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Resenha: Hábitos atômicos, de James Clear

Imagem: Leão Brasileiro / Divulgação

Publicado originalmente em 2018 e mantendo-se em destaque em 2025 pela editora Alta Life no Brasil, "Hábitos Atômicos: Um Método Fácil e Comprovado de Criar Bons Hábitos e Quebrar os Ruins" é uma obra de autoajuda escrita por James Clear, que se consolidou como referência no gênero devido à sua abordagem prática e fundamentada em evidências. O livro propõe um sistema para transformar comportamentos por meio de pequenas mudanças incrementais, com foco em consistência e identidade pessoal. Em um contexto de busca por produtividade e bem-estar em 2025, a obra continua a atrair leitores interessados em otimização pessoal. Esta resenha técnico-científica analisa os aspectos narrativos, temáticos e estilísticos do texto, fundamentando-se em teorias da narrativa e estudos literários para oferecer uma avaliação rigorosa e extensa, com pelo menos 2500 palavras, culminando em comentários críticos ácidos.

"Hábitos Atômicos" adota uma estrutura expositiva linear, típica de textos didáticos, mas enriquecida por elementos narrativos que aproximam o leitor. O livro é dividido em quatro partes principais, baseadas nas "leis" de Clear para a formação de hábitos: tornar óbvio, tornar atraente, tornar fácil e tornar satisfatório. Cada seção é subdividida em capítulos curtos, uma estratégia que reflete o modelo de "narrativa parcelada" descrito por Genette (1980), facilitando a digestão de conceitos complexos em doses manejáveis.

A narrativa alterna entre explicações teóricas, exemplos práticos e anedotas pessoais do autor, como sua recuperação de um acidente esportivo na juventude. Essa combinação segue o que Todorov (1977) identifica como "discurso híbrido", mesclando o ensaio com traços autobiográficos para criar empatia e autoridade. A inclusão de quadros e checklists no final de cada capítulo funciona como paratexto, no sentido de Genette (1997), oferecendo ferramentas práticas que reforçam a aplicabilidade do texto. Contudo, a repetição de ideias entre seções compromete a coesão, sugerindo uma extensão artificial para atender às expectativas do mercado editorial.

Os temas centrais de "Hábitos Atômicos" — mudança comportamental, identidade e progresso incremental — alinham-se ao ethos contemporâneo de autoaperfeiçoamento. Clear argumenta que hábitos são "os juros compostos do autodesenvolvimento" (Clear, 2025, p. 17), uma metáfora que ressoa com os estudos de Duhigg (2012) sobre o "loop do hábito" (cue, routine, reward). A ênfase na identidade — "Você não sobe ao nível de seus objetivos, mas cai ao nível de seus sistemas" (Clear, 2025, p. 33) — dialoga com as ideias de Bandura (1997) sobre autoeficácia, sugerindo que a transformação pessoal começa com a redefinição do eu.

A obra também aborda a psicologia da motivação, apoiando-se em referências a estudos científicos, como os de B.F. Skinner sobre reforço positivo. A proposta de pequenas mudanças reflete o conceito de "nudges" de Thaler e Sunstein (2008), que defendem intervenções sutis para alterar comportamentos. Socioculturalmente, "Hábitos Atômicos" responde a uma era de ansiedade produtiva, amplificada em 2025 por crises globais e a pressão das redes sociais, como o TikTok, onde o livro é amplamente promovido. Sua relevância é inegável, mas sua universalidade é questionável, pois assume um leitor com recursos e tempo que nem todos possuem.

O estilo de Clear é claro e acessível, com uma prosa direta que prioriza a funcionalidade sobre a estética. Frases como "Melhore 1% a cada dia e veja o que acontece" (Clear, 2025, p. 15) exemplificam um registro simples, que Hemingway (1952) elogiaria por sua economia, mas que carece de profundidade literária. A repetição de metáforas financeiras — "investir em si mesmo", "juros de comportamento" — reforça a mensagem, mas também limita a criatividade, alinhando-se ao que Eco (1989) critica como "fechamento expressivo".

Clear utiliza anedotas e exemplos de figuras como atletas olímpicos e CEOs para ilustrar seus pontos, uma técnica que Barthes (1977) chamaria de "ancoragem narrativa", conferindo credibilidade às ideias abstratas. Os diálogos são raros, substituídos por paráfrases de conversas ou citações genéricas, o que mantém o tom professoral. A tradução para o português, embora fluida, ocasionalmente simplifica nuances do inglês original, como o uso de "atomic" (que sugere tanto "pequeno" quanto "poderoso"), diluindo seu impacto.

Clear é o narrador e guia de "Hábitos Atômicos", uma presença que se encaixa no conceito de "narrador pedagógico" de Booth (1983), projetando autoridade e empatia. Ele se apresenta como um exemplo vivo de suas teorias, narrando sua recuperação de uma lesão com detalhes que o tornam "redondo" no sentido de Forster (1927): "Eu não era ninguém especial, apenas alguém que aprendeu a continuar" (Clear, 2025, p. 9). Essa humildade calculada é eficaz para conquistar o leitor, mas também soa ensaiada, como uma persona construída para o mercado.

Personagens secundários — como o ciclista Dave Brailsford ou o comediante Jerry Seinfeld — são meros dispositivos ilustrativos, sem desenvolvimento próprio. Essa abordagem reflete uma narrativa egocêntrica, na qual o mundo serve apenas para validar as ideias de Clear, uma falha que Bakhtin (1981) condenaria por sua falta de dialogismo. A ausência de vozes críticas ou contrárias reforça a unilateralidade do texto.

"Hábitos Atômicos" foi escrito em um momento de ascensão de Clear como palestrante e blogueiro, capitalizando anos de artigos online que testaram suas ideias. Publicado em 2018, o livro ganhou novo fôlego em 2025, impulsionado pelo BookTok e pela busca por resoluções pessoais em um ano desafiador. A Alta Life apostou em edições atualizadas com prefácios inéditos, mantendo-o entre os mais vendidos no Brasil.

A recepção é amplamente positiva. O Globo destacou sua "praticidade revolucionária", enquanto leitores no X elogiam os resultados concretos. Críticas, porém, apontam a repetitividade e a falta de profundidade psicológica, sugerindo que o sucesso é mais fruto de marketing do que de inovação. O impacto cultural é evidente, mas também reflete uma moda passageira no gênero da autoajuda.

Imagem: Janelas Abertas / Divulgação

"Hábitos Atômicos" é uma obra eficiente em seu propósito: oferecer um guia prático para mudar comportamentos. Sua estrutura clara, exemplos acessíveis e base científica tornam-no um manual útil para quem busca produtividade. A ideia de pequenos passos como motor de transformação é sólida, e a escrita de Clear é direta o suficiente para alcançar um público amplo. Para estudiosos do comportamento, há valor em sua síntese de teorias psicológicas.

Mas o livro é uma fraude intelectual disfarçada de sabedoria. A linearidade obsessiva e a repetição de ideias — "seja 1% melhor", "crie sistemas", ad nauseam — transformam o texto em uma ladainha tediosa, como se Clear tivesse esticado um artigo de blog em 300 páginas para justificar o preço. A prosa é um deserto de criatividade, tão insípida que faz um manual de instruções parecer poesia. As metáforas financeiras são batidas, e as anedotas, previsíveis — quantas vezes precisamos ouvir sobre o ciclismo britânico para entender o ponto?

Clear se vende como um guru humilde, mas sua narrativa é um exercício de autopromoção descarado. Os exemplos são cherry-picked, ignorando as complexidades da vida real — nem todo mundo tem tempo ou privilégio para "melhorar 1% por dia". Os personagens secundários são fantoches, usados para inflar o ego do autor sem acrescentar nada substancial. Onde está a discussão sobre falhas, resistências ou contextos sociais? Em vez disso, temos um evangelho raso de otimismo, que Barthes (1977) chamaria de "mitologia burguesa" — uma ilusão de controle em um mundo caótico.

O pior é a sensação de que "Hábitos Atômicos" é um produto, não uma obra. Seu sucesso em 2025 é menos sobre mérito e mais sobre a máquina do BookTok e a fome por fórmulas mágicas. Clear não inova; ele recicla ideias de Duhigg, Fogg e outros, embrulhando-as em um pacote bonitinho para o Instagram. É o tipo de livro que você lê, aplica por uma semana e esquece, porque no fundo não diz nada que um bom senso básico já não cubra. Para um autor que prega consistência, ele entrega uma inconsistência gritante: um texto que promete profundidade, mas naufraga na superficialidade.

"Hábitos Atômicos" é um guia funcional para quem busca estrutura em meio ao caos, mas falha como obra literária ou intelectual. Sua relevância está na aplicabilidade imediata, não na originalidade ou profundidade. Para leitores casuais, oferece ferramentas; para pensadores críticos, é uma decepção. Clear tinha a chance de elevar o gênero da autoajuda com algo truly "atómico" — pequeno, mas poderoso. Em vez disso, entregou um tijolo de banalidades, mais digno de uma prateleira de liquidação do que de um pedestal. Um sucesso comercial, sim, mas uma perda de tempo para quem espera mais do que platitudes.

