Estimar a quantidade exata de livros gerados diariamente por IA é um desafio devido à falta de dados centralizados e à natureza descentralizada da autopublicação. No entanto, análises baseadas em reportagens e tendências públicas oferecem uma visão aproximada. Em 2023, a Reuters relatou que mais de 200 livros na loja Kindle da Amazon listavam o ChatGPT como coautor, apenas três meses após o lançamento público da ferramenta em novembro de 2022. Esse número, embora pequeno frente ao total de títulos na plataforma, reflete apenas os casos em que a IA foi explicitamente mencionada, sugerindo que o volume real é significativamente maior.
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Imagem: Pixabay |
A capacidade de produção da IA é limitada apenas pelo tempo de processamento e pela criatividade dos prompts fornecidos pelos usuários. Tutoriais no YouTube e TikTok, amplamente documentados por outlets como o Núcleo Jornalismo em agosto de 2023, mostram que um único indivíduo pode criar um e-book de 100 a 200 páginas em menos de 24 horas. Considerando a popularidade dessas técnicas — com vídeos alcançando dezenas de milhares de visualizações — e a escala global de usuários, especialistas estimam que milhares de livros podem ser gerados diariamente. Um artigo da Publishers Weekly de janeiro de 2025 sugeriu que, em plataformas de autopublicação como o Kindle Direct Publishing (KDP), a produção diária de títulos gerados por IA poderia estar na casa das centenas a milhares, dependendo da demanda sazonal e do número de "autores" ativos utilizando essas ferramentas.
Mary Rasenberger, diretora da Authors Guild, em entrevista à Reuters em fevereiro de 2023, alertou que "esses livros vão inundar o mercado", apontando para uma produção exponencial impulsionada pela facilidade de uso da IA. Se assumirmos conservadoramente que 1.000 usuários produzam um livro por dia — um número plausível dado o alcance global da tecnologia —, a estimativa diária poderia facilmente ultrapassar essa marca, chegando a 2.000 ou 3.000 títulos em dias de pico, como períodos promocionais da Amazon.
Impacto do Excesso de Livros Gerados por IA
O excesso de livros gerados por IA tem impactos profundos no mercado editorial, afetando autores, leitores e a própria estrutura da indústria. Um dos principais efeitos é a saturação do mercado. Com milhares de novos títulos inundando plataformas diariamente, a visibilidade de obras tradicionais diminui, especialmente para autores independentes que dependem de algoritmos de recomendação. Um relatório da Câmara Brasileira do Livro (CBL) de dezembro de 2023 destacou que o aumento de publicações de baixa qualidade poderia reduzir em até 15% as vendas de editoras tradicionais no Brasil, um reflexo do que já ocorre globalmente.
Outro impacto significativo é a desvalorização do trabalho criativo humano. Livros gerados por IA, muitas vezes produzidos com custo mínimo e esforço reduzido, competem diretamente com obras que demandam meses ou anos de dedicação. Caitlyn Lynch, escritora freelancer, disse ao TechRadar em 2024 que "o uso da IA como substituto total da escrita humana dificilmente terá consequências positivas", exceto para os "autores" que lucram rapidamente. Isso cria uma pressão econômica sobre escritores profissionais, especialmente em gêneros comerciais como romance e autoajuda, onde a IA prolifera.
A qualidade do conteúdo também é uma preocupação. Reportagens como "The AI Book Boom" da NPR (janeiro de 2025) apontam que muitos livros gerados por IA são repetitivos, carecem de profundidade emocional e contêm erros factuais ou narrativos. Isso pode frustrar leitores e minar a confiança nas plataformas de autopublicação. Além disso, há riscos específicos em nichos como guias de viagem e manuais técnicos, onde informações imprecisas — como conselhos "potencialmente perigosos" em livros sobre cogumelos, conforme denunciado pelo The New York Times em 2023 — podem ter consequências reais.
Por fim, o excesso de livros impacta os sistemas de remuneração. No Kindle Unlimited, onde autores são pagos por páginas lidas, a proliferação de obras curtas e baratas geradas por IA dilui os ganhos dos escritores legítimos. Um artigo do Motherboard (junho de 2023) revelou que "click farms" usavam livros nonsense de IA para manipular rankings, reduzindo os royalties de autores humanos.

Foto: Pixabay

A Amazon Kindle, por meio do Kindle Direct Publishing (KDP), é o epicentro da revolução dos livros gerados por IA. Desde 2007, o KDP permite que qualquer pessoa publique e venda livros digitais, resultando em um catálogo de mais de 1,4 milhão de títulos até 2023, segundo a StartSe University. A plataforma responde por cerca de 80% das vendas de e-books nos EUA, conforme o mesmo levantamento, tornando-a um termômetro do impacto da IA no setor.
A presença de livros gerados por IA na Kindle ganhou notoriedade em 2023, quando o Núcleo Jornalismo identificou ao menos 59 títulos em português criados com ferramentas como ChatGPT na Amazon brasileira. Nos EUA, o problema escalou rapidamente: em junho de 2023, a lista de best-sellers de romances jovens adultos do Kindle Unlimited foi dominada por dezenas de obras geradas por IA, conforme denunciado por Caitlyn Lynch no X e reportado pelo Jornal.AI. Em resposta, a Amazon implementou medidas como o limite de três livros por dia por autor em setembro de 2023 e a exigência de divulgação de conteúdo gerado por IA, mas o volume continuou a crescer.
Estimar a porcentagem exata de livros gerados por IA na Kindle é complicado pela falta de transparência, já que a Amazon não publica dados oficiais e muitos "autores" não declaram o uso de IA, apesar das regras. No entanto, análises indiretas fornecem pistas. Caitlyn Lynch afirmou ao TechRadar em 2024 que 81% dos 100 livros mais vendidos na categoria "Romance Contemporâneo" eram de origem artificial, uma tendência confirmada por posts no X em fevereiro de 2024. Considerando o catálogo total do KDP, especialistas como Benji Smith, citado pelo Olhar Digital em agosto de 2023, sugerem que a média geral pode estar entre 5% e 10%, com picos mais altos em gêneros populares como romance, ficção científica e autoajuda.
Um cálculo aproximado baseado em reportagens indica que, dos 1,4 milhão de títulos no KDP em 2023, entre 70.000 e 140.000 poderiam ser gerados por IA até março de 2025, assumindo um crescimento constante desde os 200 casos identificados em 2023. Essa faixa — equivalente a 5% a 10% — reflete a rápida adoção da tecnologia, mas pode subestimar a realidade, dado o número de obras não declaradas.
A geração diária de livros por IA, possivelmente na casa dos milhares, reflete o poder e a acessibilidade da tecnologia, mas também expõe os desafios de um mercado editorial saturado. O impacto do excesso dessas obras é sentido na desvalorização do trabalho humano, na queda da qualidade e na pressão econômica sobre autores tradicionais. Na Amazon Kindle, onde a IA já marca presença significativa, com uma média estimada de 5% a 10% dos títulos, a plataforma tenta conter o problema com regulamentações, mas enfrenta dificuldades para acompanhar o ritmo da produção. À medida que a IA continua a evoluir, o futuro da literatura dependerá de como a indústria equilibrará inovação e autenticidade, garantindo espaço tanto para máquinas quanto para a criatividade humana.
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