Responsive Ad Slot

[RESENHA #578] Do dilúvio entre tuas coxas, de Isabela Penov

0


Do Dilúvio Entre Tuas Coxas (OIA Editora, 88 páginas), livro de autoria da professora e poeta paulista Isabela Penov é um livro de poesia erótica feminista. A obra é um convite da autora à experimentação das leitoras e das mulheres por meio da reivindicação protagonista do próprio prazer e do posicionamento social, em suma, pode se dizer que a obra é um forte impacto se analisarmos suas óticas e perspectivas em relação ao empoderamento da mulher, do próprio corpo e dos desejos. Isabela Penov criou em sua obra um universo único de possibilidades, repleto de nuances e vertentes femininas em busca do prazer e do controle do próprio corpo e dos caminhos, delineando assim, um caminho de visão única da mulher em prol do próprio corpo e da experiência sexual feminina.

A obra possui como foco a exploração do prazer sexual da mulher enquanto indivíduo, não sendo mais focalizada na vertente machista e falocêntrica do olhar do homem acerca da mulher, mas resistindo firmemente, estabelecendo conexões do prazer com o erotismo feminino e as explorações do próprio corpo e das próprias experiências, focando em tons, gemidos, gostos, toques e experiências, tudo como uma proposta inovadora e instigante de uma literatura feminina que empodera-se por meio da ação de e posicionar como uma alternativa à literatura masculina produzida acerca da uma visão empobrecida do corpo da mulher. Penov descreve o prazer como sendo parte de uma jornada de descoberta individual, e de maneira categórica, estabelece conexões e criações sensoriais entre o relacionamento mão-língua-toque-corpo, entre outras, conexões experimentais e sensoriais.

Pensar nesta obra requer reflexão. O corpo da mulher por muito tempo foi estigmatizado e problematizado pela visão heteronormativa e sexista de sexualização por meio de curvas, volumes e desejos, o que reduz a experiência sexual feminina à uma simples idealização machista do homem sobre o corpo da mulher, quando na verdade, nada disso importa. Penov estabelece novos conceitos para o prazer e para a conexão corpo-a-corpo, criando para si (e para nós) uma narrativa que impõe uma participação ativa da descoberta da sexualidade por meio do exercício de autodescoberta, pelo prazer, pela ação, pelo toque e pela caminhada que a sexualidade pode tornar-se, sem amarras e preconceitos pré-estabelecidos.

A visão de Penov mostra-se a cada poema lido, fica evidente sua crítica comportamental em relação ao corpo feminino e ao universo masculino sexista. Em orgia (p.37), a crítica escancara-se por meio do poder de ação do corpo-a-corpo, aqui, não há protagonismo do falo ou da figura masculina como dententora do desenvolvimento da relação, mas pelo contrário, estabelece-se uma única experiência corpo-a-corpo, onde nada mais importa, apenas o toque, o inebriar e as sensações da sexualidade afloradas:

Minha coisa na sua coisa 

Minhas coisas nas suas coisas 

Nossas coisas enroscam-se: 

a cópula dos óculos 

o ósculo dos copos 

a fornicação das facas a

maturação das frutas 

Na nossa casa tudo rima 

e se alitera tudo trepa, 

tudo beija tudo fode, 

tudo faz amor

Já o poema, morada, é uma sequência descritiva do sexo que causa prazer e saudade, do sexo feito com vontade entre duas partes de igual vigor e vontade. Nota-se em suas palavras a notável reciprocidade entre um corpo e outro, entre os toques e o desejo alimentado pela saudade e pela casualidade do reencontro. Morada é a descrição de um sexo lésbico, livre de tabus, livre de preconceitos e enraizados no prazer entre duas partes que anseiam pelo prazer do reencontro.

Tudo nesta casa te espera: 

as frutas se adoçam para os teus dentes

(eu me adoço para os teus dentes)

o sofá ainda tem a forma da tua bunda 

(meu colo tem a forma da tua bunda)

 as plantas crescem no ritmo dos teus cabelos 

(minhas unhas crescem no ritmo das tuas unhas) 

os copos seguram suas digitais 

(mesmo depois de esfregar não saem) (p.61)

Penov escreve como uma verdadeira ativista escreve. Ela descreve e encoraja através de sua poesia uma ação performativa do sexo em relação ao prazer, onde o único protagonismo à se ser centralizado seja o encontro e a consumação do ato de forma única, prazerosa e recíproca. O livro possui ao total 90 páginas, divididos em 4 partes: minhas umidades nas suas, carne verbo, felix culpa e amor romã. O livro é um lançamento primoroso da escrita brasileira em relação a poesia erótica escrita por mulheres. Isabela Penov é uma forte contribuição para formação de um novo percurso erótico adotado por mulheres na literatura, sua escrita forte, densa e extremamente política é um convite à experimentação do prazer centralizado na ação e na experiência, não mais no corpo e sem o foco centralizado no indivíduo, que por vezes, limita o prazer da ação sexual e do encontro de dois corpos.

Uma obra para ser lida de uma vez só. 

0

Nenhum comentário

Postar um comentário

both, mystorymag
© all rights reserved
made with by templateszoo