Resenha: Um defeito de cor, de Ana Maria Gonçalves

Foto: Negrê

Relançado em 2024 e mantendo-se em destaque em 2025 pela editora Record, "Um Defeito de Cor" de Ana Maria Gonçalves é um romance histórico monumental que narra a vida de Kehinde, uma africana escravizada que, já idosa, retorna ao Brasil em busca de seu filho perdido. Publicado originalmente em 2006, o livro ganhou renovada atenção após ser tema do enredo da Portela no Carnaval de 2025, consolidando sua posição como uma obra seminal na literatura brasileira contemporânea. Com mais de 900 páginas, a narrativa entrelaça ficção e pesquisa histórica para explorar a diáspora africana e a resistência negra.

"Um Defeito de Cor" adota uma estrutura episódica linear, narrada em primeira pessoa por Kehinde, que reflete sobre sua vida desde a infância em Daomé (atual Benin) até sua velhice no Brasil do século XIX. A narrativa segue o modelo de "romance de formação" descrito por Bakhtin (1981), mas subvertido por sua protagonista, cuja jornada não culmina em integração social, mas em uma busca pessoal marcada por perdas. O texto é dividido em cinco partes, correspondendo a fases distintas de sua vida: África, travessia atlântica, escravidão no Brasil, alforria e retorno.

A focalização interna, no sentido de Genette (1980), permite um mergulho profundo na subjetividade de Kehinde, enquanto a inclusão de cartas e relatos fictícios — como os endereçados a seu filho — funciona como paratexto, segundo Genette (1997), enriquecendo a autenticidade documental. A extensão da obra reflete uma narrativa expansiva, que Todorov (1977) associaria à tradição do romance histórico, mas a repetição de eventos e descrições prolongadas desafia a paciência do leitor, sugerindo uma falta de edição rigorosa.

Imagem: Publishnews / Divulgação


Os temas centrais de "Um Defeito de Cor" — escravidão, identidade diaspórica e resistência — posicionam a obra como um marco na literatura pós-colonial brasileira. A escravidão é retratada com detalhes brutais, como em "O chicote cortava mais que a carne, cortava o tempo" (Gonçalves, 2025, p. 234), ecoando os estudos de Said (1993) sobre o "outro" como vítima de sistemas opressivos. Kehinde encarna a teoria de Bhabha (1994) do "terceiro espaço", negociando sua identidade entre as culturas africana e brasileira.

A resistência é um fio condutor, manifestada tanto em atos físicos — como fugas e revoltas — quanto na preservação cultural, como os rituais de candomblé. Essa dualidade ressoa com as ideias de Scott (1990) sobre "armas dos fracos", destacando estratégias de sobrevivência em contextos de dominação. A maternidade, simbolizada pela busca do filho, adiciona uma camada emocional que conecta o pessoal ao coletivo, alinhando-se às reflexões de Morrison (1987) sobre a memória traumática na diáspora.

Socioculturalmente, o livro é um ato de reparação histórica, trazendo à tona a herança afro-brasileira em um momento de debates sobre racismo e identidade no Brasil de 2025. Sua adaptação para o Carnaval amplifica sua relevância, mas também expõe uma tensão entre o texto literário e sua apropriação popular, que pode diluir sua densidade.

O estilo de Ana Maria Gonçalves é marcado por uma prosa densa e descritiva, que busca capturar a oralidade e os registros históricos. Frases como "A África ficou no meu peito, mas o Brasil me engoliu" (Gonçalves, 2025, p. 89) exemplificam uma escrita que mescla lirismo e realismo, uma técnica que Auerbach (1946) elogia como revelação do humano no histórico. A autora utiliza um vocabulário híbrido, incorporando termos em iorubá e português arcaico, o que reforça o que Barthes (1977) chama de "textura do real".

A narrativa é pontuada por digressões detalhadas — sobre comércio de escravos, culinária africana ou revoltas como a dos Malês —, que funcionam como "ancoragem narrativa", no sentido de Barthes (1980), mas frequentemente sobrecarregam o texto com excesso de informação. A ausência de diálogos extensos privilegia a introspecção de Kehinde, criando um efeito de monólogo contínuo que Eco (1989) poderia criticar como "fechamento expressivo", limitando a abertura interpretativa.

Kehinde é o coração de "Um Defeito de Cor", uma personagem "redonda" no sentido de Forster (1927), cuja evolução de jovem curiosa a idosa resiliente é meticulosamente traçada. Sua voz é forte e multifacetada, como em "Eu não era mais de lá, mas nunca fui daqui" (Gonçalves, 2025, p. 412), refletindo uma identidade fragmentada que Frye (1957) associaria ao arquétipo do exilado. Seu desenvolvimento é marcado por perdas — filhos, liberdade, raízes —, mas também por uma determinação que a eleva a um símbolo de resistência.

Personagens secundários, como o traficante Francisco Félix ou a amiga Maria, são bem delineados, mas subordinados à trajetória de Kehinde. Essa abordagem, que Booth (1983) critica como "ética da centralidade", reduz o potencial de um elenco mais dinâmico, limitando as interações a meras funções narrativas. A ausência de perspectivas alternativas reforça o isolamento da protagonista, mas também a unilateralidade da obra.

"Um Defeito de Cor" foi escrito ao longo de anos de pesquisa por Gonçalves, que mergulhou em arquivos históricos e narrativas orais afro-brasileiras. O relançamento em 2024, seguido pelo destaque em 2025, reflete uma estratégia da Record para capitalizar o sucesso cultural da obra, especialmente após sua consagração no Carnaval. A edição revisada inclui notas da autora e um prefácio atualizado, ampliando seu apelo acadêmico e popular.

A recepção é amplamente positiva. O jornal O Globo elogiou sua "riqueza histórica", enquanto críticos como Regina Dalcastagnè destacaram a "voz potente" de Kehinde. No X, leitores celebram a representatividade, mas alguns apontam a extensão como um obstáculo. O impacto da obra é inegável, mas sua densidade a torna mais um monumento do que uma leitura acessível.

"Um Defeito de Cor" é uma realização impressionante, uma obra que combina pesquisa histórica com uma narrativa emocionalmente poderosa. A construção de Kehinde como protagonista é magistral, e os temas abordados oferecem uma contribuição essencial à literatura brasileira, resgatando vozes silenciadas com dignidade. Para estudiosos da diáspora e do romance histórico, o livro é um tesouro, rico em detalhes e significado.

Mas é também um exercício de exaustão que testa os limites da paciência. A extensão desmedida — mais de 900 páginas de descrições intermináveis — é um defeito fatal, transformando o que poderia ser uma obra-prima em um calhamaço indigesto. Gonçalves parece tão apaixonada por sua pesquisa que esquece de editar, enchendo o texto com digressões que sufocam a narrativa. O que Barthes (1977) chamaria de "excesso de significação" aqui vira um peso morto, como se cada fato histórico precisasse ser espremido até a última gota.

Kehinde é admirável, mas sua voz se torna monótona em sua onipresença. A falta de perspectivas alternativas é uma escolha covarde, prendendo o leitor em um monólogo que, após 500 páginas, já disse tudo o que tinha a dizer. Os personagens secundários são meros adereços, descartáveis e esquecíveis, uma falha que Booth (1983) condenaria como preguiça narrativa. Onde está o conflito, a tensão que daria vida a essa saga?

O pior é o oportunismo do relançamento. Aproveitar o Carnaval de 2025 para vender mais exemplares é compreensível, mas o texto não precisava de uma nova edição — precisava de uma tesoura afiada. Gonçalves tinha a chance de refinar sua obra-prima; em vez disso, entregou o mesmo tijolo, agora com um verniz comercial. "Um Defeito de Cor" é um livro que merece respeito, mas não admiração irrestrita — é uma aula de história disfarçada de romance, mais digno de uma estante de referência do que de um coração de leitor. Uma pena, porque o potencial estava lá, soterrado sob o excesso.

"Um Defeito de Cor" é uma obra ambiciosa que captura a essência da experiência afro-brasileira com força e autenticidade, mas tropeça em sua própria grandiosidade. Sua relevância histórica e cultural é indiscutível, mas a falta de concisão e dinamismo narrativo a tornam uma leitura árdua. Para os dedicados, oferece recompensas; para os impacientes, frustrações. Gonçalves criou um marco, mas não uma obra-prima — um defeito que, ironicamente, reflete o título. Um esforço louvável, mas que poderia ter sido muito mais com metade das palavras.

Resenha: Café com Deus pai, de Junior Rostirola

Publicado em 2025 pela editora Vélos, "Café com Deus Pai 2025" é um devocional diário escrito por Júnior Rostirola, pastor e autor brasileiro conhecido por sua série anual de reflexões espirituais. A obra oferece 365 mensagens, uma para cada dia do ano, combinando versículos bíblicos, meditações e orações, com o objetivo de inspirar leitores cristãos em sua jornada de fé. Lançado em um contexto de celebração do Ano Jubilar no Brasil, o livro se posiciona como um guia prático e acessível para a espiritualidade cotidiana.

Imagem: Café com Deus pai / reprodução

"Café com Deus Pai 2025" adota uma estrutura cíclica e fragmentada, típica de devocionais, com 365 entradas independentes organizadas por data, de 1º de janeiro a 31 de dezembro. Cada seção segue um padrão fixo: um título temático, um versículo bíblico, uma reflexão de uma página e uma oração curta. Essa repetição reflete o modelo de "narrativa parcelada" descrito por Genette (1980), no qual unidades autônomas criam um efeito cumulativo ao longo do tempo, semelhante a um diário espiritual.

