral, aliás.


12. O que você faz para driblar a ausência de criatividade que bate e trava alguns momentos da escrita? Existe algo que você faça para impedir ou driblar esses momentos?

Sou muito disciplinado com tudo o que faço. E a escrita não é exceção. Quando estou escrevendo um livro ou mesmo na escrita das crônicas quinzenais, sou muito rigoroso, quase duro comigo mesmo. Há momentos em que a criatividade flui menos, claro, e é necessário aprender a respeitar o próprio tempo. Mas, de maneira geral, acredito na escrita como ofício: se você realmente se dispuser a escrever, sentar na frente do computador, começar a anotar ideias, a escrita vai vir. Pode não ser o melhor texto do mundo, mas vai.


13. A maioria dos autores possui contatos e amigos de confiana para mostrar o progresso do seu trabalho durante o percurso da escrita. Você teria um time deleitores beta, para analisar seu livro antes de prosseguir com a escrita?

Felizmente conto com amigos (e inimigos!) queridos. Não gosto de forçar a leitura de ninguém, mas muita gente foi generosa ao dar um retorno. Durante a escrita dos contos do Coisa Amor, eu enviei os textos, um a um, a um grupo de amigos. Fiz isso não na expectativa de receber um retorno quando ele vinha, era muito bem-vindo, mas na intenção de me tornar ciente de que, a partir dali, o texto estaria no mundo. Isso dava uma solidez ao texto. De toda forma, acredito que, embora a leitura de amigos seja valiosíssima, o mais importante é contar com o olhar crítico, impessoal e imparcial de um revisor crítico. No caso do Coisa Amor, quem fez o parecer crítico foi a Vanessa Ferrari, do Lugar de Ler. Contar com as colaborações dela foi importantíssimo para que o livro chegasse à forma que tem hoje.


14.Qual a parte mais complicada durante a escrita?

De novo, todas. Mentira. Para um texto longo, acredito que achar uma unidade para o texto. Para um texto curto, é saber quando e como parar. Nos dois casos: a edição. É muito, muito difícil aprender a abrir mão de frases ou ideias. Entre a primeira e a última versão de um texto, é necessário um longo caminho de perdas, cortes e reformulações. O lance é se desapegar do que foi criado, na expectativa de, lapidada a obra, ela resultar melhor e maior.

15. Você prefere escrever diversas páginas por dia durante longas jornadas de escrita ou escrever um pouco todos os dias? O que funciona melhor para você?

Escrever um pouco todos os dias. Primeiro, porque tenho o trabalho na Procuradoria, que é, no final das contas, o que paga as contas e me toma mais tempo. Depois, porque, se fico muito tempo sentado em frente ao computador, minha coluna reclama.


16.Em relação ao mercado literário atual: o que você acha que deve melhorar?

É uma pergunta difícil, não sei se estou preparado para respondê-la. Da minha experiência, sofri muito com a falta de resposta das editoras sobre a análise do meu original. Mas também entendo o lado deles: é muito material para ser lido, não há tempo - tempo físico, cronológico mesmo - para se ler tudo.


17.A maioria das pessoas não consegue se manter ativas em vários projetos, como funciona para você? Você escreve vários rascunhos de diferentes obras ou se mantém até o final durante o processo de um único livro?

Gosto de manter a casa organizada, uma coisa de cada vez. Pretendo logo mais começar a escrever outro romance (ou novela, não sei ainda), então vou ter que me virar para manter a coluna no ar, para não contaminar os textos. O tom das crônicas, que tomo por não-ficção - sou eu ali falando - é muito diferente daquilo que eu quero escrever como ficção.

18. Que conselho você daria para quem está começando agora?

Leia, leia muito. E estude. Não dá para levar a escrita de maneira diletante. Escrever é ofício. Escrever bem é fruto sobretudo de esforço e dedicação. Talento acrescenta, mas não determina o destino de um escritor.

19.Para você, qual é o maior desafio para um autor/a no cenário atual? Você tem algum hábito ou rotina de escrita?

Como disse, sou muito rigoroso. Tento escrever todos os dias, sobretudo se estou dedicado a um projeto mais longo, como o "Coisa Amor". Para escrever o romance, sentei de domingo a domingo, fazendo chuva ou fazendo sol, muitas vezes quase à meia-noite, exausto de um dia de afazeres sem fim. Um dos maiores desafios é ser lido, no final das contas. Alcançar o público, fazer com que a obra chegue até o leitor. É preciso arregaçar muita manga para fazer isso acontecer.

