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[RESENHA #752] Suor, de Jorge Amado

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Um casarão do Pelourinho transformado em cortiço, com suas dezenas de moradores pobres e marginalizados, é o ambiente de Suor, publicado em 1934, quando Jorge Amado tinha 22 anos. De modo cru, mas com sua característica prosa envolvente e calorosa - sempre atenta à musicalidade da fala popular -, Jorge narra um cotidiano de miséria, falta de higiene e ausência de perspectivas. Nos quartos precários do cortiço, homens e mulheres convivem com ratos e baratas e dão vazão às pulsões mais básicas. Os diversos personagens ganham em algum momento o primeiro plano do relato. Há o mascate judeu que percorreu o mundo e fala oito línguas, o homem sem braços que faz propaganda de lojas, a velha prostituta que não consegue mais arranjar freguês, o operário anarquista que vive com um gato, a costureira que sonha com um casamento para a afilhada virgem, entre outras figuras sofridas. Jorge Amado cria ao mesmo tempo um painel social e um estudo sutil dos sentimentos humanos que florescem nas situações mais adversas. Apesar da dureza do dia a dia, o humor e a solidariedade encontram frestas para se manifestar, e uma crescente consciência política se espalha entre alguns moradores do cortiço.

RESENHA

Suor é o terceiro romance do escritor baiano Jorge Amado, publicado em 1934, quando o autor tinha apenas 22 anos. A obra faz parte da fase socialista de Amado, que se inspirou nas ideias do marxismo e do anarquismo para retratar a realidade dos trabalhadores explorados e oprimidos pelo sistema capitalista. O livro é considerado um dos clássicos da literatura brasileira, por sua linguagem vigorosa, seu estilo realista e sua crítica social.

O cenário do romance é um casarão no Pelourinho, em Salvador, onde moram mais de 600 pessoas em 116 quartos. O casarão é um cortiço, onde a miséria, a sujeira, a promiscuidade e a violência são constantes. O livro não tem uma trama linear, mas sim uma série de episódios que mostram o cotidiano dos moradores, suas angústias, seus sonhos, suas lutas e seus amores. Entre os personagens, destacam-se Linda, uma jovem que vive com a madrinha Dona Risoleta e que se envolve com o movimento operário; Artur, um aleijado sem braços que faz propaganda política pelas ruas; e o sapateiro espanhol, um anarquista que difunde suas ideias entre os habitantes do cortiço.

O livro é um retrato fiel da sociedade brasileira da época, marcada pela desigualdade, pela repressão e pela crise econômica. Amado denuncia as condições desumanas em que vivem os trabalhadores, explorados pelos patrões e pelo Estado, e exalta a resistência e a solidariedade dos oprimidos. O autor também aborda temas como o racismo, o machismo, a religião, a cultura popular e a identidade nacional. O livro é repleto de referências históricas, como a Revolução de 1930, a Intentona Comunista de 1935 e a crise de 1929.

O estilo de Amado é marcado pela oralidade, pelo humor, pela ironia e pela sensualidade. O autor usa uma linguagem coloquial, cheia de gírias, regionalismos e expressões populares. O narrador é onisciente e se dirige ao leitor, comentando os fatos e as ações dos personagens. O livro também apresenta uma riqueza de descrições, que revelam o ambiente, os costumes, as cores, os sons e os cheiros do cortiço. Algumas passagens do livro são:

“Os ratos passaram, sem nenhum sinal de medo, entre os homens que estavam parados ao pé da escada escura. Era escura assim de dia e de noite e subia pelo prédio como um cipó que crescesse no interior do tronco de uma árvore. Havia um cheiro de quarto de defunto, um cheiro de roupa suja, que os homens não sentiam. Também não ligavam aos ratos que subiam e desciam, apostando carreira, desaparecendo na escuridão.”

“Linda era uma menina bonita, de cabelos pretos e olhos grandes. Tinha quinze anos e não trabalhava. Passava o dia lendo romances, sonhando com príncipes encantados, com amores impossíveis. Sua madrinha, dona Risoleta, era uma lavadeira que a sustentava com o seu trabalho. Queria que Linda se casasse com um homem rico, que a tirasse daquela vida de miséria.”

“O sapateiro espanhol era um anarquista. Não acreditava em Deus, nem no governo, nem na polícia. Dizia que o mundo era dos trabalhadores, que deviam se unir e se libertar dos exploradores. Lia livros e jornais revolucionários e conversava com os moradores do cortiço, tentando convencê-los de suas ideias. Muitos o achavam louco, outros o admiravam, outros o temiam.”

Jorge Amado nasceu em Itabuna, na Bahia, em 1912. Filho de fazendeiros de cacau, estudou em colégios internos em Salvador e no Rio de Janeiro, onde se formou em Direito, mas nunca exerceu a profissão. Desde cedo, se dedicou à literatura e ao jornalismo, e se envolveu com a política, filiando-se ao Partido Comunista Brasileiro. Por causa de suas ideias, foi perseguido, preso e exilado várias vezes. Viveu em países como Argentina, Uruguai, França, Tchecoslováquia e Portugal. Escreveu mais de 30 livros, entre romances, contos, crônicas, memórias e literatura infantil. Suas obras foram traduzidas para mais de 40 idiomas e adaptadas para o cinema, o teatro e a televisão. Foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 1961. Morreu em Salvador, em 2001.

Suor é um livro intenso, forte e político, que revela o talento e a maturidade precoce de Jorge Amado. O autor consegue retratar com maestria a vida dos trabalhadores urbanos, suas dores e suas alegrias, suas lutas e suas esperanças. O livro é um documento histórico, social e cultural do Brasil, que mostra a diversidade, a riqueza e a beleza do povo brasileiro. O livro é também uma obra de arte, que encanta, emociona e provoca o leitor, com sua linguagem viva, sua narrativa envolvente e sua crítica contundente. Suor é um livro que merece ser lido, relido e apreciado por todos os amantes da literatura.

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O AUTOR
Jorge Amado (1912-2001) foi um escritor brasileiro, um dos maiores representantes da ficção regionalista que marcou o Segundo Tempo Modernista. Sua obra é baseada na exposição e análise realista dos cenários rurais e urbanos da Bahia. Traduzido para mais de trinta idiomas e detentor de inúmeros e importantes prêmios, o escritor teve vários de seus trabalhos adaptados para a televisão e o cinema, entre eles, "Dona Flor e Seus Dois Maridos" e "Gabriela Cravo e Canela".
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