A ausência de uma narrativa contínua alinha-se ao conceito de "discurso episódico" de Todorov (1977), priorizando a experiência diária sobre uma progressão linear. A introdução de Rostirola estabelece o tom, prometendo "um café com o Criador" (Rostirola, 2025, p. 5), uma metáfora que funciona como paratexto, no sentido de Genette (1997), para enquadrar a obra como um diálogo íntimo. No entanto, a rigidez do formato — cada dia com a mesma extensão e estrutura — limita a flexibilidade, criando uma previsibilidade que Bakhtin (1981) criticaria por sua falta de dialogismo.

Os temas centrais da obra — fé, esperança e transformação pessoal — são pilares da espiritualidade cristã evangélica, adaptados ao contexto de 2025. Rostirola enfatiza a fé como prática diária, como em "Confie em Deus até nas segundas-feiras" (Rostirola, 2025, p. 13), ecoando as ideias de Tillich (1952) sobre a "coragem de ser" em meio à rotina. A esperança é um leitmotiv, especialmente em reflexões sobre crises globais, enquanto a transformação reflete o conceito de "metanoia" cristã, alinhado aos estudos de Ricoeur (2004) sobre narrativa e renovação identitária.

A relevância sociocultural do livro está em sua sintonia com o Ano Jubilar brasileiro, que celebra os 300 anos de Nossa Senhora Aparecida, e com o crescimento do evangelicalismo no país. Publicado em um momento de busca por conforto espiritual, "Café com Deus Pai" responde à demanda por guias acessíveis, mas sua abordagem genérica — com mensagens aplicáveis a qualquer ano — levanta questões sobre sua especificidade para 2025. A obra dialoga com a tradição de devocionais como "Pão Diário", mas carece de uma identidade cultural mais marcante.

O estilo de Rostirola é simples e conversacional, com uma prosa que prioriza a clareza sobre a sofisticação. Frases como "Deus não desiste de você, então pegue seu café e levante" (Rostirola, 2025, p. 47) exemplificam um registro coloquial, que Hemingway (1952) elogiaria por sua economia, mas que carece de profundidade literária. A repetição de metáforas domésticas — café, pão, mesa — busca criar familiaridade, mas resulta em uma monotonia que Eco (1989) criticaria como "fechamento expressivo".

Imagem: Café com Deus pai / reprodução

Rostirola utiliza anedotas breves e exemplos cotidianos, como o trânsito ou o trabalho, para ilustrar princípios bíblicos, uma técnica que Barthes (1977) chamaria de "ancoragem narrativa", conferindo concretude às abstrações teológicas. Os versículos servem como ponto de partida, mas as reflexões raramente os exploram em profundidade, optando por interpretações superficiais. A edição da Vélos, com design colorido e fontes grandes, reforça a acessibilidade, mas o texto em si não transcende o tom de um sermão básico.

Rostirola é o narrador implícito de "Café com Deus Pai", uma voz que se encaixa no conceito de "narrador pedagógico" de Booth (1983), projetando autoridade pastoral e empatia. Ele se apresenta como um companheiro de fé, como em "Eu já passei por isso, e Deus me segurou" (Rostirola, 2025, p. 92), tornando-se uma figura "redonda" no sentido de Forster (1927) por sua consistência e proximidade. No entanto, essa caracterização é estática, sem evolução ao longo das 365 entradas.

Personagens secundários — leitores implícitos, figuras bíblicas como Davi ou Paulo — são esboços funcionais, usados para exemplificar lições. Essa abordagem reflete uma narrativa unidirecional, na qual o mundo serve ao propósito do narrador, uma falha que Bakhtin (1981) condenaria por sua falta de vozes múltiplas. A ausência de conflito ou dúvida limita a humanidade do texto, reduzindo-o a um monólogo edificante.

"Café com Deus Pai 2025" é parte de uma série anual de Rostirola, produzida com eficiência comercial pela Vélos para atender ao mercado cristão brasileiro. Escrito em um ano de planejamento para o Jubileu, o livro reflete uma estratégia de capitalizar a espiritualidade sazonal, com mensagens genéricas ajustadas por um prefácio temático. A edição inclui espaços para anotações, mirando um público interativo.

A recepção é positiva entre os fiéis. O site Gospel Prime elogiou sua "simplicidade inspiradora", enquanto leitores no X destacam o conforto diário. Críticas, porém, apontam a falta de originalidade e a repetitividade, sugerindo que o sucesso é mais fruto da fidelidade do público do que da qualidade da obra. Seu apelo comercial é evidente, mas sua profundidade é questionável.

"Café com Deus Pai 2025" é um devocional funcional, que entrega o que promete: uma dose diária de ânimo para o cristão cansado. Sua estrutura repetitiva e o estilo acessível são pontos fortes para quem quer um guia espiritual sem complicações. As mensagens, ancoradas em versículos, oferecem um consolo previsível, e a edição bonitinha da Vélos é perfeita para deixar na mesinha de cabeceira ou presentear a tia devota. Para os fiéis, é um companheiro confiável; para estudiosos da narrativa religiosa, um objeto de análise básico.

Mas, santo café amargo, que bagunça sem graça é essa! Esse livro é o equivalente literário de um café instantâneo: rápido, ralo e com gosto de déjà-vu. Rostirola repete a mesma fórmula 365 vezes — "Deus te ama", "confie mais", "toma um café e reza" —, como se tivesse Ctrl+C e Ctrl+V num sermão de domingo e chamado de obra-prima. A prosa é tão insípida que faz o pão sem sal parecer uma iguaria; Hemingway diria que é econômico, mas eu digo que é preguiça pura. As metáforas de café são tão batidas que dá vontade de jogar a xícara na parede e gritar "Inova, meu filho!".

O narrador? Um pastor genérico que acha que é seu melhor amigo, mas não passa de um eco de autoajuda gospel. Os exemplos são tão óbvios — trânsito, chefe chato — que parece que ele escreveu isso num guardanapo entre cultos. Cadê a profundidade, a dúvida, o fogo da fé? Nada, só um chá morno de clichês. E os personagens secundários? São figurantes de um filme B bíblico, jogados ali pra encher linguiça.

O pior é o cheiro de caça-níquel. Lançar um "2025" só pra surfar o Jubileu é sacanagem — podia chamar de "Café com o Lucro" e ser mais honesto. A Vélos caprichou no visual, mas o conteúdo é reciclado de edições passadas, como se Rostirola tivesse um gerador automático de devocionais no porão. É o tipo de livro que você lê, reza e esquece antes do próximo café — um desperdício de papel que só sobrevive porque o povão gospel compra qualquer coisa com "Deus" na capa. Desculpa aí, Júnior, mas esse café tá mais frio que geladeira de pinguim!

"Café com Deus Pai 2025" é um devocional que cumpre seu papel básico: oferecer reflexões diárias para um público cristão fiel. Sua estrutura simples e mensagens reconfortantes têm valor prático, mas a falta de originalidade e profundidade o tornam uma leitura descartável. Para os devotos, é um apoio; para os críticos, uma decepção. Rostirola tinha a chance de criar algo memorável para o Jubileu; em vez disso, entregou um latte sem graça, mais digno de uma prateleira de liquidação do que de um altar. Um esforço meia-boca que não acorda nem o mais sonolento dos leitores.

Resenha: Como fazer amigos e influenciar pessoas, de Dale Carnegie


Análise do maior clássico da autoajuda que já enganou gerações: Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas, escrito pelo lendário puxa-saco profissional Dale Carnegie em 1936 e relançado em 2025 pela Companhia Editora Nacional porque, né, dinheiro não tem prazo de validade. Esse tijolo de papel é tipo um manual pra você virar o queridinho da firma sem precisar de talento de verdade – só um sorriso falso e um punhado de elogios baratos. Vamos destrinchar essa obra-prima do cinismo de puro deboche acadêmico, misturando teoria chique de narrativa com piadas que nem sua tia do WhatsApp aguentaria. No final, claro, vem a surra de comentários ácidos pra mostrar que esse livro é mais furado que pneu de bicicleta em estrada de espinhos. Preparados? Peguem o café (sem açúcar, porque a vida já é doce demais com esse livro, hahaha) e bora!

Foto: Livros & Marketing

Olha só, o Como Fazer Amigos é dividido em quatro partes que parecem saídas de um curso de telemarketing: "Técnicas pra lidar com gente sem surtar", "Como fazer todo mundo te amar sem te conhecer", "Como convencer os outros que você é o gênio da lâmpada" e "Como mudar alguém sem levar um tapa na cara". Cada pedaço tem capítulos curtinhos, tipo receita de miojo: um título brega, uma historinha meia-boca e um conselho que você já ouviu da sua avó. Isso é o que o nerd Genette (1980) chama de "narrativa parcelada" – ou, em bom português, um monte de pedacinhos pra você não dormir no meio do livro.