20. Como você enxerga o cenário literário atual e a recepção dos leitores da atualidade em relação aos novos autores?

A literatura contemporânea brasileira tem crescido muito. Que bom. É uma área meio nichada, mas temos ganhado mais espaço. Vejo muita gente massa escrevendo, gente mais velha, mas gente da minha idade também, da minha geração. Muita gente já publicada, mas muita gente ainda a ser publicada. Citar nomes seria injusto com quem não venha a ser citado. O recado é: leiam literatura brasileira contemporânea, gente! É uma experiência sempre grata e surpreendente.


21. Se pudesse indicar quatro obras literárias que te inspiraram, quais seriam?

- A Insustentável Leveza do Ser

- Dois Irmãos

- Dom Casmurro

- a Tetralogia Napolitana


22. Que conselho você daria para quem está começando a escrever o seu primeiro livro?

Não desista. Haverá muitas razões para isso, mas, se você acredita no seu projeto, insista nele mas não faça isso sozinho. Aprenda a entender que comentários negativos ao seu texto não são comentários contra você. Um leitor beta, um parecerista crítico, etc., só querem que seu texto cresça. Não deve haver espaço para melindres. É preciso ser humilde, aprender a ouvir, ser paciente, ponderar, refazer, reescrever.

23. O que esperar para o ano de 2023 em relação à sua escrita?

Sigo com minha coluna de crônicas no Curitiba Cult, com textos de acesso gratuito. Para acompanhar, é só me seguir no Instagram (@pedrojuca_). Além disso, sigo na divulgação do Coisa Amor - inclusive farei o lançamento em São Paulo agora, junho próximo, dia 10, das 16h às 19h, na Livraria Mandarina. O romance eu acho que só sai ano que vem. Estou muito, muito empolgado com o material. Acredito muito nele. Vamos esperar notícias deste próximo capítulo.

[RESENHA #541] Os trabalhadores do mar, de Victor Hugo



Os trabalhadores do mar é um romance escrito pelo escritor, dramaturgo, poeta e ensaísta francês Victor Hugo, durante seu período de exílio, em 1866. A obra é uma relíquia clássica aclamada no mundo contemporâneo por sua escrita única e por suas descrições repletas de simbolismo e sinergia.

o autor nos inicia em sua obra com uma dedicatória que exprime, em resumo, um pouco do enredo ao qual a obra se desdobrará:

Dedico este livro ao rochedo de hospitalidade e de liberdade, a este canto da velha terra normanda onde vive o nobre e pequeno povo do mar, à ilha de Guernesey (ou Guernsey), severa e branda, meu atual asilo, meu provável túmulo.

Já na primeira página da obra, o editor da primeira edição (1866):

A religião, a sociedade, a natureza: tais são as três lutas do homem. Estas três lutas são ao mesmo tempo as suas três necessidades; precisa crer, daí o templo; precisa criar, daí a cidade; precisa viver, daí a charrua e o navio. Mas há três guerras nessas três soluções. Sai de todas a misteriosa dificuldade da vida. O homem tem de lutar com o obstáculo sob a forma superstição, sob a forma preconceito e sob a forma elemento. Tríplice 'ananque' pesa sobre nós, o 'ananque' dos dogmas, o 'ananque' das leis, o 'annque' das coisas. Na Notre-Dame de Paris, o autor denunciou o primeiro; em 'Os Miseráveis', mostrou o segundo; neste livro indica o terceiro. A essas três fatalidades que envolvem o homem, junta-se a fatalidade interior, o 'ananke' supremo, o coração humano.

Contexto histórico:

Após o golpe de Napoleão III em dezembro de 1851, o escritor Victor Hugo decidiu se exilar. Anteriormente, era um fervoroso defensor do sobrinho de Napoleão I, mas passou a demonstrar hostilidade para com o seu antigo aliado, que se tornara Presidente da República. Hugo estabeleceu-se pela primeira vez na ilha de Jersey, onde permaneceu por 3 anos, até que foi forçado a fugir após criticar a Rainha Vitória. Em 1855, ele chegou à pequena ilha de Guernsey, onde viveu por quase 15 anos. Durante esse período, escreveu sua ode ao mar e ao povo de Guernsey, intitulada os trabalhadores do mar.