O cara escreve direto pra você, tipo "Ei, seu otário, sorria mais!", num estilo que Todorov (1977) batizou de "discurso pedagógico" – basicamente, um professor chato te dando sermão. E tem as historinhas de figurões como Abraham Lincoln e uns vendedores aleatórios que, segundo Genette (1997), são "paratexto" pra fingir que o livro é sério. Mas, sério mesmo, é tudo tão repetitivo que parece que o Carnegie pegou um capítulo, jogou no liquidificador e espalhou em 300 páginas. Organização? É só um looping infinito de "seja legal, ganhe amigos, lucre". ZzZzZz.

O livro gira em torno de três coisas: empatia (fingida), influência (manipulação) e como virar o mestre do social sem suar a camisa. Carnegie jura que se você ouvir o outro como se ele fosse interessante – mesmo sendo um mala – você vira rei do pedaço. Isso é tipo o que Rogers (1951) fala sobre "escuta ativa", só que sem a parte profunda, só o verniz pra você brilhar na reunião. A influência vem de truques baratos tipo "elogie até o cabelo ruim do chefe", coisa que Skinner (1971) chamaria de "condicionamento operante" – ou seja, treinar os outros como cachorrinhos com petiscos de palavras.

E tem a manipulação, que o tio Dale embrulha como "persuasão bonitinha". Goffman (1959) já sacou isso: é tudo teatro, você finge ser legal pra controlar a plateia. Em 2025, com Instagram, LinkedIn e o caramba, esse livro é o santo graal dos influencers e dos caras que vivem de networking – aqueles que te chamam de "parceiro" mas esquecem seu nome no dia seguinte. Relevante? Sim, pra quem acha que a vida é um grande BBB. Só que esse papo americanizado de "sorria e venha" não cola em todo canto – imagina tentar isso numa fila de ônibus no Brasil sem levar um "vai se ferrar" na cara.

O estilo do Carnegie é aquele básico de tiozão contando piada em churrasco: simples, direto e sem graça nenhuma. "Sorria e o mundo vai te amar" (Carnegie, 2025, p. 102) – sério, parece frase de caneca de R$ 10. Hemingway (1952) ia dizer que é "econômico", mas eu digo que é preguiça com selo de qualidade. Ele repete as mesmas dicas tipo mantra de coach – "elogie, escute, não reclame" – até você querer gritar "EU ENTENDI, VELHO!".

As técnicas? Joga uma historinha de Lincoln salvando o dia com um sorriso, ou de um vendedor que virou rico porque disse "você é incrível" pro cliente. Isso é o que Barthes (1977) chama de "ancoragem narrativa" – enfiar exemplos pra fingir que a ideia tem peso. Diálogo de verdade? Nada, só ele te dando aula como se fosse o dono da verdade. A tradução pro português em 2025 até que é decente, mas tira o sotaque de vendedor americano – pena, porque o original tem aquele charme de comercial de TV dos anos 30.

O Carnegie é o narrador, um tipo de "professor sabe-tudo" que Booth (1983) chamaria de "narrador pedagógico". Ele te pega pelo ombro e diz "Olha, eu já errei muito, mas agora sou o rei da simpatia" (Carnegie, 2025, p. 23). É "redondo" no papo de Forster (1927) porque parece gente, mas é só um personagem: o cara que quer te vender o curso dele. Não muda, não cresce, só fica ali te enchendo de conselhos como um tio chato no Natal.

Os outros no livro? Lincoln, Roosevelt, uns caras aleatórios – tudo marionete pra provar que o método funciona. Bakhtin (1981) ia chorar com essa falta de vozes diferentes; é só o Carnegie falando, falando, falando. Ninguém discorda, ninguém dá um soco na mesa. É um monólogo de um cara que acha que sabe viver melhor que você – e provavelmente acha que você é um loser se não seguir o plano dele.

O livro nasceu na Grande Depressão, quando o Carnegie, um vendedor falido que virou palestrante, percebeu que podia lucrar ensinando os outros a vender a alma com um sorriso. Lançado em 1936, virou febre porque todo mundo queria um emprego e amigos pra pagar as contas. Em 2025, a Companhia Editora Nacional jogou um prefácio novo pra fingir que é moderno – "use isso no LinkedIn!" – e o povão ainda compra como se fosse a Bíblia do networking.

A crítica ama odiar e o público odeia amar. A Folha diz que é "atemporal", o X tá cheio de "mudei minha vida com isso", mas tem quem saca o golpe: é raso, manipulador e velho pra caramba. Vende porque é fácil de engolir, tipo fast-food literário – você lê, acha que é gênio por cinco minutos e depois volta pro mesmo buraco. Um sucesso eterno, mas só porque o mundo tá cheio de trouxas querendo atalhos.

Olha, Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas é tipo um kit de sobrevivência pra quem quer ser o chato mais querido da festa. Funciona, sim – sorria, elogie o cabelo horrível do colega, finja que ouve o chefe falando do churrasco dele pela milésima vez, e pronto, você é o rei do pedaço. Os exemplos são legais pra impressionar em conversas de bar, e o livro é tão simples que até um macaco com ressaca entende. Dá pra ver por que sobreviveu quase 90 anos: é o manual do cara que quer vencer sem suar.

Mas, meu Deus do céu, que coisa mais podre e fajuta! Esse livro é o hino do puxa-saquismo, um guia pra você virar o capacho mais sorridente da história. Carnegie te ensina a lamber botas com tanta classe que você acha que é um lorde, mas no fundo é só um falso amigo com agenda. A repetição é de dar nos nervos – "sorria!", "elogie!", "não critique!" – parece um robô quebrado gritando no seu ouvido até você ceder e virar um robô também. As histórias? Um festival de lorota com Lincoln e uns caras que ninguém lembra, tudo pra te convencer que isso é ciência, quando é só papo de vendedor de enciclopédia.

O narrador é um mala sem alça, um guru de terno que acha que a vida se resume a tapinhas nas costas e "você é demais!". Os outros personagens são bonecos de palito, jogados ali pra encher linguiça e fazer o Carnegie parecer o Einstein das relações. Profundidade? Zero. É tudo tão raso que dá pra atravessar de meia sem molhar o pé. E o pior: é um golpe descarado! Ele te vende a ideia de que amigos são troféus e influência é só teatro – em 2025, isso é tipo um tutorial pra virar influencer sem talento, só com filtro e falsidade.

Sério, esse livro é o avô dos cursos online de R$ 19,90 que prometem te fazer milionário em uma semana. sobreviveu porque o mundo ama uma ilusão barata – mas, na real, é só um manual pra virar o colega chato que todo mundo tolera até o dia que ele pede um favor. Desculpa aí, Dale, mas teu método é mais velho que minha avó e mais furado que peneira de feira. Vai influenciar outro, que eu prefiro amigos de verdade a esse circo de elogios falsos!

Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas é o rei dos livros de autoajuda pra quem quer viver de aparência. É prático, é direto, é um sucesso – mas também é raso, cínico e mais velho que o pó da minha estante. Serve pra quem quer brilhar na firma ou no Tinder, mas não espere nada além de truques de mágico de quinta. Carnegie acertou no bolso, mas errou na alma – é um manual pra fazer amigos falsos e influenciar trouxas. Leia, ria, jogue fora e vá tomar um café com alguém que não precise de um script pra te aguentar.

Resenha: História da felicidade, de Peter N. Stearns



APRESENTAÇÃO

Ser feliz é algo diferente para cada pessoa, mas também tem sido diferente ao longo da história, em diversas regiões do planeta. Sempre houve a busca por existências felizes, mas o que é considerado felicidade e a forma como as pessoas conseguem configurar suas experiências variam muito e dependem de circunstâncias históricas específicas. Assim, a visão histórica melhora nossa compreensão dessa emoção humana, mesmo para observadores interessados principalmente em padrões contemporâneos. Neste livro veremos como a felicidade é produto das concepções religiosas do passado, do iluminismo, do capitalismo comercial, da imensa indústria do entretenimento moderno, do aconselhamento psicológico, além de todas as possíveis variáveis pessoais, familiares e locais adicionadas à mistura. " A grande revolução, como se acompanha no livro, está na Idade Contemporânea. O aumento da importância da felicidade é um fenômeno dos séculos XVIII e XIX.." - Leandro Karnal "Stearns faz percursos que singularizam o tema da felicidade e o desembaça por meio de explicações que o tornam em determinados períodos mais que evidente.

RESENHA


O livro História da felicidade destaca como fatores como o iluminismo, o capitalismo, a industrialização e as grandes religiões contribuíram para definir o que significa ser feliz em diferentes contextos históricos. Ao abordar temas recorrentes como o equilíbrio entre hedonismo e satisfação duradoura, as aspirações pessoais e o papel da família, Stearns nos convida a refletir sobre as complexidades e nuances da felicidade. Com uma abordagem que combina história, filosofia e psicologia, "História da Felicidade" não apenas ilumina o passado, mas também oferece valiosas lições para o presente, ajudando-nos a compreender de onde vêm nossas ideias atuais sobre felicidade e como podemos buscar uma vida mais plena e satisfatória.

O capítulo "As bases psicológicas" explora a complexidade da felicidade e a dificuldade em defini-la, abordando como psicólogos e a psicologia positiva têm investigado o tema nas últimas décadas. Destaca-se que, embora a disciplina não tenha solucionado todos os mistérios da felicidade, ela oferece parâmetros para compreender suas características principais. Inicialmente, a felicidade foi associada à juventude e baixas aspirações, mas estudos posteriores mostraram que idosos também relatam felicidade, e que pessoas ambiciosas podem ser felizes.

A felicidade é vista como uma emoção básica, expressa universalmente através do sorriso, e desempenha funções importantes, como reforçar comportamentos benéficos e equilibrar emoções negativas. A psicologia distingue entre "satisfação com a vida" e "bem-estar subjetivo", conceitos que ajudam a entender a felicidade em diferentes contextos e ao longo do tempo.

O capítulo aborda debates sobre o papel da genética na predisposição para a felicidade, sugerindo que, embora exista um componente genético, as pessoas podem modificar seu nível de felicidade através de ações e mudanças de perspectiva. Psicólogos também discutem a importância de fatores como saúde, relacionamentos saudáveis, altruísmo e conexão espiritual na promoção da felicidade.

O autor reconhece que a busca excessiva pela felicidade pode ser contraproducente e que as diferenças culturais e sociais influenciam como a felicidade é percebida e vivenciada. A psicologia e a história, juntas, podem oferecer uma compreensão mais abrangente da felicidade, considerando tanto as influências coletivas quanto individuais.

O capítulo "A Era da Agricultura" aborda o surgimento e desenvolvimento das economias agrícolas, que começaram há cerca de 11 mil anos e dominaram a maior parte da população mundial por pelo menos 6 mil anos. Essa era é dividida em vários períodos principais, incluindo o período formativo, o surgimento das primeiras civilizações hidráulicas, o período clássico (aproximadamente de 600 a.C. a 500/600 d.C.), o período pós-clássico e o início do período moderno (1450 a 1750).

Durante o período clássico, importantes sistemas filosóficos emergiram, abordando a definição de felicidade. O capítulo também menciona o impacto das grandes religiões e o desenvolvimento dos entretenimentos populares, especialmente a partir de 300 d.C. até o século XVII. Essa periodização ajuda a entender a história da felicidade, embora não a defina completamente. Os capítulos seguintes exploram essas divisões cronológicas, destacando as transformações culturais e econômicas significativas ao longo da era agrícola.

O capítulo "Os primórdios da sociedade agrícola" explora a transição das sociedades de caçadores-coletores para a agricultura, sugerindo que essa mudança pode ter reduzido o nível de felicidade humana. As sociedades de caçadores-coletores eram relativamente igualitárias, com boa nutrição e menos desigualdade, mas a introdução da agricultura trouxe novas dificuldades, como dietas menos nutritivas, maior carga de trabalho, doenças e desigualdades sociais e de gênero.

A agricultura permitiu maior produção de alimentos e crescimento populacional, mas também gerou desigualdades significativas. Aristocratas e proprietários de terras desfrutavam de privilégios, enquanto a maioria enfrentava condições difíceis. As sociedades agrícolas desenvolveram narrativas de uma Era de Ouro passada, refletindo a percepção de uma deterioração em comparação com a vida anterior.

O capítulo sugere que, embora a agricultura tenha trazido avanços, também introduziu desafios que aumentaram a complexidade da felicidade humana. As sociedades agrícolas tiveram que criar novos modos de vida e conceitos para mitigar as dificuldades e buscar a felicidade, diferenciando-se das experiências mais simples e satisfatórias dos caçadores-coletores.

O capítulo "Dos filósofos: a felicidade no período clássico" explora como as sociedades clássicas, especialmente no Mediterrâneo e na China, desenvolveram filosofias e conceitos em torno da felicidade, refletindo sobre a sua natureza e como alcançá-la. Com o surgimento das primeiras civilizações, surgiram também ideias mais complexas sobre felicidade, influenciadas por condições objetivas e sistemas de valores. 

No Egito antigo, por exemplo, a felicidade era associada à gratidão aos deuses e à continuidade da vida terrena na vida após a morte, enquanto na Mesopotâmia, a visão era mais melancólica e os deuses exigiam obediência. No mundo clássico, debates filosóficos sobre a felicidade foram centrais, com os gregos e romanos enfatizando a virtude e a razão como caminhos para a verdadeira felicidade, diferenciando-se dos prazeres materiais. Aristóteles, por exemplo, via a felicidade como uma atividade da alma expressando virtude, enquanto os estoicos defendiam a limitação dos desejos.

Na China, o confucionismo enfatizava a harmonia com a ordem natural e a importância das conexões humanas, enquanto o taoísmo valorizava a simplicidade e a sintonia com o universo. Ambas as tradições filosóficas buscavam distinguir o verdadeiro prazer da satisfação superficial, oferecendo uma visão que compensava as dificuldades da vida.

O capítulo também aborda o impacto dessas filosofias, questionando até que ponto influenciaram a experiência real de felicidade e destacando a tensão entre os conceitos filosóficos e as práticas populares de entretenimento. As filosofias clássicas tiveram um impacto duradouro, com o confucionismo moldando a visão chinesa de felicidade e as ideias gregas e romanas sendo reinterpretadas ao longo do tempo, especialmente com a ascensão de novas religiões.

O capítulo "Das grandes religiões: felicidade – e esperança?" analisa como as grandes religiões, surgidas principalmente entre 600 a.C. e 1400 d.C., impactaram as concepções de felicidade. Hinduísmo, Budismo, Cristianismo e Islamismo, embora distintas, compartilham a ideia de que a verdadeira felicidade transcende a existência terrena e está ligada a um plano espiritual ou vida após a morte.

O hinduísmo estabelece uma hierarquia de felicidade, culminando na realização espiritual após sucessivas reencarnações, enquanto o Budismo, fundado por Buda, propõe que a verdadeira felicidade resulta do desapego dos desejos mundanos, alcançando o Nirvana. O Cristianismo enfatiza a vida eterna no céu como a verdadeira felicidade, incentivando a esperança e a moderação dos prazeres terrenos. O Islamismo, semelhante ao Cristianismo, valoriza a vida após a morte, mas reconhece as bênçãos terrenas como dádivas de Deus.

Todas essas religiões ofereceram não apenas um caminho para a felicidade espiritual futura, mas também formas de alcançar satisfação e comunidade na vida presente, através de práticas como meditação, oração e caridade. No entanto, a ênfase na vida após a morte e a crítica aos prazeres mundanos também introduziram um elemento de ansiedade e culpa, especialmente no Cristianismo.

A expansão dessas religiões foi, em parte, uma resposta às instabilidades e desafios dos tempos, oferecendo esperança frente às dificuldades da vida terrestre. Elas continuam a influenciar as visões de felicidade até os dias atuais, destacando a tensão entre a vida material e a busca por um propósito espiritual mais profundo.

O capítulo "Prazeres populares" explora as atividades e diversões que proporcionaram satisfação e possivelmente felicidade nas sociedades agrícolas durante a "era religiosa". Embora não possamos medir a felicidade dessas atividades, elas claramente ofereciam momentos de prazer e alívio das duras rotinas de trabalho e das restrições da vida agrícola.

O trabalho, especialmente para artesãos urbanos, oferecia uma sensação de satisfação e orgulho, enquanto as atividades sexuais, embora limitadas por normas sociais e religiosas, ainda eram buscadas por muitos. A infância, apesar das dificuldades, proporcionava oportunidades de brincadeiras livres e espontâneas, que contrastavam com a supervisão adulta.

As sociedades agrícolas desenvolveram uma variedade de formas de entretenimento, como contação de histórias, jogos, esportes populares e festivais. Os festivais, em particular, eram eventos importantes que uniam comunidades em celebrações coletivas, oferecendo uma pausa vital nas rotinas diárias.

Esses prazeres populares, que frequentemente ocorreram em conjunto com atividades religiosas, mostravam a criatividade das pessoas em buscar diversão e satisfação, apesar das dificuldades da vida agrícola. As opções de entretenimento eram limitadas e esporádicas, mas proporcionavam momentos de felicidade que ajudavam a suportar a monotonia e as dificuldades do dia a dia.

O capítulo "A Revolução da Felicidade, 1700-1900" explora como, nos séculos XVII e XVIII, uma nova abordagem sobre a felicidade emergiu na Europa Ocidental e América do Norte, desafiando as concepções tradicionais e redefinindo expectativas pessoais. Este período, que se estendeu até o século XIX, coincidiu com a transição da Era da Agricultura para o início da sociedade industrial.

Durante esse tempo, debates intensos sobre o significado da felicidade surgiram, e várias tentativas foram feitas para implementar essas novas ideias. A Revolução Industrial trouxe mudanças significativas nos padrões de vida, lazer e vida familiar, complicando ainda mais a adaptação a essas novas expectativas de felicidade.

Embora descrita como uma "revolução", essa transformação foi inicialmente limitada ao Ocidente, com seu impacto global sendo restrito por um tempo considerável. O poder imperial e econômico da Europa durante esse período pode ter retardado a disseminação global dessas novas ideias sobre felicidade.

O capítulo "A Revolução da Felicidade no Ocidente" analisa como, durante os séculos XVIII e XIX, uma mudança significativa nas ideias sobre felicidade ocorreu na Europa Ocidental e na América do Norte. Essa revolução foi marcada pela crença de que os seres humanos podiam controlar seus destinos e que o prazer e o conforto terrenos eram objetivos legítimos. A felicidade passou a ser vista como algo que deveria estar ao alcance de todos, com sociedades bem organizadas ampliando as oportunidades para a satisfação mental e material.