Resenha

O livro em sua estrutura original é composto por duas partes, intituladas Os Trabalhadores do Mar e O Arquipélago do Canal, uma narrativa de cem páginas de extensão, propicia ao leitor uma imersão na atmosfera das ilhas áridas, subjugadas ao vento e às marés. Esta obra narra os hábitos e costumes de Guernsey, Jersey e Serk, além da história deste arquipélago que não é puramente inglês nem meramente francês. A decoração é, desta forma, delineada. É um lugar destinado aos trabalhadores do mar. A segunda divisão da obra foi removida nesta tradução, mantendo apenas a primeira, os trabalhadores do mar.

O ananque é a personificação do caráter inescapável do destino, ou seja, da fatalidade. Em os trabalhadores do mar , o destino de Gilliatt, o personagem principal, é traçado pela descrição desta linha. Adivinhamos rapidamente que o desfecho só pode ser trágico e Hugo não hesita em semear pistas ao longo do livro.

O enredo inicia-se quando o navio de Mess Lathierry (uma importante figura na ilha de Guernesey, em 1820),  preso sob os comandos do Sr. Clubin, ao tomar conhecimento desse acontecimento, Lethierry faz uma promessa: dará a mão de sua sobrinha, que ele cria como sua filha, para o homem que conseguir resgatar o navio do atoleiro. Gilliatt se oferece e, como consequência, o romance descreve suas experiências em alto mar, incluindo lutas, náufrago, exílio e lutas. Os Trabalhadores do Mar é narra um período histórico pós guerras napoleônicas, abordando também o impacto da Primeira Revolução Industrial na citada ilha.

Gilliatt, um homem mal visto por todos na ilha, mas extremamente bondoso e caridoso, decide tomar para si a missão de ir em busca da realização do sonho do casamento com sua amada, mesmo que o caminho seja tenebroso e repleto de perigos e aventuras perigosas. As descrições construídas por Victor Hugo nos levam para o alto mar, para os perigos que se escondem nas águas, para a coragem de um homem, para o amor que alimenta toda rota marítima, e para todo sofrimento que se ocasiona pelo fruto de sua decisão. A obra é a menos conhecida do autor, porém, vem recebendo diversas adaptações e novas reimpressões. No Brasil, esta obra foi relançada pela editora Unesp, com uma tradução belíssima por Jorge Coli.

O livro possui diversos panos centrais de desenvolvimento da narrativa, como mentiras, traições, trapaças, medo, desenvolvimento do período, descrições peculiares de personagens, e por ultimo, o desenvolvimento do personagem central da narrativa, Gilliatt.

Os trabalhadores do mar é uma obra-prima da literatura francesa. Esta obra capta a essência da luta de um homem contra as forças da natureza e a beleza das paisagens da ilha. É um romance intenso e emocionante, que nos leva a um mundo de emoção e aventura. Esta obra merece ser lida e apreciada por todos os amantes da literatura.

[RESENHA #540] A obra, de Émile Zola


O décimo livro da série francesa, escrito por Émile Zola em 1886, foi publicado em partes no periódico Gil Blas no mesmo ano. A obra foi traduzida para o inglês por Ernest A. Vizetelly, mas quando foi publicada pela Barnes & Noble em 2006, tinha visto apenas algumas edições e traduções em todo o mundo. Os críticos consideraram a tradução extremamente intelectual, tornando a obra menos acessível em comparação com a edição de 1957 publicada por Thomas Walton. Agora a obra terá nova tradução para o português pela Unesco, que busca publicar os grandes clássicos mundiais.

É essencial compreender a mensagem que Zola tentou transmitir ao escrever este livro. Seu objetivo era mostrar a importância dos traços herdados em nossas vidas. 

A história gira em torno de um homem que perdeu a mãe quando criança, casou-se com Christine, enfrentou a pobreza, presenciou o fracasso de perto e cometeu um ato impensado devido ao seu medo e insegurança. Ao longo do livro, conhecemos personagens de outras obras de Zola, o que torna a leitura ainda mais agradável para os fãs da autora.

Zola e Cézanne eram amigos desde a infância em Aix-en-Provence, cidade que serviu de inspiração para Plassans na obra de Zola. O protagonista Claude Lantier, cujo autor é Zola, é baseado em artistas revolucionários, entre eles Cézanne, incompreendidos pela sociedade da época. Monet, Manet e Cézanne foram alguns dos artistas que influenciaram os traços de caráter de Claude. Além disso, Pierre Sandoz é um personagem fictício baseado em Zola.