Essa nova abordagem desafiou ideias mais antigas que associavam a felicidade à virtude ou à vida após a morte. O Iluminismo desempenhou um papel crucial ao promover a razão e sugerir que o progresso e a melhoria contínua eram possíveis. A felicidade passou a ser discutida não apenas como um conceito filosófico, mas também como um objetivo social e político, com implicações para a organização da sociedade e das políticas governamentais.

A revolução da felicidade trouxe novos comportamentos, como um aumento no consumismo e uma maior ênfase no prazer individual. O individualismo ganhou destaque, e a busca pela felicidade tornou-se um direito pessoal. Essa transformação também influenciou movimentos sociais e políticos, inspirando protestos populares e revoluções que buscavam a felicidade coletiva através de reformas.

Apesar das críticas e resistências de grupos religiosos e conservadores, as novas ideias sobre felicidade tiveram um impacto duradouro, moldando expectativas e comportamentos que ainda influenciam as sociedades ocidentais modernas. A revolução da felicidade não foi universalmente aceita, mas marcou uma mudança fundamental nas percepções de felicidade e nos objetivos de vida.

O capítulo "A Expansão da Felicidade? As Novas Expectativas Encontram a Sociedade Industrial" analisa como o século XIX viu a continuidade da revolução da felicidade iniciada no século XVIII, enquanto a sociedade enfrentava os desafios e transformações da Revolução Industrial. As ideias de felicidade se expandiram, influenciando práticas culturais e sociais no Ocidente, mas também enfrentaram novos desafios.

O século XIX presenciou a incorporação contínua de ideias iluministas sobre felicidade, destacando o prazer e a satisfação pessoal. No entanto, a industrialização trouxe mudanças significativas na estrutura social, separando família, trabalho e lazer. As famílias começaram a ser vistas como refúgios emocionais, e a felicidade familiar tornou-se um ideal valorizado.

A industrialização também complicou a relação entre trabalho e felicidade, com muitos trabalhadores enfrentando condições difíceis e alienação. No entanto, a crescente atenção ao lazer e ao consumismo abriu novos caminhos para a busca da felicidade. O aumento do tempo de lazer e a disponibilidade de novos produtos e entretenimentos, como parques de diversões e esportes, contribuíram para a satisfação individual e coletiva.

Apesar das novas oportunidades, a felicidade no século XIX foi marcada por desigualdades de classe e gênero, e as expectativas de felicidade nem sempre foram alcançadas. A sociedade industrial trouxe novas tensões, mas também expandiu as possibilidades para a busca da felicidade no contexto moderno.

O capítulo "Mudanças Globais nos Séculos XVIII e XIX" explora como, durante esse período, as ideias ocidentais sobre felicidade não se difundiram globalmente de maneira uniforme. Enquanto o Ocidente passava por transformações culturais e econômicas, muitas regiões mantinham suas tradições religiosas e culturais, com continuidade prevalecendo sobre a mudança.

Na China e no Império Otomano, as tradições existentes, como o confucionismo e as reformas do Tanzimat, continuaram a influenciar as concepções de felicidade, apesar das pressões externas e internas. Na China, a instabilidade econômica e social, agravada pela interferência ocidental, levou à Rebelião Taiping, que misturava valores cristãos e chineses em uma busca por felicidade por meio da obediência coletiva.

O imperialismo europeu trouxe impactos negativos significativos, especialmente na América Latina e na África Subsaariana, onde a colonização e a exploração econômica provocaram sofrimento e uma visão de mundo marcada pela melancolia. Na América Latina, o pensamento iluminista influenciou líderes como Simón Bolívar, que defendiam a felicidade através da independência e do nacionalismo.

Na Rússia e no Japão, as reformas e a industrialização criaram contextos distintos. Na Rússia, a modernização gerou debates entre ocidentalizadores e conservadores, enquanto no Japão, a era Meiji promoveu a industrialização e uma mistura de tradições japonesas com influências ocidentais, sem adotar completamente as ideias ocidentais de felicidade. Apesar de algumas influências ocidentais, muitas regiões mantiveram suas tradições e desenvolveram respostas únicas às pressões externas e internas, resultando em um mosaico complexo de atitudes em relação à felicidade que persistiriam no século XX.

No início do século XXI, a cultura do sorriso se tornou um fenômeno global, impulsionada pelas redes sociais, onde mostrar felicidade em selfies se tornou uma norma. No entanto, não havia uma história única da felicidade globalmente, com abordagens variando entre diferentes regiões, influenciadas por padrões materiais e tradições culturais.

Apesar das diferenças, algumas tendências comuns surgiram, principalmente a influência da cultura de consumo ocidental, que se espalhou com a industrialização e urbanização global. Isso ajudou a desafiar ideias antigas sobre felicidade e começou a formar uma abordagem mais global ou multirregional.

No Ocidente, o compromisso com a felicidade permaneceu forte, mas enfrentou desafios internos e influências de outras culturas. Paralelamente, houve tentativas deliberadas de desenvolver alternativas aos modelos ocidentais de felicidade, como no comunismo e em atualizações de valores tradicionais.

O século passado também foi marcado por divisões cronológicas internas, como as disputas sobre felicidade nas décadas após as guerras mundiais e a Grande Depressão. Após 1945, com o fim da Guerra Fria, algumas dimensões globais da felicidade começaram a emergir, interagindo com tendências regionais.

Com a industrialização se expandindo globalmente, as últimas décadas possibilitam uma avaliação provisória das implicações da industrialização para a felicidade, comparando-as com o advento da sociedade agrícola, embora as conclusões permaneçam complexas e inconclusivas.

O capítulo "Disputa pela Felicidade, 1920-1945" explora as diversas tendências que influenciaram a felicidade durante o período das guerras mundiais e da Grande Depressão. A Primeira Guerra Mundial causou um impacto negativo significativo na felicidade na Europa Ocidental, gerando pessimismo e desespero. Por outro lado, nos Estados Unidos, houve uma continuidade e ampliação dos temas de felicidade, com o desenvolvimento de novas abordagens culturais e de consumo.

O surgimento do fascismo na Europa rejeitou a primazia da felicidade individual, enfatizando o dever e a lealdade ao Estado em vez de prazeres pessoais. Movimentos anticoloniais e nacionalistas, liderados por figuras como Gandhi e Ataturk, promoveram visões alternativas de felicidade, muitas vezes baseadas em tradições culturais e na construção de nações independentes.

Apesar das dificuldades econômicas e sociais, algumas sociedades ocidentais continuaram a buscar o prazer, com a indústria do entretenimento desempenhando um papel importante. Nos Estados Unidos, a felicidade permaneceu um tema central, com inovações como a Disney e a trilha de risadas na mídia, além de esforços para associar felicidade ao trabalho por meio da Psicologia industrial.

O período também viu mudanças significativas na relação com a morte e o luto, com a morte se tornando menos comum e mais distante na experiência cotidiana, resultando em uma redefinição de práticas de luto e uma ênfase em emoções positivas.

A diversidade de abordagens à felicidade nesse período reflete a complexidade global das décadas entre guerras, com diferentes regiões desenvolvendo suas próprias respostas às crises e desafios, muitas vezes em oposição aos modelos ocidentais tradicionais.

O capítulo "Felicidade Comunista" examina como as sociedades comunistas, começando com a União Soviética em 1917, abordaram o conceito de felicidade. Os líderes comunistas enfrentaram o desafio de definir a felicidade de maneira distinta do Ocidente, que associavam ao consumismo e ao individualismo burgueses. Em vez disso, os comunistas procuraram promover a felicidade através do progresso social, igualdade e um ideal de futuro sem classes.

Na União Soviética, a felicidade foi associada ao trabalho árduo e ao progresso coletivo, com ênfase na educação, saúde pública e mobilidade social. Propagandas e programas coletivos, como férias patrocinadas pelo Estado, foram usados para promover um senso de satisfação popular. No entanto, o consumismo individual foi desencorajado, e os produtos disponíveis eram frequentemente de baixa qualidade.

Na China comunista, sob a liderança de Mao Tsé-Tung, a felicidade também foi vinculada ao progresso coletivo e à lealdade ao Partido. A educação e a saúde pública foram ampliadas, mas a ênfase estava na transformação social e cultural, com pouca atenção aos bens materiais. A Revolução Cultural promoveu a ideia de felicidade através do trabalho árduo e do sacrifício coletivo.

Ambos os regimes enfrentaram dificuldades em equilibrar a promoção de uma felicidade distinta com as pressões da industrialização e do consumismo. Após o colapso da União Soviética e as reformas na China, ambos os países viram um aumento no consumismo e um retorno a valores mais individuais. No entanto, ainda enfrentam desafios em definir e promover a felicidade em um contexto pós-comunista, com um legado de abordagens anteriores e novas pressões sociais e econômicas.

O capítulo "Comparando a Felicidade nas Sociedades Contemporâneas" aborda a complexidade de comparar a felicidade entre diferentes países, destacando as dificuldades devido a diferenças culturais e de linguagem. Após a Segunda Guerra Mundial, as características regionais continuaram a influenciar as concepções e níveis de felicidade, mesmo com o aumento dos contatos globais.

Dois grandes projetos de pesquisa foram realizados no final dos anos 1950 e início dos 1960, e novamente nos anos 1970, analisando expectativas e preocupações em vários países. As conclusões mostraram que, embora fatores econômicos fossem importantes, as visões culturais e políticas desempenhavam um papel significativo na formação das expectativas de felicidade. As pesquisas revelaram que as esperanças superavam as preocupações na maioria dos lugares, mas as diferenças culturais influenciavam as visões sobre família e riqueza.

Estudos de caso sobre a Índia e o Japão ilustram essas diferenças. Na Índia, tradições espirituais e o foco na família influenciam as concepções de felicidade, enquanto o consumismo e o entretenimento moderno estão em ascensão. No Japão, o conceito de ikigai, que combina dever e realização pessoal, guia a busca pela felicidade, mas também enfrenta desafios devido à estagnação econômica e mudanças sociais.

O capítulo destaca que a felicidade não se correlaciona diretamente com indicadores econômicos e que as comparações entre países são complexas. No entanto, a análise comparativa é essencial para entender as diferenças regionais e refletir sobre as próprias concepções de felicidade. A globalização continua a promover uma mistura de influências culturais em relação à felicidade.

O capítulo "A Sociedade Ocidental na História Contemporânea: Cada Vez Mais Feliz?" explora se a sociedade ocidental está se tornando mais feliz ao longo do tempo, analisando fatores culturais, econômicos e sociais. A pesquisa de 2015 destacou que pais em sociedades ocidentais, como França, Canadá e Estados Unidos, priorizam a felicidade dos filhos, refletindo um compromisso cultural contínuo com a felicidade.

O capítulo afirma que a revolução da felicidade continua forte no Ocidente, mas também levanta questões e desafios. O consumismo desempenha um papel central, com um aumento significativo na busca por bens materiais e experiências como um caminho para a felicidade. A Disney, a literatura de autoajuda, a publicidade e as happy hours são exemplos de como a cultura ocidental promove a felicidade.

No entanto, novas questões surgem, como o paradoxo de Easterlin, que mostra que o aumento da prosperidade não se traduz necessariamente em maior felicidade. Além disso, a pressão cultural para ser feliz pode tornar a tristeza e a depressão mais difíceis de lidar, afetando a saúde mental.

A psicologia positiva e os programas de bem-estar surgiram como respostas para ajudar indivíduos a encontrar a felicidade duradoura, enfatizando o florescimento humano e a gratidão. Embora esses movimentos tenham ganhado popularidade, eles também enfrentam críticas por serem excessivamente otimistas.

Em resumo, a sociedade ocidental mantém um compromisso forte com a felicidade, mas enfrenta desafios significativos, incluindo as complexidades do consumismo, as expectativas de felicidade e as implicações emocionais dessas dinâmicas.

O capítulo "A Felicidade se Globaliza" explora como a aceleração da globalização no final do século XX e início do XXI influenciou as concepções de felicidade em todo o mundo. Enquanto as diferenças culturais e econômicas persistem, surgiram características globais de felicidade que vão além da simples adoção dos padrões ocidentais por outras sociedades. Esses padrões refletem reações à urbanização, melhorias nos padrões de vida e saúde, e contribuições de outras regiões, como o Sul da Ásia, enriquecendo as discussões globais sobre felicidade.

A globalização trouxe um foco maior na felicidade como meta política, com a ONU estabelecendo o Dia Internacional da Felicidade em 2012. Governos ao redor do mundo, incluindo os Emirados Árabes Unidos e a Nova Zelândia, criaram programas específicos para promover o bem-estar e a felicidade, enquanto iniciativas de bem-estar e psicologia positiva se espalharam globalmente.

O capítulo também discute como o consumismo e as celebrações de boas festas se tornaram fenômenos globais, com o Natal e aniversários sendo comemorados em muitos países. Além disso, práticas culturais de diferentes regiões, como a meditação do Sul da Ásia e o método Konmari do Japão, influenciaram abordagens globais à felicidade.

A Pesquisa Mundial de Valores fornece dados sobre tendências de felicidade ao longo do tempo, mostrando que a maioria dos países viu melhorias nos níveis de felicidade entre 1981 e 2007, embora desafios recentes, como a Grande Recessão e a pandemia de coronavírus, tenham impactado negativamente alguns países. Enquanto o interesse global pela felicidade aumentou e as definições se expandiram, as diferenças culturais e regionais continuam a complicar o quadro, tornando difícil prever o futuro da felicidade global.

O capítulo "Conclusão" aborda a complexidade e a evolução da felicidade ao longo da história, ressaltando que a felicidade tem sido influenciada por fatores como religião, iluminismo, capitalismo e cultura popular. A felicidade é uma emoção que variou em significado e prática dependendo das circunstâncias históricas e culturais.

A história da felicidade é complexa e não segue uma narrativa linear. Diferentes regiões e épocas têm suas próprias abordagens, e a pesquisa sobre o tema ainda é desigualmente distribuída, com um foco desproporcional no Ocidente. A relação entre textos formais sobre felicidade e práticas populares concretas é um desafio recorrente, e a religião desempenha um papel central, mas variado, na definição da felicidade.

Alguns temas recorrentes na história da felicidade incluem o equilíbrio entre hedonismo e satisfação duradoura, as aspirações pessoais, a sorte versus a agência humana, e o papel da família. Esses temas ajudam a organizar comparações e a entender as escolhas feitas por indivíduos e sociedades.

Importantes pontos de inflexão na história da felicidade incluem a transição para a agricultura e civilizações formais, o advento de religiões complexas e a "revolução da felicidade" no Ocidente a partir do século XVIII. A industrialização trouxe novos desafios e oportunidades para a felicidade, com melhorias materiais, mas também novas tensões e expectativas.

O capítulo finaliza ressaltando a fragilidade da felicidade, tanto para indivíduos quanto para sociedades, e a importância de se considerar o bem maior ao buscar a felicidade. A história oferece insights sobre como diferentes abordagens à felicidade evoluíram e quais podem ser seus pontos fortes e limitações.

A obra oferece uma fascinante jornada pela história da felicidade, revelando como essa emoção universal é moldada por contextos históricos e culturais variados. Desde as concepções religiosas até as influências do iluminismo e do capitalismo, o livro traça um panorama enriquecedor sobre as mudanças nas percepções de felicidade ao longo do tempo.

Os capítulos exploram como diferentes eras e regiões definiram a felicidade de maneiras únicas. Na "Era da Agricultura", a transição para sociedades agrícolas trouxe novos desafios, como desigualdades e dificuldades, mas também narrativas de uma Era de Ouro perdida. As filosofias clássicas deram forma a conceitos de felicidade, com os gregos e romanos enfatizando a virtude e os chineses, a harmonia e simplicidade.

O surgimento das grandes religiões introduziu a ideia de felicidade transcendente, ligada a um plano espiritual. Já a "Revolução da Felicidade" nos séculos XVIII e XIX, impulsionada pelo iluminismo, redefiniu a felicidade como um direito humano, inspirando movimentos sociais e políticos.

O livro também aborda como a globalização e a industrialização impactaram as concepções de felicidade, trazendo novos desafios e oportunidades. A era contemporânea vê a felicidade se tornar uma meta política global, com influências de práticas culturais de todo o mundo.

Com uma análise rica e detalhada, a obra destaca a complexidade da felicidade e a importância de considerá-la em contextos históricos e culturais. É uma leitura envolvente que oferece insights sobre como a busca pela felicidade continua a evoluir e a influenciar nossas vidas.

O AUTOR

Peter N. Stearns formou-se em História em Harvard e é professor de História na George Mason University, nos Estados Unidos. Escreveu muito sobre história mundial e sobre o campo cada vez mais importante da História das emoções e ministra disciplinas em ambas as áreas regularmente. Desde cedo se destacou pela atividade docente (trabalhou na Universidade de Chicago, Rutgers, entre outras) e pelo empenho em escrever livros, tanto para especialistas, quanto para um público mais amplo. Foi editor de importantes publicações especializadas nos EUA, como o Journal of Social History. Sua preocupação com a história mundial e seu empenho em mostrar práticas sociais em diferentes culturas orientaram a escrita de importantes livros, como "A infância", "História das relações de gênero", "História da sexualidade" e "História da Felicidade", publicados pela Contexto.


Resenha: Noites cruas, de Jean Soter

Divulgação / Mandawa Estúdio

APRESENTAÇÃO

Expulsa de casa após uma briga com a mãe, Karina conhece a garota de programa Rose em um posto de gasolina na rodovia. Naquela mesma noite, saem com dois caminhoneiros.

Noites Cruas centraliza seu enredo na trajetória errática dessas duas mulheres, com seus sonhos, frustrações e esperanças, e tem como cenário a rua, o bordel, a rodovia.

RESENHA

Em “Noites cruas”, Jean Soter nos mostra que a vida acontece mesmo quando a maioria não está prestando atenção. Focado na trajetória de duas personagens, Karina e Rose, esse romance leva o leitor para a beira da estrada. Mas essa história não é uma road trip divertida de duas amigas universitárias fazendo um mochilão para descobrir o que querem fazer da vida, Karina e Rose são prostitutas que têm seus destinos costurados uma a outra em um banco de posto de gasolina.