O romance se passa no século XIX e aborda o mundo boêmio da arte parisiense. Ele também examina o surgimento do realismo, do naturalismo e do impressionismo na pintura. Zola enfatiza a escultura, a literatura, a arquitetura, a música e o jornalismo do período, bem como a comercialização da arte. Retrata a vida artística de Paris com base em personagens reais, como artistas, escritores, negociantes de arte e amigos pessoais.

O título do livro “A Obra” refere-se aos esforços do personagem principal Claude Lantier para pintar uma grande obra que refletisse seu talento e genialidade.

Considero essa fase uma das mais fortes: a escrita é forte, com imagens terríveis sem esconder nada, inclusive as coisas mais tristes. É Zola no seu melhor, um romance que desperta emoções e nos deixa com uma ansiedade constante. É incrivelmente bem escrito, mas é brutal e trágico (sabemos desde o início que o final será ruim, as teorias pseudomédicas em que se baseia o ciclo do romance não deixam dúvidas).

Claude Lantier é essencialmente um artista. Enquanto caminha com a esposa, ele vê o mundo como uma tela pronta para ser pintada. Zola descreve tudo de forma impressionante usando luz, sombras e cores, como se fossem obras de arte. Desde o primeiro capítulo ele nos apresenta uma Paris quase misteriosa iluminada por uma tempestade. O realismo desaparece diante da visão do criador e transforma o mundo numa obra de arte.

Claude é um personagem que prefere a arte à realidade. Sandoz, amigo escritor de Zola, observa que no passado a natureza era mais bela que a pintura, mas agora muitas pinturas a superam. O grande desafio é retratar a realidade com a maior precisão possível. Claude quer ir além do que a natureza oferece e cria símbolos que tornam uma obra de arte incompreensível.

Claude deixa suas emoções e desejos fluírem para a tela. Suas pinturas são uma expressão direta de seus sentimentos. No entanto, a arte às vezes substitui a realidade. Claude admite que prefere a imagem de Christine à dela. Zola usa uma linguagem sensual ao falar sobre as mulheres retratadas por Claude. Ele explica que seus relacionamentos com as mulheres na vida real são complicados e que ele não se sente atraído por elas. Christine gradualmente começa a ver a pintura como uma rival e desenvolve ciúme.

No entanto, a arte se torna uma obsessão louca para Claude. Os capítulos finais são sombrios: o pintor perde o controle da realidade, é atormentado pela tela em que trabalhou durante anos e se transforma em um fantasma possuído pela pintura. Ele acredita ter ouvido uma mulher meio pintada chamando por ele. Chega assim ao ápice da loucura: tudo é sacrificado em nome da arte, em nome da imagem que é sinônimo de loucura.

A obra se constrói como um jogo de espelhos: o segundo capítulo encontra o décimo primeiro e penúltimo. Ambos mostram jantar com amigos de infância. Na primeira cena, eles são amigos de verdade, compartilhando preocupações, visões de arte e uma infância comum. Na segunda cena, eles se separam, negando o passado, alimentando-se do ódio um do outro, irritados por não terem alcançado seus objetivos, por não terem feito suas grandes obras, por não terem lutado por seu lugar no mundo . O fracasso é uma experiência partilhada por todos, mas apenas Sandoz e Claude continuam amigos.

Essa cena trágica faz parte de um desfecho marcado pelo espectro da morte que permeia quase toda a última parte do livro. Outros exemplos incluem a morte de um filho, a morte de dois personagens principais, a morte da amizade, a morte das ambições artísticas e dos sonhos de grandeza, a morte da paixão criativa. Até o destino da pintura de Claude é pior que o do Salon des Refusés no início do romance: já havia sido visto, comentado, mas no final foi como se não existisse mais, nem mesmo seus amigos pudessem encontrar isto.

É uma leitura sensível que requer atenção. É um clássico que nos transporta para o mundo da arte e nos faz pensar nas experiências e desafios que os artistas enfrentam.

O AUTOR

Émile Édouard Charles Antoine Zola - 2 de abril de 1840 - 29 de setembro 1902) foi um romancista, jornalista, dramaturgo francês, o mais conhecido praticante da escola literária do naturalismo e um importante contribuinte para o desenvolvimento do naturalismo teatral . Ele foi uma figura importante na liberalização políticada França e na exoneração do oficial do exército falsamente acusado e condenado Alfred Dreyfus , que está encapsulado em sua renomada opinião de jornal intitulada J'Accuse…!   Zola foi nomeado para o primeiro e segundo Prêmio Nobel de Literatura em 1901 e 1902.
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