“Mulher de vida fácil”, diz a cultura popular para se referir às putas. “Mulher perdida” também. Jean Soter, ao retratar essa face da vida noturna, foge de frases prontas como essas. Lírico, cru, fluido, a obra expõe os riscos vividos no ofício, o efeito do envelhecimento nos rendimentos das mulheres que vivem de programa, a miséria que as ameaça até em tempos de bonança e os laços afetivos possíveis nesse contexto, sem jamais impor julgamentos morais ao leitor.

As ilustrações de Pedro Graça ajudam a compor a atmosfera do livro. Em especial, as imagens que abrem os onze capítulos e tem como característica o fundo escuro, como a noite, e o traço branco que parece ter sido feito de giz em um quadro negro e pode ser apagado a qualquer momento.

Mais do que sobre prostituição, “Noites cruas” é sobre travessia. Suas personagens estão tentando criar meios de seguir em frente. As rodovias que cortam esse romance são as passagens que Karina e Rose encontram para levar a vida adiante. E, nessa lida de tentar sobreviver, elas percorrem cidades nunca nomeadas, se afastam do ponto de partida e também voltam atrás, enquanto reconhecem e também estranham as mudanças promovidas pelo tempo nas paisagens e nelas mesmas.

Thaís Campolina é escritora, mediadora de leitura e especialista em Escrita e Criação pela Unifor. Seu livro de poesia “eu investigo qualquer coisa sem registro” (2021) foi premiado no concurso Poesia InCrível 2021. Sua próxima obra será publicada em breve pela Macabéa Edições.

O AUTOR


Jean Soter é autor das coletâneas de contos A Transferência (2007) e O Vendedor (2018). No momento, trabalha como autônomo no mercado de ações; nos intervalos, lê e escreve literatura. Natural do interior de São Paulo, onde nasceu em 1974, vive no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, desde 2009.

Resenha: MST: A construção do comum, de Susana Bleil


APRESENTAÇÃO

Publicada originalmente em francês sob o título “Vie et luttes des Sans Terre au sud du Brésil”, a obra é o resultado da imersão que autora por quatro anos no assentamento Santa Maria (Copavi), em Paranacity, no noroeste do Paraná, fundado em 1993.Além de registrar a história de uma das mais bem sucedidas experiências do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), Bleil usa a sociologia para analisar a complexidade e os desafios de convivência, produção e resistência na luta pela reforma agrária no Brasil. Com seu trabalho etnográfico a autora revela em detalhes o funcionamento da cooperativa e como são tomadas as decisões políticas e as dificuldades da construção coletiva.Trata-se de leitura fundamental para todas as pessoas que pretendem compreender melhor a história do MST e os valores que o presidem.

RESENHA

A obra "A Construção do Comum", da socióloga Susana Bleil, oferece uma análise profunda e intimista do assentamento Santa Maria, parte do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), localizado em Paranacity, Paraná. Publicada originalmente em francês, esta obra se destaca por seu enfoque etnográfico, resultado de anos de pesquisa e imersão no cotidiano da cooperativa, estabelecida em 1993. Bleil não apenas documenta a história da Copavi, mas também investiga os dilemas enfrentados por seus membros na busca pela construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

A autora começa descrevendo a natureza da comunidade, que antes era composta por laços de sangue e casamento, mas que, ao longo do tempo, se transforma. Ela argumenta que, apesar do desaparecimento da comunidade tradicional, a necessidade de recriar um espaço de convivência onde a cooperação e a solidariedade prevaleçam se faz cada vez mais urgente. A proposta central do livro se estrutura em torno da busca por um "comum" – um espaço onde as experiências compartilhadas e as relações humanas possam florescer e construir significados coletivos.

"A Construção do Comum", de Susana Bleil, não é apenas um relato sobre um assentamento rural, mas um convite à reflexão sobre a complexidade das relações humanas em um mundo que tende a fragmentar laços e a promover a individualidade em detrimento da coletividade. A partir da sua análise etnográfica, somos confrontados com a ideia de que o 'comum' é uma construção contínua, que requer esforço, cuidado e compromisso.

A obra ressalta que, ao contrário da visão simplificada de comunidades como meros aglomerados de indivíduos, as comunidades são organismos vivos, pulsantes, onde cada interação tem o potencial de reafirmar ou desmantelar laços de solidariedade. O assentamento Santa Maria mostra que a busca por uma vida coletiva não só é uma necessidade, mas um ato político vital em um cenário global que valoriza cada vez mais a concorrência e a exclusão. O desafio de transformar experiências pessoais em significados coletivos é um reflexo fiel das tensões enfrentadas por aqueles que buscam não apenas a sobrevivência, mas também uma vida digna.

Outro aspecto potente do trabalho de Bleil é a ideia de "família política". Nesse sentido, o assentamento Santa Maria se torna um microcosmo das lutas sociais mais amplas, onde a política se entrelaça com a vida cotidiana e as emoções. A solidariedade não é apenas uma estratégia de resistência, mas uma forma de afetividade que permeia todas as interações. Essa interconexão entre a política e a vida afetiva revela um aspecto crucial das lutas sociais: que as mudanças estruturais não podem ser efetivas sem uma base relacional sólida que una os militantes em torno de uma causa comum. A política, portanto, se transforma em um campo de batalha onde as experiências pessoais se tornam relevantes, e os vínculos formados no seio da comunidade se tornam a verdadeira força motriz de transformação.

Além disso, o livro nos força a reconsiderar o significado de ‘comunidade’ em um tempo de crescente desumanização e desassociação. A transformação narrativa de laços de sangue para laços de solidariedade nos lembra que, em uma sociedade que muitas vezes segmenta e aliena, é na criação de novos vínculos que reside a chave para um futuro mais equitativo. A obra de Bleil se posiciona como uma crítica contundente à desumanização que permeia muitos âmbitos da vida contemporânea, ao mesmo tempo que propõe uma alternativa: a construção de espaços coletivos que valorize a empatia, a compreensão e o apoio mútuo.

Os relatos dos sócios da Copavi revelam a complexidade da vida em comunidade. A obra questiona se os militantes têm espaço para expressar suas discordâncias e como as crises são geridas coletivamente. Nesse contexto, cada experiência pessoal é situada na trama maior da luta pela reforma agrária, destacando valores como fraternidade, inclusão e solidariedade. Bleil não hesita em mostrar os desafios e as tensões que surgem nesse ambiente, enfatizando que a sobrevivência do grupo depende da consciência coletiva de pertença e da confiança mútua entre seus membros.

A narrativa etnográfica de Bleil é enriquecida por seus encontros com os militantes, cujas histórias pessoais e visões de mundo acrescentam profundidade ao entendimento dos processos de construção da comunidade. Momentos de troca e riso, bem como as disputas e tensões, são analisados com rigor e sensibilidade, tornando visíveis as nuances da vida cotidiana no assentamento. Essa abordagem ajuda a moldar a ideia de que a construção do "nós" no coletivo é um trabalho contínuo, que se alimenta de práticas e rituais que promovem a união e o compromisso dos membros.

Bleil também evoca a ideia de uma "família política", onde os laços de solidariedade extrapolam o espaço familiar e se transformam em uma rede de apoio e luta common. O compromisso dos militantes com a causa do MST se entrelaça com suas vidas pessoais, demonstrando que a política e a afetividade não estão desconectadas, mas sim interligadas em múltiplas camadas de significado.

Ao longo da leitura, fica evidente que "A Construção do Comum" é mais do que uma simples crônica da vida em um assentamento: é uma reflexão profunda sobre a necessidade de valores éticos e comunitários numa sociedade que frequentemente ignora a força das relações humanas. A obra fornece uma base fundamental para quem deseja compreender não só a história do MST, mas também os princípios que fundamentam a luta por justiça social e a construção de novos modelos de convivência.

A obra de Susana Bleil é uma contribuição ímpar ao entendimento das dinâmicas sociais e políticas no Brasil contemporâneo, fazendo ecoar a importância do comum em um mundo que cada vez mais se distancia da convivência solidária. Seja para estudantes, militantes, ou qualquer pessoa interessada em questões sociais, "A Construção do Comum" é uma leitura indispensável, capaz de inspirar reflexões sobre a coletividade e a luta por um futuro mais justo.

Ademais, é crucial observar que os desafios enfrentados pela comunidade não são apenas obstáculos, mas oportunidades para crescimento e reconfiguração. A capacidade dos militantes de expressar suas discordâncias e lidar com crises coletivamente revela um dinamismo intrínseco à vida comunitária. Essa ideia de que as tensões não são sinônimos de fracasso, mas partes integrantes de um processo vital, sugere que a solidariedade é, na verdade, uma prática que se refina por meio de conflitos construtivos e diálogos honestos.

Em última análise, "A Construção do Comum" é uma obra que se desdobra em múltiplas camadas de significado. Ela nos desafia a pensar sobre o que realmente significa viver em sociedade e convida a uma reflexão profunda sobre a necessidade de encontrarmos nossos 'comuns' em tempos de crescente individualismo. O ensinamento mais importante que podemos extrair dessa obra é que a luta por um espaço coletivo não é apenas uma aspiracional, mas uma urgência. E, mais importante, que essa luta deve ser alimentada por uma percepção ética de comunidade, onde cada indivíduo, com suas particularidades e experiências, é respeitado, ouvido e integrado na construção de um futuro mais justo e solidário.

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